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Pesquisadores utilizam cinzas do bagaço da cana para extrair fertilizantes da vinhaça

Extração de fertilizantes através da vinhaça

O Brasil, responsável por 8% do consumo global de fertilizantes, enfrenta um desafio significativo com sua dependência de potássio importado, que compõe cerca de 96% do total utilizado nas lavouras do país. Uma solução promissora para reduzir essa dependência pode vir dos resíduos gerados pela indústria sucroalcooleira, como a vinhaça.

De acordo com a professora Roselena Faez, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em apenas 150 metros cúbicos de vinhaça são encontrados aproximadamente 340 quilos de potássio. Apesar disso, o Brasil ainda importa grandes quantidades do nutriente, em especial na forma de nitrato de potássio, enquanto descarta os resíduos ricos no mineral. A situação é agravada por fatores externos, como a guerra na Ucrânia, que afeta o fornecimento de fertilizantes ao Brasil.

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Buscando alternativas, Faez e sua equipe do Programa de Pós-Graduação em Agricultura e Ambiente estão investigando maneiras de reutilizar os nutrientes presentes na vinhaça, que é produzida em grande quantidade durante a fabricação de etanol — de 12 a 18 litros para cada litro de etanol gerado.

Em um dos estudos conduzidos pela equipe, cinzas resultantes da queima do bagaço da cana-de-açúcar foram utilizadas para recuperar potássio e nitrogênio da vinhaça. A pesquisa, publicada no Journal of Environmental Management com apoio da FAPESP, apresenta uma abordagem inovadora para o reaproveitamento desses resíduos.

O bagaço da cana é comumente utilizado como fonte de energia nas indústrias, sendo queimado em altos-fornos, o que gera cinzas e fuligem. As cinzas, que contêm materiais como carbono e sílica, são de particular interesse devido à sua porosidade, que facilita a adsorção de nutrientes. Embora essas cinzas sejam frequentemente empregadas na produção de materiais como tijolos e asfalto, o uso para recuperação de nutrientes da vinhaça ainda é inexplorado.

A professora Faez explica que as cinzas, com suas partículas variadas em forma e composição, interagem quimicamente com os íons de potássio e nitrogênio, além de oferecerem um ambiente poroso que auxilia na adsorção dos nutrientes. O estudo optou por usar as cinzas em seu estado bruto, sem modificação química, visando um processo de baixo custo e alta viabilidade industrial.

A vinhaça, rica em potássio, fósforo e nitrogênio, é geralmente usada como fertilizante agrícola, mas seu uso indiscriminado pode causar problemas como a acidificação e salinização do solo. Normas técnicas, como a Norma Técnica P 4.231 da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), regulam sua aplicação para minimizar esses impactos.

Durante o estudo, as cinzas foram testadas com uma solução simulando a vinhaça, em condições controladas de tempo e proporção. Dois testes subsequentes, usando vinhaça in natura, demonstraram a eficiência das cinzas em recuperar os nutrientes desejados e neutralizar a acidez do resíduo.

As cinzas enriquecidas com potássio e nitrogênio resultantes do processo têm potencial para serem utilizadas como fertilizante. Além disso, a vinhaça tratada apresentou menor acidez, o que pode reduzir seus efeitos adversos sobre o solo. Novos estudos estão em andamento para avaliar o impacto da vinhaça tratada no solo.

Para Faez, o conceito de sustentabilidade impulsiona uma transformação na indústria, onde os ciclos produtivos devem ser fechados, sem desperdícios. A química, historicamente, sempre buscou reduzir o uso de recursos minerais, e agora a visão de resíduos como oportunidades é mais relevante do que nunca.

O artigo completo intitulado Unlocking Agronutrient Resources: Sorption Strategies for Sugar-Energy Industry Waste pode ser acessado em: ScienceDirect.

Redação Revista Amazônia

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