Desmatamento na Amazônia Prejudica os Cultivos de Soja e Milho

Autor: Redação Revista Amazônia

Há tempos, a comunidade científica vem alertando sobre os impactos do avanço do desmatamento na Amazônia para abrir espaço à agropecuária, ciente de que tal prática é um tiro no pé para o próprio setor. Motivos como a crucial relação entre a floresta e a produção de chuvas sobre as plantações já são amplamente conhecidos. Agora, uma nova pesquisa lançou luz sobre a gravidade desse impacto.

As regiões mais desmatadas da Amazônia, como o norte do Mato Grosso, Rondônia, sul do Amazonas e leste do bioma, já estão sofrendo com um atraso no início da estação chuvosa, coincidindo com o período de plantio de soja. Esse atraso afeta diretamente o cultivo subsequente de milho.

Pesquisadores do Centro de Sensoriamento Remoto da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) observaram um atraso acumulado de aproximadamente 76 dias no início da estação chuvosa agrícola ao longo de 20 anos, entre 1999 e 2019, nas áreas mais desmatadas. Essas regiões também experimentaram uma redução de 360 mm nas chuvas e um aumento de 2,5 ºC na temperatura máxima.

O estudo, publicado no International Journal of Climatology da Royal Meteorological Society, foi pioneiro ao isolar os impactos do desmatamento das demais condições climáticas que afetam o comportamento do clima, como o aquecimento global e os fenômenos naturais El Niño e La Niña.

O climatologista Argemiro Teixeira, líder da pesquisa, destacou que as mudanças climáticas têm um efeito cumulativo ao longo de décadas, enquanto o desmatamento causa impactos quase imediatos, devido à perda de umidade decorrente da remoção da vegetação. Ele ressaltou que as secas e os desafios enfrentados pela agricultura não são apenas consequências das mudanças climáticas e dos fenômenos climáticos, mas também do desmatamento.

O estudo quantificou o impacto direto no cultivo duplo de soja e milho predominante na Amazônia, um sistema altamente dependente do início da estação chuvosa. Teixeira explicou que, quando as chuvas começam, os produtores plantam a soja e, em seguida, o milho, aproveitando o período chuvoso. Se as chuvas atrasam, a segunda safra pode se tornar inviável, comprometendo a agenda apertada dos produtores.

O estudo também apontou que o impacto do desmatamento é regional, com proprietários em áreas mais preservadas enfrentando menos riscos do que aqueles em áreas mais degradadas.

Teixeira enfatizou que essa situação terá impacto no seguro agrícola, alertando que os prêmios precisarão ser ajustados para considerar o nível de conservação das áreas para conceder seguro e crédito.

Essas mudanças climáticas já estão cobrando um preço alto do agronegócio, não apenas na Amazônia, mas em todo o país. O aumento nos pedidos de recuperação judicial feitos por produtores rurais devido às perdas nas lavouras afetadas por intempéries climáticas é um exemplo claro disso.

Enquanto isso, as expectativas para a safra de soja deste ano foram reduzidas, evidenciando os desafios enfrentados pelo setor agrícola. Infelizmente, muitas dessas consequências foram ignoradas em decisões políticas, como a flexibilização da proteção da vegetação nativa no país.

É crucial reconhecer que o setor agrícola não pode continuar ignorando sua contribuição para os problemas ambientais que enfrentamos atualmente. O termo “agrossuicídio”, cunhado por pesquisadores para descrever essa autodestruição das bases do próprio negócio, ilustra claramente a necessidade de uma mudança de curso urgente.


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