Por trás das negociações políticas que marcarão a COP30 em Belém, está um núcleo silencioso, mas estratégico: o Conselho Científico sobre o Clima. Formado por 11 especialistas, seis brasileiros e cinco estrangeiros, o grupo foi criado para assessorar o embaixador André Corrêa do Lago, presidente da conferência, com dados técnicos e propostas baseadas em ciência. A missão é ambiciosa: oferecer fundamentos sólidos para que mais de 190 países cheguem a consensos sobre o futuro climático do planeta.

À frente desse esforço está a pesquisadora brasileira Thelma Krug, ligada ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Com mais de duas décadas de atuação no Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), onde chegou a ocupar a vice-presidência, Thelma se consolidou como uma das maiores referências internacionais na área.
Apesar dos desafios que cercam a COP30, sua postura é de otimismo cauteloso. Para ela, é preciso equilibrar a gravidade da emergência climática com uma narrativa que também traga esperança. “Se só falamos em catástrofe, corremos o risco de paralisar a sociedade, sobretudo os jovens, que já apresentam sinais de ansiedade e desgaste emocional diante desse futuro sombrio. Precisamos mostrar que muita coisa já foi feita na última década e que ainda é possível avançar”, afirma.
Mutirão climático em vez de espera por recursos
Thelma Krug defende que o encontro em Belém seja mais do que uma arena de cobranças financeiras dos países ricos. O financiamento climático, reconhece, é vital, mas não pode ser o eixo exclusivo das discussões. “Se ficarmos esperando o dinheiro chegar, vamos paralisar as ações. Não tenho esperança de que esse financiamento venha na escala necessária, pelo menos não agora. O que precisamos é de um mutirão de medidas concretas, envolvendo energia, agricultura, equidade social e soluções locais”, destaca.
Essa visão amplia o horizonte da agenda. Em vez de depender de negociações longas e muitas vezes frustradas sobre quem deve pagar a conta da transição verde, a proposta é multiplicar iniciativas práticas, capazes de gerar resultados imediatos e inspirar mudanças estruturais.

Para além da questão financeira, a coordenadora científica da COP30 aponta outro desafio central: manter a coesão entre os países. O processo multilateral exige que mais de 190 nações, com interesses e vulnerabilidades climáticas distintas, aprovem decisões por consenso. Nesse cenário, cada vírgula pode travar negociações.
“É um processo muito complicado, porque não estamos falando de países iguais. Há nações insulares ameaçadas de desaparecer pelo aumento do nível do mar, economias emergentes que ainda dependem fortemente de combustíveis fósseis e potências industriais com responsabilidades históricas. Manter esse diálogo vivo é, em si, uma vitória. O maior risco é a fragmentação”, alerta Thelma.
Esse temor se acentuou com o afastamento temporário dos Estados Unidos
do Acordo de Paris, que, segundo a pesquisadora, não pode servir de pretexto para comprometer o espírito coletivo da COP30.
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Ciência como base de decisões políticas
O Conselho Científico sobre o Clima tem debatido temas complexos, como as tecnologias de remoção de dióxido de carbono (CO2) da atmosfera. Entre as alternativas em análise estão o reflorestamento em larga escala e o sequestro de carbono em formações geológicas submarinas. Apesar das dificuldades técnicas e financeiras, a avaliação é que tais estratégias precisarão compor o cardápio de soluções. Isso porque será extremamente difícil alcançar emissões líquidas zero até 2050 apenas com cortes tradicionais.
Ainda assim, Thelma insiste que o papel da ciência não é pintar cenários impossíveis, mas fornecer trilhas viáveis para governos e sociedades. “A ciência deve servir de base às políticas públicas. Cabe a nós mostrar caminhos possíveis, mesmo diante da complexidade e das incertezas”, conclui.
A COP30 em Belém não é apenas um encontro diplomático. Para a comunidade científica brasileira, é também uma oportunidade de mostrar que a Amazônia pode ser protagonista em soluções globais. Ao mesmo tempo em que concentra biodiversidade vital para o planeta, a região enfrenta pressões intensas do desmatamento, mineração e desigualdade social.
O apelo de Thelma Krug é claro: transformar a COP30 em um mutirão de ações que inspire governos, empresas e cidadãos a agir agora, sem esperar que promessas financeiras sejam cumpridas no futuro. Entre alertas e esperanças, a cientista traduz o espírito da conferência: enfrentar a emergência climática com realismo, mas também com coragem e solidariedade.






































