Energia

Um barco com zero emissões que navega rumo à COP30

Quando se fala em navegação e energia, o cenário costuma evocar motores a diesel, barulhos estridentes e fumaça que se mistura ao horizonte. Mas em Foz do Iguaçu, às margens do reservatório de Itaipu, surge uma cena diferente: um barco construído para ser 100 % movido a hidrogênio verde: silencioso, limpo e simbólico da transição energética que se anuncia.

A embarcação é fruto de um trabalho do Itaipu Parquetec, o braço de inovação da Itaipu Binacional, que já vinha investindo em tecnologias limpas e sustentabilidade. Ela é a primeira do tipo na América Latina e chega ao mundo como um anúncio ambicioso: será lançada oficialmente em Belém durante a COP30, de 10 a 21 de novembro. A ideia é que o barco inaugure sua operação no local mesmo das discussões climáticas globais.

Com 9,5 metros de comprimento e 3 metros de largura, o casco de alumínio é projetado para exercer funções práticas desde o início: fará coleta seletiva de resíduos sólidos urbanos nas ilhas habitadas da capital paraense. Ao navegar, não emite ruído nem gases poluentes — o único “resíduo” do motor é água pura. Para ampliar sua autonomia, o barco ainda possui sistema de aproveitamento de energia solar.

A embarcação ficará sob responsabilidade da Fadesp (Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa), uma instituição sem fins lucrativos ligada à Universidade Federal do Pará (UFPA), cuja missão é apoiar o desenvolvimento científico, social e tecnológico da Amazônia. Essa estrutura vai receber não apenas o barco, mas também um posto náutico de produção de hidrogênio verde em Belém. Esse posto usará energia solar para gerar e armazenar o combustível localmente, possibilitando o reabastecimento contínuo das embarcações após a COP30.

Foto: William Brisida/Itaipu Binacional

SAIBA MAIS: Fontes de Energias Renováveis: O Caminho para um Futuro Limpo

O processo de produção do hidrogênio verde, explicou o gestor do Centro de Tecnologias de Hidrogênio do Parquetec, Daniel Cantane, funciona por eletrólise: moléculas de água são separadas em hidrogênio e oxigênio por meio de eletricidade. Quando essa eletricidade provém de fonte limpa — como a geração hidráulica de Itaipu — o hidrogênio obtido é considerado “verde”, isto é, sem emitir dióxido de carbono em seu ciclo produtivo. No caso do barco, a combustão gera apenas água pura, devolvida ao rio.

Mas essa embarcação é mais do que uma solução de mobilidade limpa: é um experimento prático de como o hidrogênio verde pode ocupar espaço real no transporte, sobretudo em regiões onde o uso de vias fluviais é intenso. O diretor-geral brasileiro de Itaipu, Enio Verri, vislumbra que, com o tempo, barcos movidos a hidrogênio possam transportar passageiros nas áreas amazônicas, substituir embarcações convencionais em comunidades ribeirinhas e até operar em operações de extração de petróleo em locais como a Margem Equatorial, em oposição ao uso de combustíveis fósseis poluentes.

Esse episódio lança luz sobre um ponto importante: o hidrogênio verde não é ficção. No Parquetec já existem outras aplicações em desenvolvimento, que visam descarbonizar processos industriais, frotas de caminhões e ônibus em centros urbanos — casos em que o hidrogênio verde pode se tornar peça chave na matriz energética limpa.

A construção desse barco e seu lançamento numa COP em Belém fazem um gesto simbólico poderoso: conectar a Amazônia e suas águas às tecnologias de ponta que o planeta forçará cada vez mais. A ideia é que, enquanto as delegações discutem metas, metas nacionais, financiamento climático e compensações, lá no rio uma embarcação movida a pura água navegue como testemunha viva de que outro modelo é possível.

Essa embarcação também inaugura uma narrativa: que inovação não precisa ficar em laboratórios ou painéis de projeção — ela pode se mover no mundo real, cortar o espelho da água, recolher lixo, servir comunidades ribeirinhas e testar os limites do que considerávamos apenas futurista.

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