Jovens de diversas regiões do Brasil atravessaram continentes para fazer valer a voz da juventude periférica nas negociações climáticas da 29ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29), que está acontecendo até o dia 22 de novembro em Baku, no Azerbaijão. Ao longo dos 12 dias de evento, esses ativistas buscam visibilidade para suas demandas e pressionam por financiamento e políticas públicas que abordem os impactos climáticos em suas comunidades.
Coalizão COP das Baixadas
A Coalizão COP das Baixadas é um dos grupos que marcam presença na conferência. Formada por jovens de territórios periféricos, especialmente de Belém, no Pará, a coalizão visa dar visibilidade às realidades enfrentadas por aqueles que vivem em áreas com infraestrutura deficiente e alta vulnerabilidade aos desastres naturais, como inundações e movimentos de terra. “Nós falamos de jovens que, apesar de serem pesquisadores, vivem em áreas onde suas casas são constantemente alagadas, sofrem com as ilhas de calor e com um modelo de desenvolvimento voltado para a Amazônia que não é inclusivo, é eurocêntrico e preferem cimentar tudo, em vez de buscar soluções que respeitem o meio ambiente”, explica Waleska Queiroz, uma das fundadoras da Coalizão.
Jovens de 15 organizações da sociedade civil
O grupo, que conta com a participação de 15 organizações da sociedade civil, tem investido no desenvolvimento de ferramentas próprias para mapear como as baixadas, favelas e periferias brasileiras são impactadas pelos fenômenos climáticos extremos. Waleska destaca que o movimento não busca apenas expor as dificuldades, mas também construir soluções a partir da realidade vivida nessas comunidades, combatendo o racismo climático. “Acreditamos que as periferias têm um enorme potencial para se tornar agentes transformadores e para criar políticas climáticas eficazes. Foi assim que nasceu o Observatório das Baixadas, uma resposta à ideia errônea de que na periferia não se faz ciência.”
Pavilhão brasileiro da COP29
Uma das iniciativas mais importantes do grupo foi o lançamento da plataforma digital no pavilhão brasileiro da COP29. Com o título Das Favelas às Baixadas: Organizações Periféricas no Enfrentamento ao Racismo Ambiental, o painel apresentou a ferramenta interativa que traz um Atlas das Baixadas, oferecendo dados em tempo real sobre os riscos de desastres naturais como enchentes, tempestades e secas. “A democratização do acesso a dados sobre mudanças climáticas é fundamental. Não podemos falar de desenvolvimento sem considerar as populações mais afetadas”, explica Waleska.
Rede Vozes Negras pelo Clima
Outra representação jovem brasileira em Baku é a rede Vozes Negras pelo Clima, que foca nas interseções entre ação climática, raça e gênero. A rede preparou o relatório Nada Sobre Nós sem Nós, que traz uma agenda de justiça climática a partir das experiências de 11 mulheres negras de diferentes biomas do Brasil — Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste. “O objetivo é que as mulheres negras, que vivem de perto os impactos climáticos em seus territórios, sejam incluídas de forma efetiva nos processos de negociação”, explica Lídia Lins, cofundadora do coletivo Ibura Mais Cultura, de Pernambuco.
A rede Vozes Negras pelo Clima também tem como objetivo mobilizar para a COP30, que ocorrerá no Brasil. Lídia Lins enfatiza que a consulta digital e as conferências realizadas em diferentes esferas de poder não têm sido suficientemente inclusivas, deixando as populações mais vulneráveis de fora dos processos decisórios. “Os governos representam os povos, mas muitas vezes esquecem de ouvir aqueles que realmente vivem os impactos. Para que a crise climática seja superada, é preciso garantir que as pessoas afetadas diretamente sejam ouvidas”, argumenta.
De acordo com Lídia, o relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) de 2023 já aponta que o conhecimento técnico e o saber popular, gerado por comunidades tradicionais e povos indígenas, devem ser incorporados nas políticas climáticas. “As soluções para a crise climática não podem ser genéricas. Elas devem respeitar as especificidades de cada território. As comunidades quilombolas, indígenas e outras comunidades tradicionais já desenvolvem práticas de preservação e adaptação ao clima, mas essas soluções não são reconhecidas ou financiadas da forma como deveriam”, finaliza.
Para essas lideranças, a luta pela justiça climática é também uma luta pelo reconhecimento e valorização das soluções criadas nos próprios territórios, como forma de garantir que as populações mais vulneráveis sejam protagonistas na construção de um futuro mais sustentável.