A conectividade como linguagem comum da Amazônia na COP30
A Amazônia chegou à COP30 não como um território fragmentado por fronteiras nacionais, mas como um sistema vivo que depende da continuidade de seus rios, florestas, culturas e relações sociais. Nesse contexto, a conectividade emergiu como uma ideia-força capaz de unir ciência, políticas públicas e saberes tradicionais. Foi nesse terreno que a Aliança Águas Amazônicas se posicionou, levando à conferência a mensagem de que não há futuro climático para a região sem a preservação da conectividade aquática.

Durante a primeira semana da COP30, a Aliança participou de espaços estratégicos de intercâmbio e articulação ao lado de governos, redes da sociedade civil, academia, organizações territoriais e atores da cooperação internacional. A proposta central foi ampliar o olhar sobre conectividade, frequentemente associada apenas a infraestrutura ou corredores terrestres, para incluir rios, lagos, várzeas e ciclos hidrológicos como elementos estruturantes da vida amazônica.
Segundo Dino Delgado, a principal contribuição da Aliança foi tornar visível por que a conectividade aquática precisa estar no centro da agenda amazônica. Mais do que um tema setorial, ela orienta decisões informadas sobre biodiversidade, segurança alimentar, adaptação climática e justiça territorial em escala regional.
Do território à ciência: diálogos que ampliam a agenda regional
A jornada da Aliança Águas Amazônicas na COP30 teve início no Pavilhão da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), em parceria com o Banco de Desenvolvimento da América Latina e do Caribe (CAF). Em um dos espaços mais movimentados do evento, a Aliança apresentou a perspectiva da sociedade civil sobre a necessidade de reconhecer os ecossistemas aquáticos como eixos da conectividade amazônica.
O painel reuniu experiências do Brasil e do Peru, além de contribuições do Banco Mundial e do Instituto de Pesquisa para o Desenvolvimento (IRD), reforçando uma visão integrada que conecta território, água, biodiversidade e modos de vida. Essa abordagem rompe com leituras fragmentadas da Amazônia e propõe pensar a bacia como um sistema interdependente, no qual decisões tomadas em um ponto reverberam em toda a região.
A diretora do Instituto de Pesquisas da Amazônia Peruana, Carmen Rosa García, destacou a relevância da atuação da Aliança no fortalecimento da pesca comercial de água doce. Em sua avaliação, a conservação dos sistemas aquáticos é indissociável da segurança alimentar e do bem-estar das populações amazônicas, especialmente diante das pressões das mudanças climáticas.
Esses diálogos evidenciaram que a conectividade não é apenas um conceito técnico, mas uma ponte entre ciência, políticas públicas e práticas comunitárias, capaz de sustentar estratégias de longo prazo para a região.

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Rios, pesca e futuro: a centralidade da conectividade aquática
Um dos momentos centrais da participação da Aliança foi o painel Conectividade multidimensional e sua importância para a Amazônia, organizado em parceria com a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), a Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG) e o Painel Científico para a Amazônia (SPA). Na ocasião, foi apresentado o Toolkit de Conectividade Amazônica, uma ferramenta que reúne mapas, análises, narrativas e recomendações para apoiar políticas públicas e decisões regionais.
O pesquisador Ayan Fleischmann, do Instituto Mamirauá, destacou que a conectividade aquática sustenta ciclos biológicos fundamentais, rotas migratórias de peixes e economias locais profundamente ligadas aos rios. Para ele, comprometer essa conectividade significa comprometer o futuro da pesca amazônica e, com ela, a base alimentar e cultural de milhares de comunidades.
A mensagem foi reforçada em outro espaço, no Pavilhão de Ciência Planetária, onde Fleischmann voltou a enfatizar que os rios amazônicos funcionam como artérias vitais da região. Sua fragmentação, seja por barragens, degradação ou gestão inadequada, enfraquece a resiliência da Amazônia diante das mudanças climáticas.
A discussão avançou ainda para instrumentos econômicos e de governança. A Operação Amazônia Nativa (OPAN) conduziu um debate sobre Pagamentos por Serviços Ambientais, ressaltando seu potencial para reconhecer iniciativas produtivas que conservam ecossistemas aquáticos, fortalecem a biodiversidade e ampliam a governança socioambiental. O protagonismo das comunidades locais e o valor de seus saberes tradicionais apareceram como elementos-chave para soluções climáticas duradouras.
Contribuições técnicas e incidência política para além da COP
Além da presença em painéis e debates públicos, a Aliança Águas Amazônicas atuou de forma estratégica nos bastidores da COP30, aportando contribuições técnicas a documentos e propostas de alcance regional. Entre elas está a participação na promoção do Pacto Climático Pan-Amazônico, por meio da articulação da Rede de Redes, que busca alinhar compromissos climáticos à realidade dos territórios amazônicos.
A Aliança também contribuiu diretamente para o aprimoramento do Toolkit de Conectividade Amazônica, com foco na conectividade aquática como elemento essencial para mitigação, adaptação e fortalecimento da resiliência climática. Essa abordagem reforça a ideia de que políticas públicas eficazes precisam considerar a bacia amazônica como um sistema integrado.
Outro destaque foi a participação na elaboração da nota técnica A água e seus ecossistemas aquáticos: a base da integridade ecológica da Amazônia, promovida pela Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (COICA) e desenvolvida em parceria com a Universidad San Francisco de Quito (USFQ), a The Nature Conservancy (TNC) e a Wildlife Conservation Society (WCS).
Ao integrar ciência, incidência política e protagonismo territorial, a atuação da Aliança na COP30 reforçou uma visão compartilhada: proteger a conectividade aquática é proteger a própria Amazônia. Em um cenário de intensificação das mudanças climáticas, essa compreensão deixa de ser apenas desejável e passa a ser indispensável para garantir respostas mais eficazes, justas e duradouras para a região.


















































