“Essas conversas cruciais devem acontecer não apenas onde é fácil, mas onde é mais importante”. A frase resume o tom da sétima carta enviada pelo presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, ao setor privado. O apelo é direto: as empresas precisam comparecer a Belém e participar ativamente da conferência climática marcada para novembro de 2025.

O chamado vem em meio a preocupações com a infraestrutura da capital paraense, especialmente em relação à hospedagem. Há o temor de que a COP30 registre uma presença reduzida de empresas devido às dificuldades logísticas. Corrêa do Lago, no entanto, defende que justamente por ser desafiador o encontro em Belém ganha relevância.
Segundo ele, a Amazônia é “o lar de pessoas que estão na linha de frente da crise climática” e, ao mesmo tempo, o coração das soluções necessárias para enfrentá-la. Por isso, o evento deve ser encarado como um espaço de escuta, aprendizado e ação coletiva.
O papel do setor privado
Na carta e em entrevistas recentes, Corrêa do Lago reforça que a transição climática é irreversível e que as empresas precisam assumir protagonismo.
Ele cita números que demonstram a força econômica da agenda verde: em 2024, a energia limpa atraiu mais de 2 trilhões de dólares em investimentos globais e criou quase 35 milhões de empregos. No Brasil, até o ano passado, Tesouro Nacional, empresas e bancos emitiram mais de 30 bilhões de dólares em títulos verdes, todos com juros menores do que os títulos convencionais. O setor de energia renovável brasileiro já soma mais de 1,5 milhão de empregos.
“O setor privado pode ter um papel muito maior, vendo oportunidades econômicas além do que os governos recomendam. Queremos mudar a lógica, mostrando que há muito a ganhar na transição”, afirmou.
Agenda de Ação: espaço para empresas
O embaixador lembra que, além das negociações formais entre governos, a conferência contará com a chamada Agenda de Ação – um espaço para empresas, sociedade civil, bancos e governos locais mostrarem iniciativas práticas.
Estão previstas 420 reuniões paralelas durante os dez dias da COP30, cobrindo seis eixos temáticos ligados à transição energética, finanças verdes, bioeconomia, agroalimentação, circularidade e infraestrutura.
Para Corrêa do Lago, a credibilidade da conferência depende de apresentar não apenas compromissos entre países, mas também soluções concretas, escaláveis e já em andamento.

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O desafio político internacional
O chamado às empresas acontece em um momento de turbulência global. Nos Estados Unidos, instituições financeiras vêm enfrentando forte pressão de políticos ligados ao Partido Republicano. Muitas gestoras e bancos estão sendo processados sob acusação de colocar a agenda climática acima dos interesses de seus clientes.
Esse ambiente hostil já provocou mudanças em alianças internacionais. Nesta semana, a Net-Zero Banking Alliance (NZBA), braço do setor financeiro dentro da coalizão global Gfanz, anunciou a suspensão de suas atividades. Criada em 2021 na COP26, a aliança reunia grandes bancos comprometidos em alinhar financiamentos à meta de limitar o aquecimento global.
Com a vitória de Donald Trump nas eleições de 2024 e a onda de críticas ao que chamou de “farsa climática”, bancos americanos deixaram a aliança, seguidos por instituições europeias, japonesas e australianas. A saída em massa ameaça o futuro da iniciativa.
Greenhushing: a nova estratégia silenciosa
O vácuo deixado pelas alianças climáticas não significa abandono da agenda. O que se observa é a adoção de uma estratégia chamada de greenhushing – quando empresas mantêm compromissos de descarbonização, mas evitam dar publicidade a eles para não se tornarem alvo de ataques políticos.
“Os compromissos continuam. As empresas seguem investindo em transição, mas com menos visibilidade e sem se associar a grandes movimentos”, explicou Ana Toni, CEO da COP30.
Segundo ela, apesar das dificuldades, muitas companhias já são pioneiras em seus setores e veem a transição não apenas como uma obrigação, mas como uma oportunidade de inovação e competitividade.
A Amazônia como palco e símbolo
O fato de a COP30 acontecer em Belém é parte essencial dessa mensagem. A escolha do coração da Amazônia não foi apenas simbólica, mas estratégica. O bioma concentra os maiores desafios e também algumas das maiores oportunidades para a transição climática.
Para Corrêa do Lago, a conferência deve ser encarada como um “mutirão global”, no qual governos, empresas e sociedade civil se unem para encontrar caminhos práticos para manter a floresta em pé e acelerar a descarbonização da economia mundial.
“Espero que as empresas tenham coragem de se engajar. A transição climática não depende de um governo ou de outro, porque os governos são passageiros. Mas a transição é irreversível, e quem estiver na vanguarda sairá à frente”, afirmou.








































