Na COP29, nova disputa por financiamento climático deve dominar as negociações

Autor: Redação Revista Amazônia

 

O Novo Objetivo Coletivo Quantificado (NCQG) para o financiamento climático pode parecer um tema distante, mas suas consequências são práticas e diretas para o futuro do planeta. O foco desse debate é revisar o compromisso assumido pelas economias desenvolvidas de fornecer US$ 100 bilhões anuais para apoiar os países em desenvolvimento na luta contra a crise climática. Esse valor expira em 2025 e é insuficiente, já que a demanda real varia entre US$ 1,1 trilhão e US$ 5,9 trilhões anuais até 2030.

Indefinição no financiamento climático

Entretanto, a questão vai além dos números. A falta de cumprimento das promessas anteriores e a indefinição sobre o que realmente conta como financiamento climático geraram desconfiança entre as nações. Desde 2022, as discussões para formular o NCQG têm sido intensas, com a expectativa de que o processo seja concluído na COP29, marcada para novembro, em Baku, Azerbaijão. Várias reuniões técnicas e três encontros do grupo de trabalho ad hoc (AHWP) ao longo de 2024 visam elaborar o texto final de negociação.

As conversas até agora têm avançado pouco. A rodada de negociações em Bonn, em junho, trouxe poucos resultados. Já em julho, em Baku, houve tentativa de destravar o processo. A expectativa é que eventos como a Assembleia Geral da ONU em setembro e a cúpula do G20, junto à terceira reunião do AHWP, ajudem a construir consensos.

O impasse sobre os valores

Um dos principais obstáculos é definir o novo valor, o “quantum”. Os países em desenvolvimento buscam um objetivo que reflita as reais necessidades de adaptação e mitigação, enquanto algumas economias ricas defendem metas mais modestas. Uma das propostas sugere uma meta inicial de US$ 500 bilhões anuais até 2030, com um aumento gradual, permitindo aos países contribuintes se adaptarem e explorarem novas fontes de financiamento, como impostos e taxas. Outra ideia é estabelecer uma meta cumulativa para o período de 2026 a 2030, com ajustes anuais, desde que o total ao final do período esteja dentro do estipulado.

Outros argumentam que os países ricos não devem ser poupados de suas responsabilidades, especialmente considerando que o Brasil já alocou cerca de US$ 13 bilhões para a reconstrução do Rio Grande do Sul, após recentes desastres naturais.

Para o período pós-2030, há um consenso emergente de que o valor anual de financiamento deve partir de US$ 1 trilhão, refletindo as crescentes demandas dos países em desenvolvimento.

O desafio do cronograma

Outro ponto de tensão é o calendário de implementação. Algumas nações sugerem alinhar o NCQG aos ciclos das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), enquanto outros defendem uma ligação com as metas de neutralidade de carbono até 2050. A definição do prazo é crucial, pois as necessidades financeiras mudam conforme o cronograma. Um prazo mais curto pode garantir metas mais concretas, enquanto um mais longo oferece estabilidade, mas pode ser prejudicado por mudanças políticas e de prioridades.

Quem paga a conta?

A discussão sobre quem arcará com os custos continua sendo um tema central. A liderança das nações desenvolvidas no financiamento climático foi acordada na Convenção-Quadro da ONU e no Acordo de Paris, mas há pressão para que grandes economias do G20 e outros países ricos, como Israel e Singapura, também contribuam.

O documento recente dos co-presidentes do AHWP, de 29 de agosto, aponta para sete pacotes de propostas sobre o financiamento climático pós-2025. Há consenso de que os recursos precisam ser substanciais, na casa dos trilhões de dólares até 2035, e alinhados com as metas do Acordo de Paris, especialmente a limitação do aquecimento global a 1,5°C.

Concessões e dívidas

Há divergências sobre como o financiamento deve ser oferecido. Alguns pacotes priorizam financiamento concessionário, enquanto outros aceitam empréstimos e modelos híbridos, o que levanta preocupações sobre o aumento da dívida de países em desenvolvimento. A base de países contribuintes também é debatida, com propostas para que os maiores emissores assumam mais responsabilidades financeiras.

Uma estrutura flexível

O NCQG precisa ser suficientemente flexível para acomodar diferentes realidades econômicas, mas firme o bastante para garantir o cumprimento dos compromissos. Esse equilíbrio será crucial para o sucesso das metas climáticas nacionais, as NDCs. Sem o financiamento adequado, os países em desenvolvimento não conseguirão implementar suas políticas de mitigação.

Para o Brasil, seria vantajoso que houvesse incentivos para recompensar os países mais ambiciosos em suas políticas climáticas, como já ocorreu com o Fundo Amazônia e a redução do desmatamento. No entanto, o NCQG, no momento, está mais focado em atender às obrigações financeiras dos países mais pobres, sem premiar diretamente os países que demonstram maior ambição.

A inclusão de novos atores e instrumentos financeiros pode ser um avanço, mas o NCQG ainda não representa uma transformação radical no financiamento climático global. A decisão final sobre seus parâmetros será determinante para o futuro do financiamento climático e, em última instância, para o sucesso do Acordo de Paris.


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