Cacique Raoni é homenageado por Macron e solicita demarcações a Lula

Autor: Redação Revista Amazônia

 

Raoni Metuktire, cacique do povo kayapó e um dos mais renomados representantes indígenas no cenário internacional, recebeu nesta terça-feira (26), em Belém, a condecoração da Ordem do Cavaleiro da Legião de Honra da França. A medalha, a mais prestigiosa concedida pela França a cidadãos e estrangeiros que se destacam globalmente, foi entregue pelo presidente francês, Emmanuel Macron.

Captura de tela 2024 03 27 100154A Legião de Honra, instituída por Napoleão Bonaparte em 1802 para reconhecer méritos militares e civis, foi entregue na Ilha do Combu, uma das maiores da capital paraense. O evento marcou o início da visita oficial de Macron ao Brasil, que se estende até a próxima quinta-feira (28), com uma extensa agenda em várias cidades brasileiras.

“Querido Raoni, este momento é para você. Muitas vezes você foi à França e eu prometi vir aqui, na sua floresta, estar com os seus. Esta floresta, tão desejada, mas que você sempre lutou para proteger por décadas. Hoje, o presidente Lula e eu nos unimos a um de nossos amigos”, disse Macron em seu discurso antes de entregar a medalha ao cacique.

Em seu discurso, proferido em kayapó e traduzido por um parente, Raoni pediu ações do governo brasileiro para evitar o desmatamento e solicitou o bloqueio do projeto Ferrogrão. O projeto, orçado em R$ 12 bilhões, prevê uma ferrovia de 933 km ligando Sinop, em Mato Grosso, ao porto de Miritituba, no Pará. A obra atravessaria áreas de preservação permanente e terras indígenas, onde vivem cerca de 2,6 mil pessoas.

“Presidente Lula, me ouça, eu subi com você na posse, na rampa [do Palácio do Planalto], e quero pedir que não aprovem o projeto de construção da ferrovia de Sinop a Miritituba, conhecido como Ferrogrão”, afirmou. “Sempre defendi que não pode haver desmatamento, não aceito garimpo. Então, presidente, quero pedir novamente que trabalhe para que não haja mais desmatamento e que você precisa demarcar as terras indígenas”, continuou o cacique, que também solicitou que o governo aumente o orçamento da Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão federal responsável pela demarcação de terras indígenas.

Raoni falou sobre os interesses econômicos na extração de recursos naturais, que podem inviabilizar a vida no planeta. “Nunca concordei com desmatamento, com extração de madeira, minério e ouro, e me preocupo que o homem branco continue fazendo esse tipo de atividade. Se esse trabalho continuar, podemos ter sérios problemas no mundo”.

O presidente Lula, por sua vez, afirmou que o Brasil ainda está em construção e que a luta pelos direitos dos povos indígenas, quilombolas e trabalhadores rurais ainda não foi resolvida. Criticou os setores contrários às demarcações de terras indígenas no país e afirmou que seus governos foram os que mais ampliaram a destinação de terras aos povos originários.

“É importante lembrar que os conservadores brasileiros, os latifundiários brasileiros, aqueles que são contra a participação do povo, costumam dizer que o povo indígena já tem muita terra no Brasil, que tem 14% do território nacional. Todos os dias eles falam isso. O que eles não percebem é que os indígenas têm 14% demarcada hoje, mas quando os portugueses chegaram aqui, em 1500, eles tinham 8,5 milhões de quilômetros quadrados, era tudo deles. Então, o fato de terem 14% legalizados é pouco diante do que eles precisam ter para viver, manter a sua cultura e o seu jeito de viver. Tenho certeza absoluta que o nosso governo é o que mais demarcou terra indígena e vai continuar demarcando terras indígenas e parques nacionais, para evitar o desmatamento”.

Também estiveram presentes na comitiva as ministras dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, e do Meio Ambiente, Marina Silva, além da presidente da Funai, Joênia Wapichana, do governador do Pará, Helder Barbalho, e várias lideranças indígenas, incluindo Davi Kopenawa, xamã e líder dos yanomamis.

“Todo o trabalho que os povos indígenas fazem não é uma agenda localizada, é uma agenda global, uma agenda climática, em defesa das florestas tropicais e do bem-viver no planeta. É um pacto pelo futuro, um pacto pela vida”, destacou a ministra Sônia Guajajara.

O presidente Emmanuel Macron destacou, ao final do encontro, que os dois governos planejam construir uma unidade de conservação binacional que se estenderia entre o Brasil e a Guiana Francesa (território ultramarino francês que faz fronteira com o Amapá), tornando-se um centro de referência em pesquisas científicas para o desenvolvimento sustentável. Segundo o francês, ambos os países investirão US$ 2 bilhões.

Por meio de uma declaração intitulada “Chamado Brasil-França à ambição climática de Paris a Belém e além”, os países manifestaram o compromisso conjunto de combate ao desmatamento, proteção da Amazônia, restauração e gestão sustentável de florestas tropicais, e desenvolvimento da bioeconomia, incluindo “mecanismos inovadores de financiamento”.

Na chegada a Belém, Lula e Macron foram, em um barco da Marinha, para a Ilha do Combu, na margem sul do Rio Guamá. O trajeto incluiu a travessia do rio e a navegação por uma área de igarapés, onde os dois líderes puderam ter contato com a Floresta Amazônica preservada.

Antes da reunião com indígenas, eles ainda acompanharam um exemplo de produção artesanal de cacau e chocolate na região. A ideia, segundo o Palácio do Itamaraty, foi mostrar ao presidente francês a complexidade da questão amazônica e as alternativas de desenvolvimento econômico sustentável que existem.

Na próxima etapa da viagem, Lula e Macron inauguram, na manhã desta quarta-feira (27), o novo submarino brasileiro construído no Complexo Naval de Itaguaí, por meio de um acordo de cooperação tecnológica com a França.


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