A apneia do sono frequentemente está associada à pressão alta, o que, por sua vez, aumenta os riscos à saúde cardíaca ligados a ambas as condições. Agora, cientistas identificaram dois produtos químicos cerebrais que desempenham um papel nessa reação em cadeia, abrindo caminho para novas terapias.
Em um estudo com ratos de laboratório, publicado em maio no The Journal of Physiology, os cientistas focaram em duas substâncias produzidas pelo cérebro, conhecidas por afetar a pressão arterial: a oxitocina, famosa por suas funções em vínculos sociais e afetivos, e o hormônio liberador de corticotropina (CRH). O objetivo era entender como esses dois “neuro-hormônios” influenciam o tronco cerebral, uma estrutura na base do cérebro responsável pelo controle de diversas funções involuntárias, incluindo a regulação da pressão arterial.
Pessoas com apneia do sono param temporariamente de respirar durante o sono, privando o corpo de oxigênio por breves momentos. Isso coloca o organismo em um estado de hipóxia, ou seja, de baixo oxigênio. “Quando o corpo fica com pouco oxigênio, uma condição chamada de hipóxia, isso desencadeia um reflexo que nos faz querer aumentar a respiração para restaurar os níveis de oxigênio”, explicou o Dr. David Kline, professor da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Missouri, que supervisionou o estudo. “Também provoca um aumento na pressão arterial para garantir que o sangue oxigenado chegue onde é necessário”, disse Kline ao site Live Science.
Embora já se soubesse que tanto a oxitocina quanto o CRH podem alterar a pressão arterial, seus efeitos após esses surtos breves e repetitivos de hipóxia não eram completamente compreendidos.
Os pesquisadores realizaram experimentos com ratos de laboratório divididos em dois grupos: um grupo foi mantido em níveis normais de oxigênio, enquanto o segundo grupo foi submetido a condições de baixo oxigênio, imitando aspectos dos episódios de apneia do sono. O experimento durou 10 dias, após os quais os cientistas coletaram amostras dos troncos cerebrais dos ratos para analisar a atividade neuronal por meio de várias técnicas. Amostras adicionais de tecido cerebral foram examinadas ao microscópio para avaliar a atividade da oxitocina e do CRH, e uma contagem específica de células cerebrais que respondem a esses produtos químicos foi realizada manualmente.
Tanto a oxitocina quanto o CRH são produzidos por células em uma estrutura chamada núcleo paraventricular (PVN). Essas células do PVN estão conectadas a um importante centro sensorial no tronco cerebral, que recebe sinais do corpo e ajuda a regular o sistema cardiovascular, incluindo a pressão arterial. O estudo mostrou que a hipóxia intensifica a influência desses dois produtos químicos.
Os dois compostos tiveram um efeito mais forte na atividade do tronco cerebral dos ratos hipóxicos em comparação com os ratos mantidos em níveis normais de oxigênio. Após os episódios de baixa oxigenação, houve um aumento na liberação dos produtos químicos pelo PVN, bem como um aumento no número de receptores com os quais eles se conectam no tronco cerebral. Como resultado, o número de sinais disparados pelo centro sensorial do tronco cerebral também aumentou.
Com base nesses achados, Kline sugeriu que a apneia do sono pode estar exacerbando os efeitos da oxitocina e do CRH no tronco cerebral, o que pode resultar no aumento da pressão arterial.
Em outras palavras, a liberação desses compostos após episódios de hipóxia faz com que a pressão arterial suba cada vez mais, segundo Kline. Com o tempo, se isso ocorrer com frequência, a pressão arterial pode permanecer elevada porque as regiões cerebrais responsáveis por seu controle foram alteradas, ele hipotetizou.
No entanto, este estudo não investigou explicitamente os mecanismos por trás desse processo; o grupo de pesquisa está agora trabalhando em estudos que possam esclarecer essas questões.
Depois que mais substâncias envolvidas no mecanismo forem identificadas, será possível desenvolver medicamentos específicos para reduzi-la em pacientes com apneia do sono, disse Kline. Ele observou que medicamentos que afetam todo o cérebro podem não ser a melhor opção, porque os efeitos da oxitocina e do CRH dependem de quais regiões cerebrais estão sendo ativadas. Em outras áreas do tronco cerebral, por exemplo, esses compostos podem, na verdade, diminuir a pressão arterial, ao contrário do que foi observado na região estudada pela equipe.
“No entanto, na zona em que focamos, ambos os compostos tiveram um efeito elevador”, afirmou Procopio Gama de Barcellos Filho, pesquisador de pós-doutorado no laboratório de Kline e líder do estudo, ao Live Science.
“Acredito que toda essa pesquisa básica realmente abrirá novos caminhos que podem ser explorados por clínicos e pela indústria farmacêutica”, disse Kline. No entanto, ele alertou que ainda há um longo caminho a percorrer até que essas descobertas possam ser transformadas em uma abordagem terapêutica para pacientes humanos.
Fonte: Future US