No atual cenário da COP30 a crise que se gera não é mais a de falta de leitos para os participantes do evento, já que para os 50 mil participantes esperados, de delegações de 196 países, há aproximadamente 53 mil leitos disponíveis na cidade, dos mais variados tipos, desde motéis adaptados a receber as delegações estrangeiras a resorts de luxo em transatlânticos, contratados pelo próprio governo do estado, que ficarão ancorados próximos a cidade. O problema que se apresenta agora é muito mais de origem sistêmica, problema que é apresentado pelo próprio mercado, afinal, a lei da oferta e demanda é justamente o que rege a forma que a nossa economia se organiza. Logo, assim como vem ocorrendo em vários lugares pelo mundo, em que a especulação imobiliária em regiões turísticas aumenta os preços de aluguel e compra de imóveis, também seja em grandes eventos como o show da Madonna no Rio de Janeiro que chegaram até a triplicar o preço da hospedagem na capital, ou mesmo como em outros eventos da COP como em Glasgow e Baku, em que denúncias sobre o preço e qualidade das acomodações foram feitos, Belém não fugiu à regra. E a lógica de mercado arrisca a excluir as delegações de estados nacionais com menor poder aquisitivo, mostrando que talvez a lógica de mercado não seja mesmo uma boa lógica para lidar com questões governamentais.
No dia 30 de julho, o presidente da COP, o embaixador André Corrêa Lago trouxe à discussão uma carta assinada por 26 dos países participantes da edição de 2025 da Conferência das Partes, em que países do norte global como Holanda, Áustria, Bélgica e Canadá pediam pela transferência do evento para fora de Belém, devido aos abusos de preços cometidos pelos hotéis na cidade. Mas também países do grupo da LDC (sigla em inglês para Less Developed Countries – Países menos desenvolvidos), liderados por Richard Muyungi, chefe de negociações da comitiva da Tanzânia, alegaram que os preços seriam impraticáveis para a participação de suas delegações, o que arriscaria a legitimidade do evento como um todo, já que este se propõe a ideia de inclusão e sustentabilidade. E apesar de toda a pressão pela mudança de sede do evento, André Corrêa declarou que não há possibilidade da COP sair de Belém.
O código de defesa do consumidor não tem uma definição concreta para definir o que seria um preço abusivo ou não, cabendo ao juiz de cada caso avaliar e estabelecer se houve abuso na prática por cada estabelecimento, independente de contrato assinado entre as partes. No entanto há práticas que podem ser tidas como aspectos que indicam esse abuso, como: elevações de preço sem a justificativa de aumento no custo de insumos, ou do aumento da qualidade do serviço ofertado, ou mesmo alterações não substanciais no produto ou serviço, somente para a elevação de preços, a chamada “maquiagem”. No entanto as penas cabíveis a estes casos são de ordem judicial, podendo o estabelecimento ser obrigado a devolver o dinheiro pago, por reparação de danos, fechar seus serviços ou até mesmo se ajustar às práticas mais justas de preço, não cabendo ao estado interferir diretamente no assunto.
Desde quando foi anunciado o evento o Governo do Estado, em parceria com o SEBRAE abriu linhas de crédito, desburocratizadas, para pequenos e médios empreendedores no estado que queiram adaptar seus negócios para o mega evento de novembro. Além disso, como já foi afirmado, o número de quartos, que até o ano de 2022 eram somente de 12,2 mil, estando 90% destes somente nos hotéis da cidade, agora superam a expectativa de presença de cincoenta mil pessoas no evento, o que retira a argumentação usada inicialmente pelas redes hoteleiras de que a oferta de quartos era muito baixa com relação a procura dos futuros hóspedes, o que estaria encarecendo as diárias. Foi um aumento significativo em tão pouco tempo, ainda mais em uma cidade sem um histórico tão grande de fluxo de pessoas. No dia 14 de julho, então, o governo do estado conseguiu negociar com a Associação Brasileira da Indústria Hoteleira – Seção Pará (ABIH/PA), um acordo técnico para garantir a oferta de quartos de custo acessível, custando uma média de 100 a 500 dólares por noite, para assim garantir a participação de todas as comitivas neste evento tão esperado.
Belém é uma cidade a muitos anos marginalizada pela lógica sul/sudeste do país, a mesma lógica que faz com que shows internacionais tenham uma rota: Rio de Janeiro, São Paulo e Curitiba, somente. Mesma lógica muito conhecida pelos nortistas do “frete grátis para todo Brasil, menos região norte”. Em que se ouve analistas da própria imprensa comentarem coisas como “Belém é uma cidade muito longe”, que ganha contornos de diminuição da região norte como um todo. Justamente no epicentro das discussões sobre meio ambiente, a própria Amazônia.
É inusitado o posicionamento de que se retire a COP de Belém, que é historicamente a porta de entrada da região amazônica no Brasil, para que não se exclua outras delegações no processo. Claro, não seria de bom tom excluir países, sejam quais forem, ainda mais como as nações do sul global, justamente os que são mais afetados pela crise climática mundial. Mas, como poderia se fazer um mega evento sobre ecologia, em que grande parte das discussões são sobre Amazônia, excluindo a possibilidade de se estar na própria Amazônia? Não seria de toda maneira uma atitude dissimulada debater sobre os problemas da região amazônica sem querer estar perto, sentir, vivenciar as belezas, possibilidades e eventualmente os problemas que a região pode oferecer?
Como em todo evento de grande porte há sim problemas a serem resolvidos, no entanto, há toda uma logística que será adaptada ao evento, como o fechamento de escolas, incentivo a férias coletivas e trabalho em home office, das empresas, tudo para que haja a menor circulação de trânsito possível nos dias de evento, há também uma infraestrutura a ser montada. Até mesmo muitas críticas podem ser feitas a forma como estão sendo realizadas obras, com impactos ambientais, em meio a um debate sobre sustentabilidade, ou ao atraso de obras de saneamento e estruturação da cidade a menos de 100 dias da conferência. Mas, retirar a COP da região é virar as costas para o aprofundamento do debate de forma empírica, vivida durante somente 11 dias de contato direto com a realidade paraense.
Até o momento a COP30 continuará sendo realizada do dia 11 a 22 de novembro em Belém do Pará, sem plano B, como disse o presidente do evento.
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