A arborização urbana desempenha um papel crucial na qualidade de vida das pessoas e no equilíbrio ambiental das cidades, independentemente de seu tamanho. Mais do que um elemento decorativo, as árvores são aliadas essenciais no combate às mudanças climáticas, na redução da poluição e na promoção do bem-estar da população. No entanto, seu valor muitas vezes é subestimado, sendo tratado como um mero detalhe estético no planejamento urbano.
As árvores são fundamentais para mitigar o “efeito ilha de calor”, comum em áreas urbanas com excesso de concreto e asfalto, que retêm calor e elevam as temperaturas. Além disso, elas atuam como filtros naturais, absorvendo gases poluentes, como o dióxido de carbono (CO₂), e liberando oxigênio. Também capturam partículas em suspensão, como poeira e fuligem, contribuindo para a melhoria da qualidade do ar e reduzindo problemas respiratórios.
Para que esses benefícios sejam plenamente aproveitados, é essencial um planejamento criterioso, que inclua a seleção de espécies adequadas para cada ambiente urbano. No Brasil, país com uma das maiores biodiversidades do mundo, os desafios da arborização urbana são ainda mais evidentes na Amazônia, onde a riqueza de espécies nativas contrasta com a preferência histórica por plantas exóticas nas cidades.
Pensando nesse cenário, os pesquisadores Rafael P. Salomão e Nélson A. Rosa (in memoriam) desenvolveram o Guia de Seleção de Árvores Ornamentais: Paisagismo Urbano para a Amazônia, um manual técnico-científico que oferece orientações para a escolha e manejo adequado de espécies em áreas urbanas. A publicação, disponível no portal do Museu Goeldi, destaca a importância das árvores não apenas como elementos estéticos, mas como agentes transformadores da qualidade de vida nas cidades.
Na Amazônia, onde altas temperaturas e umidade são constantes, a arborização urbana pode ser uma solução eficaz para amenizar o desconforto térmico, melhorar a qualidade do ar e promover o bem-estar da população. No entanto, como ressaltam os autores, o sucesso dessas iniciativas depende de um planejamento adequado e da priorização de espécies nativas.
O guia apresenta uma matriz de seleção que avalia diversos atributos das árvores, como altura, forma da copa, floração, folhagem e valor cultural ou legal. Esses critérios auxiliam gestores públicos, paisagistas e ambientalistas a tomar decisões informadas sobre quais espécies são mais adequadas para diferentes espaços urbanos.
Rafael Salomão, um dos autores do guia, analisou a arborização da capital paraense, Belém, de forma qualitativa e quantitativa, além de examinar a legislação municipal sobre o tema. Ele constatou que, das 78 espécies utilizadas na arborização da cidade, apenas 10 correspondem a mais de 90% do total de árvores plantadas, e apenas duas são nativas da Amazônia.
O Manual de Orientação Técnica da Arborização Urbana de Belém, publicado em 2013 pela Prefeitura de Belém em parceria com a Universidade Federal Rural da Amazônia, recomenda 85 espécies, sendo 46 nativas da Amazônia e 39 exóticas. No entanto, como muitas cidades do interior do Pará seguem os modelos paisagísticos da capital, a composição e densidade da arborização nessas localidades tendem a ser semelhantes.
O guia também apresenta uma matriz de seleção de espécies ornamentais, relacionando 151 espécies com uso atual e potencial no paisagismo urbano. Dessas, 89 são indicadas para vias urbanas e 54 para áreas verdes. Entre as espécies destacadas, 32 foram consideradas de extrema beleza, 49 muito belas e 70 ornamentais. Além disso, 26 espécies possuem flores perfumadas, e 15 oferecem sombra abundante.
Um dos aspectos mais relevantes abordados no guia é a altura das árvores, um fator determinante para seu uso em áreas urbanas, especialmente sob redes elétricas. As espécies são classificadas em três categorias: pequenas (até 6 metros), médias (entre 6 e 12 metros) e grandes (acima de 12 metros). Árvores de menor porte são recomendadas para áreas com fiação elétrica, enquanto as de grande porte são ideais para parques e praças, prevenindo conflitos com a infraestrutura urbana e reduzindo custos com manutenção.
A forma da copa também é um critério importante, pois influencia a quantidade de sombra e o conforto térmico. O guia destaca copas densas e largas, que oferecem excelente cobertura, e copas ralas e estreitas, mais adequadas para espaços menores. Exemplos incluem o oitizeiro (Licania tomentosa), com copa esférica, e o visgueiro (Parkia pendula), com copa em forma de guarda-chuva.
A floração é outro aspecto valorizado no paisagismo urbano. Espécies como o ipê amarelo (Handroanthus serratifolius) e o ipê roxo (Handroanthus impetiginosus) são reconhecidas pela exuberância de suas flores, que, embora de curta duração, têm um impacto visual e ecológico significativo, atraindo polinizadores.
O guia também ressalta a importância cultural e legal de algumas árvores, que se tornaram símbolos de identidade local. Em Belém, conhecida como “Cidade das Mangueiras”, as mangueiras (Mangifera indica) são um exemplo marcante. Além disso, espécies como o pau-brasil (Caesalpinia echinata) e a castanheira-do-brasil (Bertholletia excelsa) são protegidas por leis devido à sua relevância histórica, econômica e ambiental.
Os temas abordados no guia foram discutidos no evento “Plantas para Belém: estratégias para a arborização e jardinagem de Belém frente aos desafios urbanos e climáticos”, realizado em novembro de 2024 no Museu Goeldi. O evento, fruto de um acordo de cooperação técnica com a Prefeitura de Belém, reuniu especialistas para debater questões como vulnerabilidades urbanas, mudanças climáticas, resiliência e o uso de espécies nativas da Amazônia.
Marlúcia Martins, coordenadora de Pesquisa e Pós-Graduação do Museu Goeldi, destacou a importância de um planejamento integrado da arborização urbana, que considere as especificidades de Belém. Já o professor Sérgio Brazão, da Universidade Federal Rural da Amazônia, enfatizou a necessidade de escolher espécies adaptadas às condições geográficas da cidade, como áreas de baixa altitude e subsolos ricos em água.
Para construir cidades resilientes às mudanças climáticas, a arborização urbana deve ser vista como parte integrante da infraestrutura das cidades. Além de contribuir para a contenção do solo e a amenização das temperaturas, as árvores ajudam na absorção de carbono e na manutenção da fauna, como polinizadores e aves. A distribuição equitativa de áreas verdes é essencial para garantir benefícios socioambientais em todas as regiões da cidade, promovendo justiça climática e qualidade de vida para todos.
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