Quando Sir Paul McCartney decide falar, costuma escolher bem seus motivos. E desta vez, o alerta veio carregado de indignação. Em entrevista rara concedida ao programa BBC Radio 1 Newsbeat, o ex-Beatle criticou severamente a postura do então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em relação às mudanças climáticas. Para McCartney, a resistência de Trump ao consenso científico é mais do que irresponsável: é pura loucura.

O músico se referia especialmente à decisão anunciada em 2017 pelo governo norte-americano de abandonar o Acordo de Paris, tratado global firmado por quase todas as nações com o compromisso de reduzir emissões de gases de efeito estufa. A justificativa apresentada pela Casa Branca, sob a liderança de Trump, foi a de que o pacto prejudicaria a competitividade da economia americana. Mais tarde, declarações desencontradas de autoridades do próprio governo alimentaram incertezas sobre a permanência ou não dos Estados Unidos no acordo. Mas, para McCartney, o estrago simbólico já estava feito.
O músico lembrou que Trump chegou a afirmar, anos antes, que o aquecimento global era uma invenção da China para enfraquecer a indústria norte-americana — uma teoria que ganhou ampla repercussão apesar de carecer completamente de base científica. A postura, segundo ele, não só desacredita décadas de pesquisas, como também desfaz avanços importantes conquistados por governos anteriores e pela comunidade internacional.
A entrevista surgiu no contexto do lançamento de One Day a Week, curta-metragem produzido pela família McCartney para chamar atenção ao impacto ambiental da pecuária industrial. A iniciativa integra sua campanha de longa data pelo vegetarianismo, que começou motivada por preocupações com o bem-estar animal e, ao longo dos anos, incorporou cada vez mais argumentos ambientais.
McCartney argumenta que reduzir o consumo de carne, ainda que apenas um dia por semana, ajuda a diminuir emissões vinculadas à agropecuária, setor que responde por parcela significativa dos gases associados ao aquecimento global. Ele admite que a mudança alimentar não resolverá sozinha a crise climática, mas insiste que é uma parte essencial do esforço coletivo — sobretudo em um momento em que líderes políticos questionam abertamente a existência do problema.

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O artista reconhece que existe resistência a qualquer transformação de hábitos, principalmente quando vozes influentes colocam em dúvida a urgência ambiental. Para ele, Trump simboliza essa barreira cultural. Mesmo assim, McCartney vê no atual cenário um motivo para insistir no diálogo com o público. Diante de discursos negacionistas, diz ele, o caminho é reforçar o papel individual de cada pessoa e lembrar que a sociedade não precisa esperar por governos céticos para agir.
Estudos científicos reforçam sua preocupação. Pesquisas recentes mostram que, para impedir que a temperatura média global ultrapasse 2°C neste século — limite associado a consequências severas e irreversíveis — será necessário reduzir drasticamente as emissões provenientes da agricultura. A pecuária intensiva, em especial, figura entre os principais vetores de metano, gás com potencial de aquecimento muito superior ao dióxido de carbono no curto prazo.
Apesar disso, a posição oficial do governo norte-americano à época soava ambígua. Após a divulgação de mais um relatório climático elaborado por pesquisadores federais, a Casa Branca afirmou apoiar pesquisas rigorosas e debates científicos, mas relativizou os achados alegando que “o clima está sempre mudando” — frase que McCartney e ambientalistas consideram insuficiente e evasiva diante de evidências robustas.
Para McCartney, a insistência em minimizar dados científicos coloca em risco a habilidade global de reagir em tempo hábil. Ele sustenta que a cultura pop, a ciência e a política precisam trabalhar juntas para evitar que desinformação e interesses econômicos atrasem ações urgentes. Sua proposta — trocar alguns pratos de carne por refeições à base de vegetais — parece simples, mas nasce da convicção de que pequenas mudanças, multiplicadas por milhões de pessoas, podem gerar impactos reais.
Ao final da entrevista, McCartney reforçou que a luta ambiental não é movida por ressentimento político, mas pela percepção de que o planeta vive um momento decisivo. Se alguns líderes insistem em negar a gravidade das mudanças climáticas, ele pretende seguir mostrando ao público que cada gesto conta. Para ele, não é o momento de esperar por consensos vindos de cima, mas de agir apesar deles.













































