Na COP30, realizada em Belém em 2025, as águas do planeta finalmente receberam o protagonismo que merecem. Um mapeamento conduzido pelo Mutirão Azul revelou que das 69 iniciativas voltadas à ação climática no oceano identificadas durante a conferência, mais de 60% são lideradas por mulheres — um dado que ilumina a urgência de reconhecermos a voz feminina na construção de soluções ambientais.

Esses projetos abrangem um leque diverso: desde programas comunitários e ações de organizações não governamentais, até iniciativas de governos, escolas e empresas. Para muitos, representam não apenas criatividade e engajamento, mas uma esperança concreta de transformar o oceano em aliada na luta contra a crise climática. A COP30 marcou também o momento em que os oceanos ganharam um espaço formal e simbólico nas decisões climáticas globais: pela primeira vez, a agenda azul fez parte do documento final da conferência — um reconhecimento inédito da importância dos mares.
Entre os avanços oficiais, destaca-se o lançamento do Pacote Azul, um conjunto de medidas estruturadas para promover conservação e restauração de ecossistemas costeiros, adaptação costeira, proteção de recifes e manguezais, além da integração de soluções marítimas nos planos climáticos nacionais. Esse pacote pretende oferecer um roteiro prático e replicável para transformar compromissos climáticos em ações reais.
Para coordenar esse esforço global, foi criada a Força-Tarefa Oceânica — uma parceria entre Brasil e França que visa integrar soluções oceânicas às Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) de diversos países. A iniciativa também busca mobilizar apoio técnico e financeiro e facilitar o alinhamento entre governanças nacionais e compromissos globais.
A ascensão da economia do mar — a “economia azul” — ganha corpo com atores estratégicos no setor privado e da sociedade civil. Entre eles, a AYA Earth Partners e a Systemiq LatAm se destacam como difusoras de inovação e transição ecológica. Em Belém, a AYA assumiu papel central na curadoria da “Casa Brasil”, espaço de diálogo e visibilidade da agenda climática.
Contudo, embora o reconhecimento político e a mobilização da sociedade civil represente um avanço, o financiamento destinado à agenda azul segue muito aquém do necessário. Segundo a conselheira da AYA, Patrícia Ellen, menos de 1% do financiamento climático global vai para os oceanos — um dado que contrasta com a importância estratégica desse ecossistema para captura de carbono, biodiversidade, segurança alimentar e regulação climática.

SAIBA MAIS: Mulheres exigem que justiça climática inclua justiça de gênero
Ela alerta que a retórica da COP30 só ganhará peso se vier acompanhada de recursos concretos: “Sem instrumentos financeiros robustos, sem governança clara, monitoramento e mecanismos de responsabilização, o risco é que os oceanos continuem subfinanciados — mesmo com toda essa visibilidade e discurso”.
Além disso, especialistas destacam os perigos de que a chamada “economia azul” se transforme, inadvertidamente, em “degradação azul” — ou seja, exploração predatória disfarçada de sustentabilidade. A transição energética e econômica exigida pelo clima deve caminhar junto à preservação dos ecossistemas marinhos, evitando que a proteção ambiental seja sacrificada em nome de novos empreendimentos.
A COP30 representou, portanto, um momento de virada: os oceanos saíram das margens da discussão climática para ocupar o centro das decisões. No entanto, para que essa mudança se traduza em resultados reais — recuperação de manguezais e recifes, proteção de comunidades costeiras, redução de emissões e resiliência da biodiversidade marinha —, será preciso um salto de compromisso: mais recursos, melhor governança e fortalecimento do protagonismo social, especialmente das mulheres que já demonstraram capacidade de liderar soluções concretas.
A tarefa de transformar promessas em ação recai sobre governantes, financiadores, sociedade civil e setor privado. A agenda azul não pode morrer na retórica da conferência. Se for cuidada com ambição, responsabilidade e justiça, pode representar não apenas a salvação dos oceanos — mas a sobrevivência de comunidades e ecossistemas inteiros e, em última instância, a esperança de um clima mais equilibrado para o planeta.













































