Ibama avança na proteção de quelônios com ação no Pará


O Tabuleiro de Monte Cristo, no município de Aveiro, no oeste do Pará, tornou-se por duas semanas o epicentro de um dos mais importantes encontros de conservação da fauna amazônica. Entre 28 de outubro e 9 de novembro, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) realizou a reunião nacional do Programa Quelônios da Amazônia (PQA), reunindo coordenadores estaduais, especialistas e parceiros para discutir avanços administrativos e colocar em prática técnicas fundamentais de manejo, monitoramento e pesquisa de quelônios.

Foto: PQA/DBFlo/Ibama

A programação uniu, em um mesmo espaço, a Reunião Anual do Comitê Técnico Permanente do PQA e um treinamento intensivo em campo. Participaram representantes do Amapá, Rondônia, Roraima, Tocantins, Goiás, Pará e Mato Grosso, além da equipe nacional do Programa e convidados da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). A presença de servidores experientes, pesquisadores e comunidades parceiras consolidou o encontro como um marco de integração entre conhecimento técnico e prática tradicional.

No primeiro eixo de atividades, o foco recaiu sobre decisões e alinhamentos que moldarão os próximos anos do Programa. Uma das discussões centrais tratou do georreferenciamento de áreas e tabuleiros monitorados pelo PQA. Essa etapa é parte do esforço para atualizar o marco normativo que orienta ações de conservação, atualmente baseado na antiga Portaria SUDEPE nº 24/1987. Com informações mais precisas e ferramentas digitais modernas, o Ibama busca aprimorar o ordenamento das áreas prioritárias e fortalecer a proteção de ambientes essenciais à reprodução de espécies como a Podocnemis expansa.

Outro ponto relevante do encontro foi o fortalecimento do Programa de Voluntariado. Em dezenas de praias e tabuleiros amazônicos, a atuação de voluntários tem sido decisiva para vigilância de ninhos, proteção contra a captura ilegal e mobilização comunitária. Ampliar essa rede significa aumentar a presença humana em locais estratégicos, garantindo mais segurança ao ciclo reprodutivo das tartarugas.

Também entrou em debate a elaboração de novos Acordos de Cooperação Técnica com instituições parceiras. O PQA tem reconhecida reputação nacional e internacional e, ao consolidar parcerias formais, fortalece intercâmbio científico, amplia financiamento e integra diferentes competências em prol da conservação.

Fechando o bloco administrativo, os coordenadores dedicaram cerca de dez horas à construção de um Procedimento Operacional Padrão para monitoramento populacional e reprodutivo. O objetivo é sistematizar, atualizar e tornar públicos os protocolos — básicos, intermediários e avançados — que colocaram o Programa entre as referências continentais em conservação de quelônios.

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Foto: PQA/DBFlo/Ibama

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Se o primeiro momento do encontro foi de planejamento, o segundo se dedicou ao campo. Realizar o treinamento no Tabuleiro de Monte Cristo, durante o período reprodutivo da Podocnemis expansa, permitiu vivenciar a rotina real das equipes envolvidas na proteção de ninhos e no estudo das populações. Antes mesmo do nascer do sol, os coordenadores já acompanhavam as fêmeas que haviam feito a postura durante a madrugada. Na luz suave da manhã amazônica, iniciavam-se as atividades de biometria de ninhos e indivíduos, manejo dos ovos e identificação de áreas sensíveis.

Uma parte essencial do treinamento envolveu o uso de tecnologias modernas para aprofundar o conhecimento sobre o comportamento das espécies. Foram instalados dataloggers nos ninhos, equipamentos que monitoram variações de temperatura ao longo do desenvolvimento embrionário. Esses dados ajudam a entender padrões de eclosão, taxas de sobrevivência e efeitos de mudanças ambientais.

Em outro momento, seis tartarugas adultas receberam transmissores via satélite (GPS) ou rádio VHF. A cada subida à superfície para respirar, os dispositivos enviam dados sobre deslocamento, permitindo mapear rotas migratórias, áreas de descanso e locais de alimentação. Esses registros ajudam a esclarecer lacunas históricas sobre o comportamento das populações e servem de base para a criação de novas estratégias de proteção de habitats.

Como manda a tradição do Programa, cada tartaruga equipada recebeu o nome de uma das coordenadoras presentes. Cris, Mari, Edelin, Soryane, Cíntia e Mônica agora representam não apenas indivíduos monitorados, mas também o simbolismo de um trabalho que une ciência, compromisso e identidade coletiva.

Segundo o coordenador nacional do PQA, Edelin Ribas, o objetivo é claro: entender com profundidade a vida desses animais para garantir sua sobrevivência em um cenário de pressões crescentes sobre os ecossistemas amazônicos. Conhecer o percurso de uma tartaruga ao longo de meses ou anos significa compreender caminhos de conservação que vão muito além do tabuleiro onde tudo começa.

O encontro no Tabuleiro de Monte Cristo reforça que proteger quelônios não é apenas preservar uma espécie. É defender a integridade de rios, praias, comunidades tradicionais e todo um mosaico ecológico que depende da saúde desses animais para permanecer equilibrado.