Sistemas alimentares 2.0: a revolução das biosoluções que está moldando o futuro da comida


Para muitos de nós, o alimento parece sempre ao alcance das mãos. Ingredientes do mundo inteiro estão prontamente dispostos em mercados, supermercados e apps de entrega, prontos para serem escolhidos, pagos e consumidos. Mas essa aparente facilidade de acesso esconde desafios profundos: impactos ambientais, desperdício desenfreado e, de forma mais grave, o fato de que mais de um quarto da população global não tem acesso a uma dieta saudável.

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Biosoluções: produzir mais alimento sem agredir o planeta

Com a população mundial a caminho de atingir 10 bilhões até 2050, a pressão sobre os sistemas alimentares é imensa. Felizmente, já existem alternativas capazes de produzir mais alimento sem agredir o planeta. Entre elas estão as biosoluções: soluções baseadas em processos biológicos, como o uso de microrganismos e enzimas, que estão transformando a forma como cultivamos, processamos e acessamos a comida.

O que são sistemas alimentares?

Pensar em produção de alimentos apenas como “da fazenda à mesa” é uma visão limitada. O que comemos depende de uma cadeia complexa e interligada que envolve agricultura, tecnologia, logística, comércio, nutrição, políticas públicas e condições ambientais. O conceito de sistema alimentar abrange todos esses aspectos, desde o preparo do solo até o descarte de sobras de alimentos.

Segundo a OCDE, sistemas alimentares são todos os elementos e atividades relacionados à produção e consumo de alimentos e seus efeitos econômicos, sociais, sanitários e ambientais. Eles devem garantir segurança alimentar, sustentar meios de subsistência e ser ambientalmente sustentáveis.

A importância do solo

O solo é o alicerce de qualquer produção agrícola. Mas não estamos falando de “terra” qualquer. O solo é um ecossistema vivo, repleto de microrganismos que tornam possível a nutrição das plantas. O problema é que práticas intensivas de cultivo têm esgotado esse recurso. Monocultura, uso excessivo de agrotóxicos, máquinas pesadas e o revolvimento constante do solo degradam sua fertilidade.

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E não são apenas os vegetais que sofrem. A pecuária depende de grãos como milho e soja, usados em rações animais. Se o solo está pobre, o impacto recai sobre toda a cadeia alimentar, da carne ao leite, dos ovos ao peixe.

Saúde das plantas

Mesmo com solo fértil, as lavouras enfrentam ameaças constantes: pragas, doenças, fungos e bactérias que podem destruir colheitas inteiras. O impacto disso vai muito além da fazenda. Faltas de ingredientes básicos elevam preços, afetam a segurança alimentar e prejudicam o rendimento dos agricultores.

Doenças como a ferrugem do trigo ou o vírus da fruta rugosa do tomate ameaçam cultivos populares. E quando esses ingredientes desaparecem, todo o sistema entra em alerta.

Saúde animal

Gado, aves e peixes também fazem parte essencial do sistema alimentar. Mas eles também adoecem. Epidemias como a peste suína africana já dizimaram milhões de animais e afetaram profundamente mercados internacionais. A gripe aviária continua exigindo o abate de rebanhos inteiros em diversas regiões do mundo.

A saúde dos animais depende da qualidade da ração, do manejo, da água e de condições sanitárias. Problemas nesses fatores comprometem a oferta de proteínas e podem gerar crises alimentares.

A produção de proteínas

A produção de proteína, seja animal ou vegetal, é uma das atividades mais intensivas em recursos naturais. O desafio é claro: como alimentar 10 bilhões de pessoas com dietas ricas em proteínas sem esgotar o planeta? A resposta está em inovação, tecnologia e eficiência.

Plantações de soja para ração, bovinos criados em áreas desmatadas, uso de água e emissões de metano são apenas alguns exemplos de como o modelo atual é insustentável. Daí a importância de biosoluções que promovam proteínas alternativas, como as obtidas por fermentação, fungos e microrganismos.

Desperdício e perdas

Grande parte dos alimentos produzidos nunca é consumida. Perdas acontecem no campo, na indústria, no transporte e, principalmente, nas casas. O desperdício representa um custo ambiental altíssimo: mais emissões de carbono, uso de água e energia desperdiçadas, e comida indo para o lixo enquanto milhões passam fome.

Produtos como pães, hortaliças e laticínios lideram as estatísticas de descarte prematuro. Sem sistemas de refrigeração adequados ou armazenamento eficiente, alimentos se perdem antes mesmo de chegar à mesa.

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Fonte: Pinterest/ Gustavo Oliveira

O papel das biosoluções

Contra esse cenário, as biosoluções surgem como uma virada de chave. Em vez de recorrer a produtos químicos que degradam o ambiente, agricultores e indústrias passam a utilizar soluções biológicas: microrganismos que fertilizam o solo, protegem as plantas, prolongam a vida útil dos alimentos e melhoram a digestão animal.

Entre os exemplos, estão os biostimulantes (como fungos e bactérias que melhoram a absorção de nutrientes), os biopesticidas (microrganismos que combatem pragas sem prejudicar o solo) e os sistemas de bioproteção (que estendem a durabilidade de alimentos perecíveis sem uso de conservantes sintéticos).

Na produção de proteínas, as biosoluções permitem criar alimentos a partir de fungos, bactérias e até mesmo do CO2 do ar. Isso amplia o acesso a fontes nutritivas e reduz a pressão sobre os sistemas naturais.

Na indústria, essas soluções otimizam processos, reduzem perdas e ampliam a eficiência na transformação de matérias-primas em alimentos. Já no acesso, tornam possível oferecer opções saudáveis, com menos aditivos artificiais e com foco na nutrição de populações vulneráveis, como bebês alimentados por fórmulas enriquecidas com compostos do leite materno.

Da raíz ao prato, a revolução alimentar está em curso. E ela não virá apenas da tecnologia digital ou da logística mais ágil. Virá também de soluções inspiradas pela própria natureza, que respeitam ciclos ecológicos e restauram a saúde dos ecossistemas. Em um planeta pressionado pela escassez, biosoluções são o caminho para transformar alimentos em um direito sustentável e universal.