Seis anos da tragédia de Brumadinho

Autor: Redação Revista Amazônia

Alerta para novas barragens, impunidade e busca por justiça

Seis anos após o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG), o Brasil ainda enfrenta desafios significativos relacionados à segurança das barragens de rejeitos de mineração e à busca por justiça e reparação para as vítimas da tragédia. O desastre, ocorrido em 25 de janeiro de 2019, resultou na morte de 270 pessoas e no desaparecimento de mais uma vítima, além de impactos ambientais e sociais irreversíveis. Apesar das promessas de fiscalização e melhoria das condições dessas estruturas, dados recentes revelam que mais de 40 barragens em Minas Gerais ainda estão em nível de alerta ou emergência. Paralelamente, moradores afetados denunciam negligência no pagamento de indenizações e a morosidade da justiça em punir os responsáveis pelo crime ambiental.

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Risco de novas tragédias

Atualmente, Minas Gerais abriga 43 barragens em níveis de alerta ou emergência, representando 42% do total de estruturas nessa situação no país. Entre essas, 15 estão classificadas em nível de alerta, 22 em nível de emergência 1, quatro em nível de emergência 2 e duas em emergência 3, indicando risco iminente de rompimento.

As duas barragens em situação mais crítica são a Forquilha III, da Vale, localizada em Ouro Preto, e a Serra Azul, da ArcelorMittal, em Itatiaiuçu. Ambas foram construídas pelo método a montante, o mesmo utilizado na barragem da Vale que colapsou em Brumadinho. Após o desastre, a construção e o alteamento de barragens desse tipo foram proibidos no Brasil. No entanto, a descaracterização dessas estruturas, que deveria ter sido concluída até fevereiro de 2022, segue em atraso, com previsão de finalização apenas em 2035 para algumas delas.

Especialistas alertam para o risco de novos desastres caso a desativação dessas barragens não seja acelerada. “A negligência no cumprimento dos prazos de descaracterização é preocupante. Estamos sentados em bombas-relógio que podem explodir a qualquer momento”, afirma o engenheiro de minas e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Carlos Mendonça.

A luta por justiça e indenizações

Seis anos após a tragédia, muitas famílias de Brumadinho e região ainda lutam para receber indenizações e por melhores condições de vida. Moradores denunciam que o Programa de Transferência de Renda (PTR), parte do Acordo Judicial de Reparação homologado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, tem excluído muitas pessoas atingidas. Entre as afetadas está Renata Resende, moradora da Região do Bom Jardim, em Mário Campos, a apenas um quilômetro do local do rompimento. Ela afirma não ter sido contemplada pelo programa, mesmo estando diretamente impactada pelo desastre.

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Imagem: Luiz Rocha / Mídia Ninja

 

“Não fomos reconhecidos como atingidos. Nossa terra foi afetada, o rio que usamos para plantar foi contaminado, mas para a Vale nós simplesmente não existimos”, desabafa Renata, que já havia enfrentado outra tragédia semelhante em 2001, quando perdeu o marido no rompimento da barragem da Mineração Rio Verde, em Nova Lima.

Carmem Sandra de Paula, residente do Córrego do Feijão, perdeu vários familiares na tragédia e afirma que, em vez de reparação, presenciou a descaracterização da comunidade. “Demoliram tudo e construíram outras coisas no lugar, como um estacionamento. Parece que estão apagando nossa história”, lamenta.

A impunidade dos responsáveis

Apesar das investigações e dos processos judiciais em andamento, ainda não houve condenações criminais relacionadas ao desastre. Em 2022, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o julgamento dos responsáveis deveria ser feito na Justiça Federal, anulando atos da Justiça de Minas Gerais e atrasando o andamento do caso.

A decisão revoltou familiares das vítimas e membros do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que denunciam a morosidade e a falta de prioridade na punição dos envolvidos. “Se fosse um crime cometido por uma pessoa pobre, já haveria condenação. Mas como envolve uma grande mineradora, a justiça se arrasta”, critica a advogada de direitos humanos Maria Augusta Santos.

Recentemente, o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG) cancelou o registro do geólogo César Grandchamp, um dos réus no processo criminal. Ele foi um dos signatários do laudo que atestou a estabilidade da barragem meses antes do colapso. A decisão foi baseada em “má conduta pública e escândalo”. Com isso, ele está impedido de exercer sua profissão.

 Seis anos depois, a tragédia de Brumadinho segue como um símbolo de negligência, impunidade e sofrimento para os atingidos. Ao mesmo tempo, a existência de dezenas de barragens em estado crítico em Minas Gerais reforça a urgência de políticas mais rigorosas de fiscalização e descaracterização dessas estruturas. A luta por justiça continua, enquanto a memória das vítimas permanece como um alerta para que tragédias semelhantes não se repitam.


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