O Brasil vem testando sua habilidade de diplomacia ambiental com uma proposta que promete marcar a COP30, em Belém: a criação do Tropical Forest Finance Facility (TFFF), um fundo global para financiar a conservação de florestas tropicais. Diferente de mecanismos de doação tradicionais, o TFFF aposta em uma lógica de investimento de longo prazo, em que países, bancos e investidores aportariam bilhões de dólares para formar um capital inicial robusto. Os rendimentos desse patrimônio seriam distribuídos entre as nações que comprovarem, por monitoramento satelital, sua eficiência em manter a floresta de pé.
A proposta, lançada em 2023 durante a COP28 em Dubai, enfrentou ceticismo inicial. Parecia ousado reunir os US$ 25 bilhões exigidos para a largada e chegar à meta de US$ 125 bilhões, considerados necessários para o funcionamento ideal do mecanismo. Mas, desde então, o Brasil vem conquistando apoios estratégicos.
Em agosto, os países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) endossaram formalmente a iniciativa, incentivando governos, bancos de desenvolvimento, fundos climáticos e até filantropias a realizar aportes ambiciosos. Já em julho, durante a 17ª cúpula do BRICS no Rio de Janeiro, o bloco apoiou oficialmente o TFFF, classificando-o como um “instrumento financeiro promissor” para gerar fluxos previsíveis e de longo prazo na conservação das florestas.
O rol de apoiadores já inclui países como Noruega, Reino Unido, Alemanha, Estados Unidos, Emirados Árabes Unidos, França, além de nações tropicais como Colômbia, República Democrática do Congo, Gana, Indonésia e Malásia.
A engenharia financeira do TFFF
O diferencial do TFFF está em seu modelo de “geração de receita”. Os aportes seriam aplicados em títulos de dívida de países em desenvolvimento, com retorno médio de 6% a 8% ao ano. Aos investidores, o fundo devolveria entre 4% e 4,5%. A diferença seria canalizada para pagamentos de conservação florestal. O desenho promete previsibilidade: cerca de US$ 4 por hectare de floresta conservada, ajustados anualmente pela inflação.
O sistema também prevê penalidades rigorosas. Para cada hectare desmatado, haveria descontos proporcionais de até 200 hectares no cálculo dos pagamentos. Em casos de degradação por fogo, aplica-se um desconto de 1:35. A lógica é simples: quem preserva recebe, quem destrói perde.
Outra condição é que pelo menos 20% dos recursos repassados sejam destinados diretamente a povos indígenas e comunidades tradicionais, assegurando que os guardiões históricos das florestas não sejam deixados de lado.

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Apoios, dúvidas e resistências
O entusiasmo brasileiro contrasta com a realidade de uma Amazônia pressionada por incêndios criminosos e agendas energéticas baseadas em combustíveis fósseis. Isso alimenta dúvidas sobre a viabilidade política do projeto e sobre se o país conseguirá apresentar mais do que boas intenções em Belém.
Críticos também apontam riscos. Em relatório publicado em abril, a Global Forest Coalition (GFC) e a Fundación Solón chamaram o TFFF de “falsa solução”, acusando-o de reduzir florestas a ativos financeiros e de se apoiar em números arbitrários, como o pagamento de US$ 4 por hectare. Para os autores, o modelo representa “capitalismo verde”, que ignora o valor intrínseco da biodiversidade.
Ainda assim, o governo brasileiro vê no fundo sua aposta mais ambiciosa. Para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a proposta é uma chance de virar o jogo: transformar compromissos climáticos vagos em um mecanismo permanente, simples e transparente.
A corrida até Belém
Analistas brasileiros, como Leonardo Sobral, do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), acreditam que o TFFF pode ser lançado já em 2026. Ele destaca a exigência de transparência e monitoramento confiável como trunfos para manter investidores e sociedade civil engajados. “O fundo será aberto a comentários públicos, permitindo denúncias em caso de irregularidades”, afirma.
Outro ponto crucial é o interesse da China. Fontes confirmaram que o tema esteve em pauta em encontros entre o ministro da Fazenda brasileiro, Fernando Haddad, e seu homólogo chinês, Lan Fo’an. Caso se concretize, o aporte chinês pode sinalizar uma guinada e atrair outras economias emergentes.
Seja como marco histórico ou como experiência ainda incerta, o TFFF coloca o Brasil no centro da discussão global sobre como conciliar finanças internacionais com a preservação de ecossistemas vitais. O sucesso da proposta dependerá menos de discursos e mais da capacidade de engajar capital, e transformá-lo em florestas de pé.







































