A química contemporânea domina a arte de construir e desmontar moléculas de oxigênio, mas muitas vezes recorre a métodos intensivos que pouco dialogam com o equilíbrio natural. Fragmenta compostos com calor, radiação e altas energias para compreendê-los ou transformá-los. Funciona, mas está distante das reações silenciosas e precisas observadas todos os dias na natureza, onde a matéria circula sem rupturas e sem deixar resíduos tóxicos. É esse contraste que revela o quanto ainda temos a aprender.
Nos processos naturais, moléculas se reorganizam de forma elegante. Quando um jaguar metaboliza a carne de sua presa ou quando plantas transformam luz solar em folhas e caules, entram em ação sistemas catalíticos altamente eficientes que dependem apenas da energia presente no ambiente. Nesses casos, o equilíbrio é a regra, não a exceção. Cada reação ocorre dentro de parâmetros físicos específicos, moldados pela pressão atmosférica, temperatura, incidência de luz e disponibilidade de água.
A natureza, porém, não opera apenas no ambiente-padrão. Nos altiplanos andinos, onde a água ferve a temperaturas inferiores, nos fundos oceânicos, onde gases e água formam hidratos sob pressão extrema, ou nos trópicos, onde decomposição e oxidação avançam rapidamente, os processos químicos também se ajustam. É nesses cenários tropicais intensos que ganha destaque um fenômeno fundamental: a formação de oxigênio altamente energético, extremamente reativo e com vida curta.
Enquanto o oxigênio comum é estável o suficiente para permitir a vida, sua forma energética reage espontaneamente com moléculas orgânicas, degradando pigmentos, fragilizando plásticos ou acelerando a queda das folhas no outono, quando as plantas reduzem sua produção de compostos protetores. A natureza conhece esse risco e desenvolveu defesas ao longo da evolução. A indústria, por outro lado, sempre buscou controlar o processo sem sucesso pleno — até recentemente.

SAIBA MAIS: A Terra se tornará inabitável quando o oxigênio da Terra acabar
Foi justamente essa lacuna que motivou a pesquisa liderada pelo físico Carlos Diaz Navarrete, da Universidad de Santiago de Chile (linkada ao nome), que conseguiu realizar algo inédito: produzir oxigênio ativo de modo controlado e estabilizá-lo tempo suficiente para aplicação técnica. A solução utiliza nanobolhas ultrafinas capazes de transferir a energia do oxigênio ativado para a água, criando um meio reativo que degrada gorduras, resíduos orgânicos, bactérias, vírus e pragas.
Essa tecnologia abre uma nova fronteira para setores que vão do saneamento à agricultura. Em estações de tratamento de esgoto, acelera a decomposição de gorduras e aumenta a eficiência dos tanques de aeração. No campo, permite controlar pragas sem pesticidas químicos, ao mesmo tempo em que melhora o manejo da água e reduz os riscos de eutrofização em pisciculturas. O efeito desinfetante também tem potencial em ambientes urbanos, como escolas, restaurantes, ônibus e navios, que podem ser higienizados sem substâncias tóxicas e com segurança imediata para uso.
O uso mais transformador, no entanto, surge na produção de água potável. Integrada a sistemas solares, a tecnologia possibilita unidades totalmente autossuficientes capazes de filtrar, dessalinizar e esterilizar água em áreas remotas. Nessas condições, basta ar, luz e qualquer fonte hídrica — mesmo salobra — para produzir água limpa.
A inovação foi reconhecida como a mais sustentável do ano na EXPOMIN 2025 (linkada ao nome), o maior evento de mineração da América Latina, evidenciando seu potencial para transformar processos industriais historicamente dependentes de químicos agressivos.
Quem apresenta essa trajetória é o químico Andreas Martens, ex-professor da Technische Universität Braunschweig, professor visitante da Universidade de São Paulo (USP) e cofundador da Euro Brazil Business Access. Para ele, trata-se de um retorno ao maior laboratório já existente: a própria natureza. Ela demonstrou durante milhões de anos como transformar, decompor e renovar matéria sem comprometer o ambiente. Agora, a tecnologia finalmente começa a acompanhá-la.








































