A restauração florestal, quando alinhada aos princípios da bioeconomia, pode não apenas contribuir para a recuperação ambiental, mas também gerar novas oportunidades econômicas. Essa é a principal conclusão de um estudo recente publicado na revista Sustainability Science, que destaca o potencial da restauração de florestas como uma estratégia eficaz para combater as mudanças climáticas e promover o desenvolvimento sustentável.
De acordo com Pedro Krainovic, primeiro autor da pesquisa e pós-doutorando da FAPESP no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP), a restauração florestal, especialmente com o uso de espécies nativas, pode gerar uma série de benefícios socioeconômicos a longo prazo. “A restauração é uma das formas mais eficazes de enfrentar as mudanças climáticas provocadas pela ação humana, trazendo impactos positivos que podem ser sustentados por décadas”, explica Krainovic.
O estudo aponta que uma das formas de viabilizar o retorno financeiro da restauração florestal é por meio da criação de florestas multifuncionais. Estas florestas, ao fornecerem serviços ambientais como regulação do clima e conservação do solo, podem gerar receitas com a comercialização de créditos de carbono e produtos florestais, como madeira nativa, fármacos e cosméticos, além de outros itens não madeireiros.
Em áreas da Amazônia brasileira, por exemplo, os sistemas agroflorestais, que combinam cultivo agrícola com árvores nativas, demonstram ser mais lucrativos que atividades como a pecuária e o cultivo de soja, ao mesmo tempo em que ajudam na recuperação de ecossistemas degradados. O estudo revela que, enquanto um hectare de pasto pode gerar entre US$ 60 e US$ 120 por ano, e a soja flutua entre US$ 104 e US$ 135, a colheita de produtos não madeireiros em sistemas agroflorestais pode resultar em lucros de até US$ 650 por hectare anualmente.
No entanto, os pesquisadores alertam para a necessidade de cuidados ao explorar áreas restauradas. O manejo inadequado pode comprometer o trabalho de recuperação, e ainda não há um consenso técnico sobre o equilíbrio ideal entre exploração econômica e preservação. Krainovic ressalta que é fundamental um controle regulatório rigoroso para garantir que a exploração de recursos florestais não leve à degradação do ambiente restaurado.
Outro desafio identificado é a competitividade dos produtos florestais nativos em relação às commodities de espécies exóticas. Atualmente, o mercado de produtos naturais é dominado por espécies exóticas e não arbóreas, que são mais baratas e têm processos produtivos bem estabelecidos. Isso torna difícil a inserção de produtos provenientes da restauração florestal nativa. “Para competir, é necessário criar incentivos e regulamentações que promovam esses novos produtos”, sugere Krainovic.
Restauração florestal bioeconômica
O estudo propõe a criação do conceito de restauração florestal bioeconômica, que enfatiza a importância de agregar valor à floresta em pé, preservando a biodiversidade e utilizando espécies nativas, ao mesmo tempo em que envolve as comunidades locais e fomenta a cooperação entre os setores público e privado. Krainovic destaca a necessidade urgente de se buscar soluções que integrem esses aspectos para uma adaptação climática eficaz.
Sergio de Miguel, coautor do artigo e chefe do grupo de pesquisas sobre ecossistemas do Centro Tecnológico Florestal da Catalunha (CTFC), complementa: “Este estudo fornece um guia claro sobre como a restauração florestal pode contribuir tanto para o desenvolvimento socioeconômico quanto para as soluções baseadas na natureza, ajudando a mitigar os impactos das mudanças climáticas globais.”
A pesquisa revela que a restauração florestal, quando acompanhada de uma abordagem bioeconômica, oferece um caminho promissor e sustentável para a recuperação dos ecossistemas e o fomento à economia local, ao mesmo tempo em que contribui para os esforços globais de adaptação às mudanças climáticas.
O artigo completo, intitulado Current constraints to reconcile tropical forest restoration and bioeconomy, pode ser acessado em https://link.springer.com/article/10.1007/s11625-024-01573-8.