Tomaz Silva/ Agência Brasil
A proposta brasileira de criar um espaço inédito para unir comércio e clima está ganhando força nos bastidores da diplomacia internacional. O presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, levou à Organização Mundial do Comércio (OMC) a ideia de um “fórum comércio-clima”, que funcionaria a partir de 2026. O gesto foi simbólico: foi a primeira vez que um líder de conferência climática visitou a entidade, sinalizando que o Brasil pretende transformar Belém, sede da COP30, em um marco histórico das negociações globais.
A proposta não busca criar tratados vinculativos ou documentos com força legal. A lógica é outra: sair do diagnóstico interminável sobre as dificuldades e avançar para a elaboração de soluções práticas que alinhem os desafios do comércio internacional e da emergência climática. O fórum reuniria negociadores das duas áreas, com mandato misto e apoio técnico equilibrado entre especialistas de países desenvolvidos e em desenvolvimento. Na avaliação de Corrêa do Lago, já não faz sentido discutir se comércio e clima estão conectados, mas sim como alinhá-los de maneira justa e eficaz para gerar benefícios comuns.
O Brasil também prepara outra carta importante para a COP30: o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), resultado de dois anos de intensas articulações políticas e técnicas do governo federal. O fundo se diferencia por três aspectos centrais. Primeiro, estabelece a obrigatoriedade de repassar pelo menos 20% dos recursos diretamente a Povos Indígenas e comunidades florestais, reconhecendo seu papel decisivo na proteção dos biomas. Segundo, remunera países pela manutenção da floresta em pé, sem recorrer ao mecanismo tradicional de créditos de carbono. Por fim, oferece recursos sem prazo limitado, permitindo que sejam usados em políticas públicas estruturantes e de longo alcance.
SAIBA MAIS: Brasil quer criar fórum para debater impactos climáticos no comércio global
Essas iniciativas surgem em um momento delicado do cenário internacional. Com o governo dos Estados Unidos recuando em compromissos climáticos após a volta de Donald Trump, abre-se espaço para o Brasil exercer maior protagonismo. Esse vácuo político pode tornar Belém o centro de novas alianças e atrair investimentos estratégicos. É o que avalia Marina Cançado, fundadora da Converge Capital e organizadora da Brazil Climate Week, que destacou em entrevista à Bloomberg Línea que investidores internacionais seguem atentos às oportunidades climáticas, ainda que mais cautelosos.
Um estudo recente, intitulado Building a Climate Coalition: Aligning Carbon Pricing, Trade and Development, reforça esse diagnóstico. Segundo a pesquisa, uma coalizão de 21 países desenvolvidos e em desenvolvimento, junto à União Europeia, poderia cortar emissões sete vezes mais do que os atuais compromissos multilaterais, ao mesmo tempo em que geraria quase 200 bilhões de dólares anuais em receitas por meio da precificação de carbono. A professora Catherine Wolfram, do Massachusetts Institute of Technology (MIT), coordenadora do estudo, defendeu que a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris torna ainda mais urgente a construção de uma coalizão menor, mas mais comprometida.
No plano interno, a COP30 também promete efeitos imediatos. A consultoria Tendências calcula que o evento pode adicionar até 1,5% ao PIB do Pará já no curto prazo, impulsionando não só a economia local como também a da região Norte. As projeções são otimistas: enquanto o Brasil deve crescer 2,2% em 2025, o Norte avançaria 3,5% e o Pará chegaria a 4%, números superiores aos esperados para todas as demais regiões do país.
Entretanto, há setores que resistem. A Sociedade Rural Brasileira (SRB) articula para impedir que o governo federal apresente na COP30 o novo Plano Clima. O receio é que o documento reforce o papel central do agronegócio nas emissões nacionais de gases de efeito estufa, sobretudo por conta do desmatamento. A estratégia, revelada em reunião de seu comitê de sustentabilidade, ilustra as tensões internas em torno da transição verde no Brasil.
O que está em jogo em Belém não é apenas a diplomacia climática. É a tentativa de redesenhar o papel do país nas negociações globais, equilibrando pressões internas e oportunidades externas. Ao propor um fórum inédito na OMC e lançar um fundo inovador para as florestas tropicais, o Brasil aposta em um modelo de cooperação mais horizontal, que reconhece responsabilidades compartilhadas, mas também diferenciadas. A COP30 pode se tornar um divisor de águas: ou reforça as promessas vazias das últimas conferências ou inaugura uma era de pactos mais pragmáticos e transformadores.
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