Cooperação científica ganha fôlego no Atlântico Sul
A ciência oceânica voltou ao centro da agenda internacional, e o Brasil se movimenta para ocupar um papel mais ativo nesse debate. A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) anunciou uma nova chamada pública em parceria com a Agencia Nacional de Investigación e Innovación do Uruguai (ANII), criando uma ponte direta entre pesquisadores dos dois países. O objetivo é financiar intercâmbios acadêmicos de curta duração, com foco claro: estimular a construção de projetos multilaterais capazes de responder a desafios complexos ligados à biodiversidade marinha e à sustentabilidade dos oceanos.

A iniciativa parte do reconhecimento de que os problemas que afetam os oceanos — da perda acelerada de biodiversidade às mudanças climáticas — ultrapassam fronteiras nacionais. Nenhum país, isoladamente, reúne hoje todas as competências científicas, tecnológicas e institucionais necessárias para enfrentar esses desafios. Ao apostar na cooperação regional como ponto de partida para alianças globais, FAPESP e ANII sinalizam uma estratégia de longo alcance.
Uma parceria que vem sendo construída
O lançamento da chamada não surge do nada. FAPESP e ANII mantêm um acordo formal de cooperação científica desde 2023, que vem sendo progressivamente ativado por meio de encontros, seminários e ações conjuntas. Um dos marcos mais recentes dessa aproximação foi o simpósio FAPESP Day Uruguay, realizado em Montevidéu nos dias 13 e 14 de novembro, reunindo cientistas paulistas e uruguaios em torno de áreas consideradas estratégicas para ambos os países.
Esses encontros têm cumprido um papel fundamental: criar confiança institucional, identificar interesses comuns e aproximar grupos de pesquisa que, até pouco tempo atrás, trabalhavam de forma relativamente isolada. A nova chamada transforma esse diálogo em ação concreta, ao oferecer recursos para que pesquisadores possam circular, trocar metodologias, alinhar agendas e, sobretudo, desenhar projetos conjuntos mais ambiciosos.

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Ciência oceânica como eixo estratégico
A chamada FAPESP-ANII está inserida no Programa FAPESP de Pesquisa em Cooperação no Oceano Atlântico Sul e Antártica (PROASA), uma iniciativa que busca consolidar uma rede científica interdisciplinar voltada a essas regiões-chave do planeta. O Atlântico Sul e a Antártica concentram ecossistemas sensíveis, ainda pouco compreendidos, mas decisivos para o equilíbrio climático global, a segurança alimentar e a conservação da biodiversidade.
As instituições selecionadas deverão receber pesquisadores visitantes de reconhecida competência, sempre vinculados a instituições de pesquisa do país parceiro. No caso do Brasil, a FAPESP utilizará a modalidade Auxílio Pesquisador Visitante para custear a vinda de cientistas uruguaios por períodos de até cinco meses. Mais do que financiar deslocamentos, a proposta é criar tempo e espaço para que colaborações profundas se formem.
O foco não está apenas na produção imediata de resultados, mas na construção de bases sólidas para projetos futuros de maior escala. A chamada bilateral deixa claro que as visitas científicas devem ter como horizonte a elaboração de propostas para a chamada internacional CRA Ocean 2, do Belmont Forum, uma das mais importantes iniciativas globais de fomento à pesquisa em mudanças ambientais.
Do intercâmbio local à agenda global
A chamada CRA Ocean 2, intitulada “Em direção ao oceano que desejamos: Biodiversidade e sustentabilidade dos ecossistemas para a natureza e o bem-estar humano”, reúne mais de uma dezena de agências de fomento distribuídas por quatro continentes. Ela apoia projetos conduzidos por consórcios internacionais e interdisciplinares, capazes de integrar ciências naturais, sociais e humanas em torno de problemas oceânicos complexos.
Nesse contexto, a parceria entre FAPESP e ANII funciona como um laboratório de cooperação. As propostas apoiadas deverão dialogar diretamente com os três grandes eixos temáticos definidos pelo Belmont Forum: conservação da biodiversidade e soluções baseadas na natureza; integração entre oceano, biodiversidade e clima; e reflexão sobre futuros da natureza, governança oceânica e ética. Trata-se de uma agenda que combina rigor científico com implicações políticas, sociais e econômicas profundas.
Ao priorizar propostas que resultem na formação de novas parcerias e na submissão de projetos multilaterais, a chamada reforça a ideia de que a ciência do século XXI se faz em rede. A expectativa é que pesquisadores paulistas e uruguaios não apenas ampliem sua produção acadêmica, mas também fortaleçam a presença da América do Sul em fóruns científicos internacionais.
As submissões devem ser feitas exclusivamente por meio do Sistema de Apoio à Gestão (SAGe) até 23 de janeiro de 2026. O prazo relativamente curto reforça o caráter estratégico da chamada: ela é um convite à ação rápida, mas fundamentada, para que ideias amadurecidas em cooperação regional ganhem projeção global.















































