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Mudanças climáticas podem reduzir produção de Belo Monte a 30% da capacidade até 2050

A Usina Hidrelétrica de Belo Monte, localizada no Pará, pode ver sua produção de energia cair para apenas 30% de sua capacidade total até 2050 devido aos impactos das mudanças climáticas. A projeção alarmante é resultado de um estudo realizado pela USP (Universidade de São Paulo), intitulado “Variabilidade da vazão do Rio Xingu na região da UHE Belo Monte sob cenários de projeções multimodelo de mudança climática”.

Pesquisa

O geólogo Marcelo Camargo, autor da pesquisa e mestre pela USP, utilizou dados do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) sobre projeções de chuvas globais até 2100 e aplicou modelagem computacional para analisar o período entre 2020 e 2050. Os resultados indicam que a usina, que já opera abaixo de sua capacidade máxima devido à sazonalidade do Rio Xingu, enfrentará desafios ainda maiores com o agravamento das secas na Amazônia.

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Desde sua inauguração, a produção média de Belo Monte tem sido de 4.571 MW, o que representa 41% de sua capacidade instalada de 11.233 MW. Essa limitação já é explicada pela variação natural do Xingu, que chega a ter uma vazão de 25 mil metros cúbicos por segundo no inverno, mas cai drasticamente para 700 metros cúbicos por segundo no verão. Em 2024, a usina gerou apenas 2.581 MW, equivalente a 23% de sua capacidade, devido à seca extrema na região.

“O Xingu passa seis meses em estiagem total, o que inviabiliza o funcionamento pleno de uma estrutura como Belo Monte”, explica Camargo. Entre 2020 e 2024, a hidrelétrica operou, em média, com 40% de sua capacidade máxima, com destaque para 2022, quando atingiu 93% da produção esperada, gerando 4.239,58 MW.

Custos elevados e futuro incerto

A construção de Belo Monte, inicialmente orçada em R16bilho~es,acaboucustandomaisdeR 30 bilhões. Segundo o pesquisador, o retorno financeiro do investimento está comprometido. “Com a redução prevista na capacidade de produção e os custos de operação, é impossível que Belo Monte, ao longo de 30 anos, supere o valor do seu próprio custo”, afirma Camargo.

A usina, do tipo fio d’água, depende diretamente do volume de água disponível para movimentar suas turbinas. Com as secas cada vez mais intensas na Amazônia, impulsionadas pelo aquecimento global e pelo desmatamento, a situação tende a piorar. O cientista Carlos Nobre, colunista de Ecoa, alerta que, se a temperatura global subir 2°C acima dos níveis pré-industriais, a frequência de secas aumentará drasticamente, podendo inviabilizar a geração de energia em Belo Monte. “Se houver desmatamento na região, as chuvas podem ser reduzidas em 20% a 30%”, complementa.

Impactos nas comunidades locais

As mudanças no regime do Rio Xingu já são sentidas pelas comunidades que dependem do rio para sua subsistência. Lorena Aranha, de 25 anos, representante dos povos Curuaia e Xipaya, relata que o rio está cada vez mais imprevisível. “Hoje o rio está de uma altura, amanhã de outra. Agora está de um jeito, mais tarde, de outro”, diz. A maré baixa expõe pedras que aumentam o risco de acidentes, enquanto os peixes enfrentam dificuldades para se reproduzir, já que áreas de desova secam rapidamente.

A escassez de peixes e a infertilidade do solo forçaram as comunidades a buscar alternativas de renda. “Ano passado, criamos uma marca de chocolate para usar nosso cacau e nossas próprias amêndoas”, conta Lorena, destacando que cultivos como castanha e cacau têm sido essenciais para a sobrevivência.

Maria Cristina Alves da Costa, de 46 anos, também sentiu os impactos da hidrelétrica. Antes da construção de Belo Monte, ela vivia em Santo Antônio, comunidade que foi extinta para dar lugar à usina. Com uma carta de crédito oferecida pela empresa, comprou uma casa em Altamira, mas, após nove meses sem renda, decidiu voltar para as margens do Xingu. “O que eu sei fazer é pescar. Como vou pegar peixe no asfalto?”, questiona.

Hoje, Maria e sua família enfrentam dificuldades para pescar e manter a renda. “Pegávamos cerca de 40 kg de pescada por dia. Hoje, tem semanas que não pegamos nem para comer”, relata. O custo dos materiais, como gelo para conservar os peixes, também pesa no orçamento. Uma placa de gelo custa R$ 8,00, o mesmo preço de um litro de gasolina 3,00. Com isso, a família, composta por Maria, seu marido e dois filhos, todos pescadores, arrecada cerca de R$ 700 por mês.

Um futuro desafiador

O estudo da USP reforça a urgência de ações para mitigar os impactos das mudanças climáticas e do desmatamento na Amazônia. Enquanto Belo Monte enfrenta um futuro incerto, as comunidades locais buscam se adaptar a um cenário cada vez mais difícil, onde a sobrevivência depende da resiliência e da criatividade para superar os desafios impostos pela crise climática e pelas transformações no Rio Xingu.

Redação Revista Amazônia

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