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A Tailândia decidiu imprimir um novo ritmo à sua política climática. O governo apresentou um conjunto de medidas que, pela primeira vez, ganha forma dentro de uma lei nacional dedicada às mudanças climáticas. No centro dessa iniciativa está a criação de dois instrumentos que vêm se tornando padrão em países que buscam conciliar competitividade econômica e responsabilidade ambiental: um imposto doméstico sobre carbono e um sistema nacional de comércio de emissões.
Segundo a agência de notícias Bloomberg, que divulgou os primeiros detalhes do plano, a proposta ainda precisa superar etapas legislativas antes de se tornar plenamente efetiva. Mas, mesmo como esboço, já indica uma mudança profunda na forma como o país pretende enfrentar suas emissões de gases de efeito estufa.
As diretrizes foram aprovadas pelo gabinete do primeiro-ministro Anutin Charnvirakul, figura central do governo tailandês e agora responsável por colocar o país em um caminho mais firme rumo à descarbonização. O texto que avança no Parlamento prevê que o novo sistema de cap-and-trade funcionará sob um princípio simples e rigoroso: estabelecer um teto nacional para emissões e permitir que empresas negociem permissões dentro desse limite. Quem emitir menos poderá vender créditos; quem ultrapassar o total permitido terá de comprar permissões adicionais, arcando com o custo da poluição.
Embora esse mecanismo ainda não tenha data para entrar em vigor, trata-se da política climática mais ambiciosa já discutida na Tailândia. Ele se somará ao imposto de carbono, que incidirá sobre mais de 30 produtos e combustíveis — entre eles gasolina, diesel e gás natural liquefeito (GNL). A combinação desses instrumentos deve pressionar setores tradicionalmente dependentes de combustíveis fósseis e incentivar alternativas mais limpas.
Um rascunho anterior da proposta, publicado pelo Departamento de Mudanças Climáticas e Meio Ambiente da Tailândia, indicava que o sistema abrangerá setores como produção de combustíveis fósseis, geração de energia, agricultura, indústria e o segmento de alimentos e bebidas. A gama de setores revela o propósito do governo: atacar as emissões de forma transversal e criar um ambiente de transição energética que afete toda a cadeia produtiva.
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Mas a ambição climática da Tailândia vai além da regulamentação. O país se comprometeu, formalmente, a reduzir suas emissões em 47% até 2035, tomando como base os níveis de 2019. Trata-se de uma meta ousada, ainda mais para um país cuja economia depende, em parte, de atividades industriais e energéticas intensivas em carbono. Segundo projeções divulgadas recentemente, serão necessários mais de 7 bilhões de dólares em investimentos na próxima década para viabilizar a trajetória de descarbonização.
Caso o objetivo seja cumprido, a Tailândia se colocará em rota para atingir a neutralidade de carbono até 2050 — compromisso já registrado junto à Organização das Nações Unidas (ONU). Essa programação alinha o país com as estratégias globais para limitar o aquecimento do planeta e reforça sua posição nas negociações internacionais. O tema, inclusive, dominou discussões recentes na COP30, realizada em Belém, onde países asiáticos enfrentam simultaneamente desafios ambientais e crises humanitárias provocadas por enchentes e eventos extremos.
Há, porém, obstáculos no caminho. O Parlamento ainda precisa validar a lei climática e definir os contornos finais do sistema de comércio de emissões. Governos e empresas também discutem ajustes no modelo, especialmente em relação ao uso de tecnologias consideradas obsoletas, ao desenho do imposto e ao impacto econômico sobre setores que têm menos capacidade de adaptação.
A transição energética, para a Tailândia, não é apenas uma questão ambiental. É, sobretudo, uma disputa sobre como modernizar a economia e reduzir vulnerabilidades estruturais. Ao propor mecanismos que atribuem preço ao carbono, o governo cria incentivos para inovação, eficiência e novas cadeias produtivas. Mas também aciona um efeito cascata de disputas internas, interesses políticos e resistências de setores intensivos em emissões.
A estratégia tailandesa, ainda em construção, coloca o país diante de uma encruzilhada: seguir uma rota mais limpa, ancorada por instrumentos de mercado e tributação ambiental, ou ceder às pressões que historicamente atrasam políticas climáticas ambiciosas no Sudeste Asiático. As próximas votações no Parlamento dirão se esse é, de fato, um ponto de virada ou apenas mais um capítulo de promessas adiadas em um cenário de emergência global.
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