Novas metas climáticas globais mostram avanço, mas não bastam


Um novo marco se desenha no combate global às mudanças climáticas. Ao divulgar o relatório síntese das novas metas nacionais de emissão — as NDCs — a UNFCCC lança luz sobre o que os governos realmente estão dispostos a fazer, para além dos discursos. Das 198 nações que fazem parte do Acordo de Paris, 64 países atualizaram seus compromissos entre janeiro de 2024 e setembro de 2025. Juntas, essas metas — se cumpridas — conseguiriam reduzir as emissões projetadas em cerca de 17% em relação a 2019. Ainda assim, no horizonte até 2030, a melhoria não passa dos modestos 6% — se compararmos com o que estava proposto nas versões anteriores.

Rovena Rosa/Agência Brasil

Esse cenário divulga duas leituras simultâneas. Por um lado, há um avanço visível: mais países comunicam metas que abrangem a economia inteira; 89% dos que atualizaram o compromisso cobrem todos os setores. Também houve avanço na forma: adaptação, financiamento, tecnologia e perdas e danos agora figuram como parte integral dos compromissos, não mais como apêndices opcionais. Porém, por outro lado, o ritmo e o escopo das metas ainda estão muito aquém do que a ciência aponta como necessário para limitar o aquecimento global ao nível de +1,5 °C ou mesmo +2 °C. O próprio relatório ressalta que, entre o conjunto de países que comunicaram novas NDCs, a redução projetada até 2035 atinge em média 17% abaixo de 2019 — enquanto os cenários científicos indicam que seriam necessárias quedas da ordem de 35% a 60% nesse mesmo período.

Na prática, isso significa que estamos vendo mais intenções, metas mais bem formuladas e com cobertura ampliada — o que representa um salto qualitativo — mas não o salto quantitativo nem o acerto de ritmo exigido para mudar realmente o rumo da crise. É o equivalente a “acelerar a caminhada”, quando o caminho ideal seria “correr”. Como bem sintetizou Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa: “Estamos gerindo uma crise sem a urgência de uma crise”.

O alerta de organizações como o WWF-Brasil reforça o chamado à ação: metas só têm valor se imediatamente acompanhadas de investimento maciço, governança robusta, mecanismos de financiamento escaláveis — em especial para países em desenvolvimento — e conexão direta com resultados concretos em setores como florestas, manguezais e soluções baseadas na natureza. A conservação florestal, por exemplo, ganha destaque não apenas pela mitigação de carbono, mas porque protege biodiversidade, água e resiliência social.

Outro ponto central: o tempo. A atualização das NDCs acontece no limiar de grandes encontros internacionais — entre eles a COP30, que ocorrerá em Belém (Brasil) em novembro de 2025 — e ainda faltam por entregar suas metas países que respondem por boa parte das emissões globais. O relatório está fundamentado apenas nas 64 que já formalizaram seus novos compromissos, o que representa cerca de 30% das emissões globais de 2019. Fazer essas metas valerem requer que o mundo responda agora — com políticas, investimentos e prazos reais — e não adie para as próximas décadas.

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Para o Brasil, o cenário é duplo: representa uma oportunidade de liderança — pois sedia a COP30 e pode influenciar a ambição global — e ao mesmo tempo uma responsabilidade, visto que os compromissos internacionais coincidem com desafios domésticos de desmatamento, infraestrutura, e financiamento climático. A nova rodada de metas é uma janela de renovação da agenda climática — mas também um termômetro de crédibilidade global.

Em resumo: há boas notícias — os países estão se mexendo, as metas estão mais abrangentes, os instrumentos mais alinhados com a realidade do planeta — mas a verdade dura permanece: não é suficiente. O mundo segue atrasado. A questão que paira agora é: vamos avançar além do “novo normal” de metas moderadas, e entrar de fato no território das metas radicais exigidas pela urgência climática? Ou vamos patinar em boas intenções, enquanto o relógio da crise mostra o tempo passando?

O relatório da UNFCCC deixa claro: o “que está sendo feito” já não basta — precisamos saber quando e como será feito. E cada país, cada setor, cada cidadão, tem papel nessa virada.