O incêndio que atingiu um estande na Zona Azul da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas provocou mais do que fumaça e correria na tarde de quinta-feira em Belém. O episódio acabou interferindo diretamente no ritmo das negociações e obrigou uma reavaliação do cronograma da COP30, evento organizado pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, parte do sistema da Organização das Nações Unidas. A área atingida, peça central das tratativas multilaterais, chegou a ser evacuada, e os trabalhos só puderam ser retomados à noite, quando a segurança foi restabelecida.

Foi nesse intervalo que o presidente da COP30, o diplomata brasileiro André Corrêa do Lago, concedeu uma entrevista à TV Brasil para comentar o impacto do incidente sobre um processo já naturalmente tenso e complexo. Às vésperas do encerramento oficial, inicialmente previsto para sexta-feira, ele foi categórico ao reconhecer que a conferência deve se estender além do planejado para garantir que as negociações avancem com o cuidado necessário.
Segundo Corrêa do Lago, a equipe organizadora passou a noite de quinta-feira reorganizando agendas, reestruturando consultas e acionando canais alternativos de diálogo para evitar que o imprevisto contaminasse o horizonte das discussões. Durante algumas horas, diplomatas trabalharam online e por telefone, numa tentativa de manter a linha do tempo das decisões sem comprometer a natureza presencial e sensível das conversas que definem, ponto a ponto, os compromissos climáticos internacionais.
O presidente da conferência destacou que a reabertura da Zona Azul permitirá a retomada das reuniões formais desde as primeiras horas da manhã desta sexta. Mas relativizou qualquer previsão rígida de encerramento. As conferências do clima, lembrou ele, têm um histórico de ultrapassar seus prazos oficiais, seja por divergências de última hora, seja pela necessidade de acomodar as demandas de grupos regionais diversos. O incêndio, portanto, entrou como mais um fator num ambiente já marcado por tensões geopolíticas e disputas sobre financiamento climático.

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Corrêa do Lago explicou que a complexidade das negociações não decorre apenas dos aspectos técnicos, mas também do cenário internacional, que vive um momento de fragmentação e desconfiança entre blocos. Questões como a eliminação dos combustíveis fósseis, o financiamento para adaptação e os mecanismos de perdas e danos seguem sendo tratadas como pilares essenciais de qualquer acordo final. Porém, cada um desses temas envolve interesses econômicos profundos, pressões domésticas e interpretações divergentes sobre responsabilidades históricas.
Apesar do cenário desafiador, o diplomata se mostrou otimista. Há uma vontade perceptível de construir um resultado ambicioso, afirmou ele, e isso faz diferença. Nos bastidores, equipes se movimentam para elaborar textos de consenso capazes de oferecer respostas à altura da crise climática. A conferência realizada em Belém ganha importância adicional por ocorrer na Amazônia, região emblemática da biodiversidade global e ao mesmo tempo vulnerável às pressões de desmatamento, mudanças no regime de chuvas e degradação ambiental.
Os próximos passos dependem da capacidade de costurar acordos nos bastidores. Ainda na tarde de sexta, Corrêa do Lago espera ter uma noção mais clara de quando a COP30 poderá ser concluída, embora reconheça que o prolongamento é a regra e não a exceção. Em sua avaliação, forçar o encerramento sem amadurecer as negociações seria pior do que estender os trabalhos por mais algumas horas – ou dias.
O presidente da COP30 alertou também para o risco de um resultado aquém do esperado descredibilizar o multilateralismo. Se a conferência falhar em produzir avanços concretos, argumentou ele, a percepção pública sobre a efetividade das negociações climáticas pode sofrer um impacto sério, alimentando narrativas de descrença e paralisia política. No entanto, um bom acordo – mesmo que atrasado – pode influenciar de forma decisiva a vida das pessoas ao orientar políticas públicas, destravar investimentos e incentivar ações mais rápidas por parte dos governos.
A sensação entre os participantes é de que o incêndio foi um contratempo importante, mas não suficiente para desviar o curso de uma conferência que já vinha marcada por expectativas elevadas. A COP30 segue, agora com um ritmo mais cuidadoso, tentando conciliar urgência com profundidade. O cronograma pode escorregar, mas o objetivo central permanece firme: entregar uma resposta coletiva capaz de enfrentar o momento climático mais decisivo da história contemporânea.













































