Divulgação - IEMA
Na manhã de 30 de outubro de 2025, em um auditório da agência reguladora em Brasília, selou-se uma parceria inédita: a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) firmou um acordo com o Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) para lançar o “Projeto Sandbox Regulatório Energias da Floresta”. Com isso, abre-se um novo capítulo no esforço de levar energia elétrica acessível, confiável e de qualidade às comunidades da Amazônia que permanecem à margem da rede pública elétrica.
O cenário é duro de aceitar: segundo levantamento do IEMA, cerca de um milhão de pessoas que vivem na região da Amazônia Legal ainda não contam com fornecimento público de energia — e isso não se restringe a domicílios. Entre escolas e unidades de saúde, o número de excluídos é alarmante: 3.659 instituições de ensino e 966 unidades de saúde básica funcionam “às escuras”. Sem energia, ficam fragilizados o processo de aprendizado (por falta de acesso à internet, equipamentos ou mesmo condições de conforto), bem como os cuidados de saúde básicos — imagine uma UBS isolada sem energia para manter vacinas refrigeradas ou operar dispositivos durante crises ambientais ou pandêmicas.
Essa realidade impulsiona o projeto – que se distingue por três eixos: inovação regulatória, sustentabilidade ambiental e justiça social. A ideia central é desenvolver, em ambiente controlado (o sandbox regulatório), soluções regulatórias, tecnológicas e participativas adaptadas às realidades amazônicas. Não se trata apenas de “levar luz”; trata-se de garantir luz com qualidade, conexão com a internet e infraestrutura tecnológica mínima para que as comunidades possam, por exemplo, desenvolver uma nova economia baseada na sociobiodiversidade, manutenção da floresta e agricultura familiar — fatores identificados como estratégicos para um desenvolvimento regional verdadeiramente sustentável.
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O acordo prevê que, ao longo de cinco anos, sejam mapeadas as barreiras regulatórias — seja na concessão de energia, na integração de micro-geradores ou na tarifa social — e acionados processos de consulta e escuta qualificada junto às comunidades indígenas, extrativistas, quilombolas ou outros povos tradicionais, conforme a convenção internacional pertinente. Ao mesmo tempo, serão criados indicadores técnicos, socioeconômicos e ambientais para mensurar resultados, e lideranças locais serão capacitadas para assumir protagonismo nas soluções energéticas. Esse esforço se baseia no saber local articulado ao conhecimento técnico-científico produzido por organizações e academia.
Entre as iniciativas que já estão engatilhadas está o projeto “Agentes Comunitários de Energia”, concebido pela Rede Energia e Comunidades, e o “Conexão Povos da Floresta”, que visa levar internet de qualidade às comunidades do interior amazônico. A compreensão que orienta tudo isso é que a floresta — e seus modos de vida — só se manterão em pé se houver infraestrutura adequada que permita o desenvolvimento econômico local, sem abrir mão dos territórios, culturas e tradições.
A atuação da ANEEL, expressa pelo diretor-geral Sandoval Feitosa, traduz o reconhecimento de que o processo de universalização da energia elétrica não pode se dar de forma mecanicista: é necessário ajustar o marco regulatório ao contexto amazônico para que a transição energética seja realmente justa e inclusiva. O IEMA, por sua vez, representado por seu diretor-presidente André Luis Ferreira, reforça que sua missão de apoiar políticas públicas com foco em inclusão social agora ganha novo vigor — com a Amazônia como palco central para inovar e exemplificar.
Em essência, o Projeto Energias da Floresta representa mais do que uma meta técnica ou regulatória: é uma afirmação de que energia, floresta e vida comunitária podem caminhar juntos. A meta não é apenas levar fios ou postes, mas possibilitar que comunidades isoladas tenham autonomia energética, conectividade e uma infraestrutura mínima para participar da cidadania plena. Ao dar esse passo, ANEEL e IEMA lançam um experimento que, se bem-sucedido, poderá servir de modelo para outras regiões remotas ou vulneráveis no Brasil.
Os resultados esperados são ambiciosos: comunicação e articulação entre governo e sociedade civil; governança participativa e descentralizada; testes de arranjos regulatórios inovadores; capacitação comunitária; e replicação de aprendizagens em outros contextos. Em longo prazo, a nova economia da floresta — baseada nos produtos da sociobiodiversidade e agricultura familiar — encontrará os “cordões energéticos” que faltavam para se desenvolver. Em última análise, trata-se de dar energia à floresta, e mais ainda: energia à autonomia dos povos que a habitam.
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