Um marco inédito na ciência foi alcançado por pesquisadores da Universidade de São Paulo e da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. Eles conseguiram extrair insulina humana do leite de uma vaca transgênica criada no sul do Brasil.
Este feito sem precedentes foi publicado na revista Biotechnology Journal na última terça-feira (12). A tecnologia ainda precisa ser submetida a mais testes e, futuramente, a uma série de regulamentações. No entanto, se for bem-sucedida, pode inaugurar uma nova era na produção de insulina, contribuindo para resolver problemas enfrentados por pessoas com diabetes, como a escassez do hormônio e seus altos custos.
“O design da natureza fez da glândula mamária uma fábrica eficiente para a produção de proteínas. Podemos aproveitar esse sistema para produzir uma proteína que pode ajudar centenas de milhões de pessoas ao redor do mundo”, disse o pesquisador Matt Wheeler, da Universidade de Illinois, em um comunicado.
Para obter a insulina humana do leite de vaca, os cientistas inseriram um segmento de DNA humano no núcleo celular de dez embriões bovinos. Em seguida, os embriões foram implantados no útero de vacas comuns, resultando no nascimento de um bezerro transgênico.
O segmento de DNA humano, além de conter informações da pró-insulina (proteína precursora da insulina ativa), foi geneticamente programado para se expressar apenas nos tecidos mamários do animal. “Isso significa que não havia insulina humana circulando no sangue da vaca ou em outros tecidos”, explica Wheeler.
Quando a vaca transgênica atingiu a maturidade, os pesquisadores tentaram fazê-la engravidar usando técnicas de inseminação artificial. Sem sucesso, recorreram a uma alternativa: estimular a lactação por meio de hormônios, o que funcionou.
O animal produziu menos leite do que produziria em uma gestação normal. No entanto, o leite continha tanto a pró-insulina quanto, surpreendentemente, a insulina. “Nosso objetivo era produzir pró-insulina, purificá-la para insulina e seguir a partir daí. Mas a vaca basicamente processou por conta própria”, relata o pesquisador.
Em um litro de leite, foram detectados alguns gramas de insulina e pró-insulina. Ainda não se sabe exatamente quanto de insulina poderia ser obtida a partir de uma lactação normal da vaca, mas os pesquisadores estimam, de forma conservadora, que poderia haver um grama do hormônio a cada litro de leite.
Considerando que uma unidade de insulina geralmente corresponde a 0,0347 miligramas, um litro de leite contendo um grama do hormônio poderia resultar em 28.818 unidades do medicamento. “E isso seria com apenas um litro; vacas Holstein podem produzir 50 litros por dia”, exemplifica Wheeler.