A meta de zerar o desmatamento na Amazônia Legal até 2030, prevista no âmbito do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAM), se tornou gargalo crítico na agenda climática brasileira — e um novo estudo do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) revela que, nos governos dos estados da região, a ambição ainda está aquém do necessário.
A proposta brasileira, alinhada ao Acordo de Paris, exige que a destruição das florestas tropicais seja barrada para que o país contribua com as metas globais de temperatura. No entanto, o estudo mostra que a maioria dos estados não definiu metas concretas, ou as que foram definidas resultam em números muito acima do que o governo federal estima como compatível com 2030.
De acordo com o Imazon, a meta federal de “desmatamento zero” para 2030 — adotada na 5ª fase do PPCDAM — ainda não garante um cenário de derrubada nula. Ela admite que parte das supressões legais poderá ocorrer contanto que seja compensada pela restauração. Ademais, até setembro de 2025 o governo federal ainda não havia divulgado uma estimativa oficial da área de desmatamento legal esperada para 2030. A proposta que veio à consulta pública indicava que a supressão legal deveria cair 50% até 2030 e 75% até 2035, o que resultaria em cerca de 703 km² de desmatamento legal no ano-meta, o que por si só exigiria uma redução de 89% frente à taxa registrada em 2024.
Quando se olha para os estados, o cenário se agrava. A maioria (como Acre, Amapá, Maranhão, Rondônia e Tocantins) não definiu metas específicas para 2030. Em outros casos — como Mato Grosso e Pará —, as metas quantificadas somam ao menos 2.109 km² para 2030, mais de três vezes o valor da estimativa federal de 703 km², o que demonstra descompasso grave. Ainda mais: o Consórcio Interestadual da Amazônia Legal, bloco que reúne estados da Amazônia para uma coordenação territorial, adotou meta de desmatamento zero total para 2030 e a restauração de 3.000 km², algo mais ambicioso — mas nem mesmo os estados membros alinharam seus documentos a esse compromisso.
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Essa falta de alinhamento e ambição traduz-se em riscos concretos. Se os estados continuarem com metas frouxas ou sem cronogramas claros, o Brasil corre o risco de falhar não apenas internamente, mas internacionalmente em cumprir o Acordo de Paris. O estudo ressalta que “a ausência de compromissos estaduais compatíveis … sinaliza uma opção política pela tolerância ao desmatamento”. Imazon
Além disso, o estado que mais aparenta avançar, Mato Grosso, almeja eliminar o desmatamento ilegal e reduzir o total em 90% até 2030 (para 571 km²) — mas para isso precisará quadruplicar sua taxa anual de recuperação de áreas degradadas. Outros estados ainda preveem níveis de derrubada legal acima do dobro da meta federal. O Pará, por exemplo, estima 1.538,3 km² para 2030, um valor que quase quádrupla a referência federal.
Não bastasse a meta final de 2030, o estudo destaca que as metas intermediárias (até 2025, 2028) também são frágeis. Alguns estados já cumpriram ou estão no caminho para cumprir suas metas para 2024; outros — como Pará, Roraima, Tocantins e Maranhão — ainda estão longe ou não possuem compromissos claros. Isso fragiliza o horizonte de longo prazo (2050) para neutralidade climática, que foi assumido por quase todos os estados exceto Roraima. Sem etapas concretas para 2030, a meta de 2050 perde consistência.
Para enfrentar essas lacunas, o Imazon sugere algumas ações-chave:
O governo federal deve oficializar a estimativa de desmatamento legal para 2030 (em km²) e trabalhar junto aos estados para distribuir esse compromisso territorialmente.
Os governos estaduais precisam elevar a ambição das metas para antes de 2030 e alinhá-las à meta federal ou ao nível mais exigente do consórcio interestadual.
O consórcio interestadual deve intensificar sua coordenação e impulsionar a ambição coletiva para refletir seu próprio objetivo de desmatamento zero.
Também é proposta a rastreabilidade da pecuária — via GTAs (Guias de Trânsito Animal) e CAR (Cadastro Ambiental Rural) — como vetor estratégico para estados pressionados pela expansão agropecuária.
Por fim, a análise do Imazon evidencia que o desmatamento na Amazônia já não é apenas uma questão ambiental local, mas um pivô da credibilidade climática do Brasil no mundo. A realização da COP30 em Belém intensifica essa visibilidade. Se os estados não reprimirem a derrubada e não alinharam suas metas a 2030, o país compromete sua posição em fóruns globais e sua capacidade de atrair financiamento climático.
A mensagem é clara: a floresta espera não apenas promessas, mas planos concretos. E a escala das ambições estaduais será o teste — não apenas para o Brasil, mas para o planeta.
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