Desde 2023, a fabricante de produtos de limpeza Ypê, em Amparo (SP), utiliza quatro caminhões sem motorista para transportar mercadorias entre setores da fábrica. Esses veículos são guiados por um sistema de navegação autônoma desenvolvido pela startup capixaba Lume Robotics, que integra sensores, câmeras e inteligência artificial para detectar o ambiente e comandar os movimentos do caminhão.
Primeiros passos da direção autônoma
A Mercedes-Benz, fornecedora dos caminhões, afirma que o processo de implementação exige estudos detalhados sobre a operação de cada cliente. Em ambientes industriais e controlados, a empresa avalia que os benefícios da tecnologia incluem mais segurança, redução de custos e eficiência operacional.
Expansão silenciosa em portos e centros de pesquisa
Além da Ypê, outras empresas também adotaram veículos autônomos em caráter experimental. A PortCel, no Espírito Santo, e a Suzano, no Maranhão, utilizam caminhões sem motorista para transporte de celulose em áreas portuárias. No Rio de Janeiro, a Petrobras testa um veículo autônomo em seu centro de pesquisa.
Já a siderúrgica ArcelorMittal Tubarão, na Grande Vitória, recebeu em 2023 um micro-ônibus autônomo de 21 lugares, fabricado pela Marcopolo e equipado pela Lume Robotics. O veículo é capaz de circular por ambientes internos, evitando obstáculos e chegando a destinos programados.
Redução de custos e acidentes
De acordo com o diretor da Lume, Rânik Guidolini, a navegação autônoma pode reduzir em até 17% o consumo de combustível, 75% os custos com mão de obra e 94% os acidentes. A startup conta hoje com 55 colaboradores, sendo 35 deles dedicados à pesquisa e desenvolvimento.
A experiência da Lume começou na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), com o projeto do carro autônomo Iara, que em 2017 percorreu 74 km em vias públicas. Guidolini também participou do primeiro teste de um jato autônomo no Brasil, em parceria com a Embraer, ainda antes de fundar a empresa.
Como funcionam os veículos autônomos
Os veículos utilizam dois sistemas principais: o de percepção, composto por sensores, câmeras, radares e GPS, e o de tomada de decisão, que planeja a rota, evita obstáculos e previne acidentes com base em algoritmos de inteligência artificial.
O grau de automação desses veículos é classificado entre os níveis 0 e 5, sendo o nível 5 o totalmente autônomo. Os caminhões e ônibus em operação no Brasil se enquadram nos níveis 3 e 4, que ainda preveem uso restrito e velocidade limitada.
Apoio financeiro e metas futuras
Para avançar ao próximo estágio, a Lume conseguiu um financiamento de R$ 2,5 milhões da Finep para construir um protótipo sem cabine, previsto para 2027, com testes a partir de 2028. O objetivo é alcançar o nível 4 pleno de automação.
Segundo o professor Fernando Osório, da USP São Carlos, quem dominar esse nível primeiro pode liderar o mercado nacional. Ele lembra que países como China e EUA já testam robotáxis e veículos sem condutor, mas ainda sem atingir o nível máximo de automação.
Desafios legais e técnicos no Brasil
Apesar dos avanços, a circulação de veículos autônomos nas ruas brasileiras enfrenta entraves, como a falta de legislação específica, alto custo dos componentes importados e infraestrutura urbana deficitária. Um semáforo com luz vermelha e verde acesas ao mesmo tempo, por exemplo, pode confundir o sistema, como relatou o engenheiro Edvaldo Fonseca, da USP.
O futuro está nas operações restritas
Para o engenheiro Marco Henrique Terra, da USP São Carlos, a falta de capital é o principal obstáculo ao avanço da tecnologia no país. Ele lidera o projeto Carina, o primeiro carro autorizado a circular sem motorista no Brasil, em 2013. Hoje, a pesquisa segue com apoio do programa federal Mover, focando em soluções nacionais para baratear a tecnologia.
Com projetos voltados à mineração e ao transporte interno, a expectativa dos especialistas é que os veículos autônomos ganhem espaço gradualmente em ambientes fechados, até que estejam aptos a operar nas ruas.
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