O que carvalhos de 800 anos revelam sobre o futuro das florestas

O Carvalho dos Druidas, em Buckinghamshire, já passou por oito séculos de história. Sobreviveu a secas, tempestades, ondas de calor e inúmeras transformações no entorno. Ainda em pé, com quase nove metros de altura e tronco robusto, tornou-se testemunha viva de um passado que remonta ao século XIII. Hoje, este gigante da floresta é mais do que um monumento natural: é uma pista genética para o futuro das florestas britânicas.

O cientista Ed Pyne, da Woodland Trust, coleta uma folha do velho carvalho para análises de DNA. O objetivo é compreender por que algumas árvores alcançam milênios de vida e resistem a mudanças climáticas e doenças que derrubam outras mais jovens. Sorte? Condições ideais de crescimento? Ou segredos guardados no código genético dessas árvores ancestrais?

A busca envolve também a Arboricultural Association, que vê na ciência uma forma de garantir a preservação e o manejo adequado dessas árvores. “Ao estudar o genoma dos carvalhos antigos, podemos entender como protegê-los e como usá-los para restaurar paisagens degradadas”, explica a pesquisadora Emma Gilmartin.

Os carvalhos são símbolos da paisagem britânica, presentes em parques, jardins e campos. Tornam-se oficialmente “antigos” ao ultrapassar os 400 anos, mas alguns alcançam idades próximas a 1.000 anos. O projeto prevê o estudo de cerca de 50 desses veteranos, incluindo não apenas o Carvalho dos Druidas, mas também o Crouch Oak, em Surrey. Este último, situado perto de uma rua movimentada, é conhecido como a “árvore do piquenique da Rainha Elizabeth I”, que teria se abrigado sob sua copa.

A relevância desses carvalhos vai além do valor histórico. Eles são verdadeiros refúgios de biodiversidade. Mais de 2.300 espécies dependem deles: insetos, aves, morcegos, líquens, fungos e pequenos mamíferos. Os galhos oferecem sombra e alimento, a casca abriga besouros raros e as bolotas sustentam aves e roedores durante o inverno. Algumas espécies estão diretamente ameaçadas: o besouro Moccas, por exemplo, vive hoje em apenas 14 carvalhos antigos no Moccas Park, em Herefordshire.

A Dra. Emma Gilmartin diz que árvores antigas como o carvalho dos Druidas são monumentos da natureza

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Não é exagero dizer que a Grã-Bretanha é o maior reduto de carvalhos ancestrais da Europa – mais do que todos os outros países do continente juntos. E é justamente em locais como o Moccas Park National Nature Reserve que iniciativas de restauração ecológica estão florescendo. Ali, o manejo busca resgatar o antigo “wood pasture”, uma paisagem de pastagens abertas salpicadas por árvores centenárias.

O trabalho inclui a coleta de bolotas de carvalhos que sobreviveram por séculos para germinar novas árvores e replantá-las onde antes reinavam. Ao mesmo tempo, espécies exóticas como coníferas, que nunca pertenceram àquele ecossistema, vêm sendo removidas. Os resultados são notáveis: aves e morcegos retornaram, coleópteros raros proliferam e há um verdadeiro boom na diversidade de insetos. “Em apenas 16 anos de restauração, estamos vendo uma recuperação acelerada da natureza”, comemora Tom Simpson, da Natural England, agência ambiental do governo britânico.

A lição é clara: árvores antigas não podem ser substituídas. Elas carregam séculos de vida, sustentam redes complexas de espécies e funcionam como arquivos genéticos de resiliência. A ciência pode, sim, revelar segredos de sua longevidade e usá-los para enfrentar os desafios do futuro. Mas, sem proteção imediata, esses “monumentos vivos” correm o risco de desaparecer antes que possamos aprender com eles.

Saul Herbert, também da Woodland Trust, reforça a urgência: “Precisamos mapear essas árvores, envolver comunidades locais e garantir que elas sejam cuidadas. Seu valor vai além da ecologia: é histórico, cultural e espiritual”.

Enquanto o mundo discute como enfrentar as mudanças climáticas, talvez as respostas estejam silenciosamente guardadas nas raízes de árvores que já atravessaram centenas de invernos. O Carvalho dos Druidas e seus semelhantes podem não salvar o planeta sozinhos, mas carregam em seus anéis a prova de que resiliência é possível. Cabe à sociedade ouvir o que esses gigantes ainda têm a ensinar.

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