Meio Ambiente

A Amazônia está sob pressão, o desmatamento e o clima global mudam o coração verde do planeta

O futuro da maior floresta tropical do mundo está sendo moldado por duas forças que se somam e se retroalimentam: o avanço do desmatamento e as mudanças climáticas globais. Um estudo publicado na revista Nature Communications mostra como esses processos atuam em conjunto para alterar profundamente a dinâmica do clima amazônico, colocando em risco o equilíbrio de todo o sistema terrestre.

Assinado por pesquisadores de instituições como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), MapBiomas, Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Universidade de São Paulo (USP), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), além de parceiros internacionais como o Instituto Max Planck de Química e a Organização Meteorológica Mundial (WMO), a pesquisa quantificou os efeitos relativos da perda de floresta e do aquecimento global sobre a temperatura, as chuvas e a concentração de gases de efeito estufa na região.

O que os dados revelam

A equipe analisou 35 anos de registros climáticos e de uso da terra em 29 áreas da chamada Amazônia Legal, cobrindo o período de 1985 a 2020. O quadro é alarmante: a floresta perdeu mais de 10% de sua cobertura original nesse intervalo, com a expansão de pastagens e áreas agrícolas ocupando o espaço antes tomado por árvores de copa fechada.

Os impactos desse processo são claros. Durante a estação seca, quando a floresta depende mais da própria umidade para se manter viva, o desmatamento foi responsável por 74% da redução das chuvas – em média, uma perda de 15,8 milímetros por estação. Já a temperatura máxima subiu cerca de 2 ºC, dos quais 16,5% podem ser atribuídos diretamente ao corte raso da floresta.

Por outro lado, o aumento das concentrações atmosféricas de dióxido de carbono e metano, que intensificam o efeito estufa, está quase totalmente ligado às emissões globais. Ainda assim, a perda florestal amplia a vulnerabilidade regional, já que reduz a capacidade de evapotranspiração e de estocagem de carbono.

Percentagem da contribuição das mudanças absorvidas na Floresta amazônica: Mudança global do clima/Desmatamento

VEJA TAMBÉM: Desmatamento sobe 8,4% na Amazônia de agosto de 2024 a junho de 2025; Cerrado tem queda de 22,5%

A floresta perde sua resiliência

Um dos achados mais preocupantes do estudo é a constatação de que os maiores impactos climáticos acontecem logo nas fases iniciais do desmatamento. Entre 10% e 40% de perda da cobertura florestal, os efeitos sobre chuva e temperatura são mais intensos, indicando que mesmo níveis considerados “moderados” de desmatamento podem levar a transformações drásticas no clima local.

Esse processo já se reflete em regiões como o chamado “arco do desmatamento”, que vai do leste e sudeste do Pará até Rondônia e Mato Grosso. Nessas áreas, as estações secas são cada vez mais longas e quentes, com impactos sobre a agricultura, a disponibilidade de água e a ocorrência de incêndios florestais.

Se as taxas recentes de derrubada se mantiverem, até 2035 a Amazônia poderá ter perdido quase um terço de sua cobertura original. O cenário projetado aponta para mais 0,6 ºC de aumento na temperatura e uma redução adicional de 7,3 milímetros de chuva por estação seca.

Risco de transformação em outros biomas

Segundo os autores, a Amazônia caminha para um processo de “savanização”, em que o clima se tornaria mais parecido com o do Cerrado ou mesmo com o da Caatinga. Isso significaria perder não apenas a biodiversidade incomparável da floresta, mas também sua capacidade de influenciar os ciclos de água e energia em escala continental.

A consequência ultrapassa fronteiras: a floresta amazônica é essencial para a estabilidade do sistema climático global. Sua degradação pode comprometer o regime de chuvas em outras regiões da América do Sul e até alterar padrões climáticos em escala planetária.

O que está em jogo

O estudo reforça que preservar e restaurar a cobertura florestal é hoje uma das principais estratégias de mitigação das mudanças climáticas. A continuidade do desmatamento ameaça não só a floresta, mas também a segurança hídrica, alimentar e energética de milhões de pessoas.

A mensagem dos cientistas é clara: a Amazônia está se transformando diante dos nossos olhos, e o tempo para evitar que cruze pontos de não retorno está se esgotando.

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