Hortaliças dependem de clima ameno para se desenvolverem melhor - EMBRAPA/Divulgação
A alface, hortaliça presente diariamente na mesa dos brasileiros, pode se tornar uma raridade no país durante o verão nas próximas décadas. Um estudo conduzido pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), vinculada ao Ministério da Agricultura e Pecuária, alerta que as mudanças climáticas devem comprometer o cultivo em campo aberto até o final do século, especialmente em um cenário de aquecimento acelerado.
Segundo a pesquisa, mesmo em uma projeção considerada otimista, entre 2071 e 2100, quase 98% do território nacional apresentará risco climático alto ou muito alto para a produção de alface em áreas abertas durante o verão. Já no cenário pessimista, em que as emissões de gases de efeito estufa continuariam crescendo, praticamente todo o país se tornaria inviável para o cultivo.
O engenheiro-agrônomo Fábio Suinaga, pesquisador da Embrapa Hortaliças, lembra que a alface é uma planta que depende de temperaturas amenas e umidade equilibrada para germinar e crescer. As sementes exigem menos de 22°C para iniciar o ciclo, mas os verões projetados para as próximas décadas podem ultrapassar facilmente os 40°C em grande parte do Brasil.
Os efeitos desse calor excessivo vão além da dificuldade de germinação. Entre eles estão o florescimento precoce, que compromete a qualidade e o padrão comercial, e a chamada queima de borda ou tipburn, uma desordem causada pela deficiência de cálcio nas folhas. Com isso, a hortaliça pode ganhar um sabor amargo e perder valor de mercado.
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A análise da Embrapa utilizou projeções do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, além de dados do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
No cenário otimista, que prevê algum controle nas emissões globais, as temperaturas médias do planeta podem subir de 2°C a 3°C até 2100. Nesse caso, quase 80% do território nacional estaria sob risco alto, e 17% sob risco muito alto para o cultivo de alface no verão.
No cenário pessimista, em que as emissões seguiriam crescendo sem freio, as temperaturas médias poderiam alcançar até 4,3°C acima dos níveis históricos. O resultado seria dramático: quase 90% do território com risco muito alto, e apenas pequenas faixas do Sul e do litoral mantendo condições minimamente adequadas.
O engenheiro-ambiental Carlos Eduardo Pacheco, também da Embrapa, destaca que a pesquisa tem um papel estratégico: antecipar impactos e permitir que agricultores busquem alternativas. Para ele, o debate não pode mais se restringir à mitigação do aquecimento, mas precisa incluir medidas de adaptação urgentes.
Nesse sentido, a Embrapa desenvolve cultivares mais resistentes ao calor, como a alface BRS Mediterrânea, que completa seu ciclo mais rapidamente, reduzindo o tempo de exposição a condições adversas. A instituição também pesquisa variedades com raízes mais vigorosas, capazes de aproveitar melhor água e nutrientes.
Além disso, os chamados ambientes protegidos, como estufas, devem se tornar cada vez mais comuns. Hoje, a maior parte da alface no Brasil é cultivada em campo aberto, mas esse modelo tende a perder viabilidade diante das temperaturas projetadas.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção nacional de alface somava 671,5 mil toneladas em 2017, com São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Minas Gerais entre os principais produtores. Já os dados mais recentes da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), ligada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), mostram que apenas em agosto de 2025 as Centrais de Abastecimento (Ceasas) movimentaram 4,6 mil toneladas da hortaliça.
Esses números reforçam a importância econômica da alface para pequenos e médios agricultores, além do impacto direto para o consumidor, que pode enfrentar aumento de preços e menor oferta no futuro.
O estudo da Embrapa serve de alerta: as mudanças climáticas já não são um problema distante. Elas estão prestes a alterar a forma como produzimos e consumimos alimentos básicos. No caso da alface, símbolo da salada cotidiana, o desafio será combinar ciência, inovação genética e novos sistemas produtivos para que ela não se torne um luxo restrito às prateleiras de poucos.
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