A Conferência do Clima deBelém, aCOP30, inscreveu-se na história diplomática não apenas como mais um encontro anual, mas como o marco zero de uma nova era: a fase da implementação. Superado o longo e complexo ciclo de regulamentação do Acordo de Paris, a cúpula naAmazôniabrasileira tinha a missão de tirar os compromissos do papel e transformá-los em realidade palpável. A análise trazida pelo Instituto LACLIMA em seu tradicional balanço revela que, se o evento não resolveu todas as equações climáticas globais, ele foi decisivo ao erguer o andaime político necessário para os próximos anos.

Sob a liderança da Presidência brasileira, a conferência inovou ao criar avenidas diplomáticas para temas que, até então, eram sistematicamente contornados nas mesas de negociação. Questões nevrálgicas, como o desenho de roteiros globais para o enfrentamento do desmatamento e a transição para longe dos combustíveis fósseis, ganharam um espaço de debate inédito. Embora a resistência política tenha impedido que esses roteiros fossem integrados às decisões formais finais, a Presidência brasileira garantiu que eles não morressem na praia: serão desenvolvidos como iniciativas políticas cruciais ao longo do próximo ano, mantendo viva a chama da meta de 1,5°C.
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No campo das conquistas tangíveis,Belémcelebrou a aprovação dos aguardados Indicadores de Belém para a Meta Global de Adaptação, preenchendo uma lacuna histórica desde a criação do GGA e oferecendo métricas para um dos pilares mais urgentes da ação climática. Avanços na agenda de transição justa também foram registrados, sinalizando uma compreensão mais madura sobre os impactos sociais das mudanças necessárias.

O coração político da conferência, no entanto, pulsou na construção da chamada “Decisão Mutirão”. O processo foi um teste de fogo para a diplomacia. O início das tratativas foi marcado por uma polarização intensa. De um lado, blocos como a União Europeia e os pequenos estados insulares pressionavam por um plano de resposta robusto à lacuna de ambição das NDCs para manter o 1,5°C viável. Do outro, países em desenvolvimento insistiam que o verdadeiro gargalo não era a falta de metas, mas a ausência de financiamento previsível e a ameaça de medidas comerciais unilaterais disfarçadas de protecionismo verde.
A segunda semana de negociações exigiu um esforço intensivo de bastidores, com a Presidência utilizando uma diplomacia itinerante para costurar consensos mínimos. O resultado foi uma arquitetura complexa baseada em três pilares principais. O primeiro instituiu o Acelerador Global de Implementação, um mecanismo cooperativo para dar tração às NDCs e planos nacionais. O segundo criou a “Missão Belém para 1,5°C”, um guarda-chuva político destinado a organizar a ambição e os investimentos até a década crítica de 2035.
O terceiro pilar enfrentou as tensões geoeconômicas. A decisão reafirmou o compromisso com um sistema multilateral de comércio aberto, tentando blindar a pauta climática de guerras comerciais, e mandatou um ciclo de diálogos formais envolvendo a Organização Mundial do Comércio (OMC), a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) e o International Trade Centre (ITC). No front financeiro, a solução possível foi a criação de um programa de trabalho de dois anos para discutir o financiamento climático, uma resposta parcial às demandas por maior estruturação e qualidade nos repasses de recursos.

Ao final, a COP 30 de Belém consolidou-se como um ponto de inflexão. Não entregou todas as respostas sobre os volumes financeiros necessários nem resolveu o destino imediato dos fósseis no texto oficial, mas estruturou os debates decisivos para o futuro e firmou o compromisso político com a aceleração da implementação. Como ressaltou o Presidente da COP30 após a adoção do texto, o Brasil continuará liderando, à margem das decisões formais, os roteiros cruciais sobre desmatamento e energia, garantindo que o espírito do “Mutirão” continue a mobilizar a humanidade.







































