COP30 recoloca a Amazônia no centro do debate climático global


Belém se transforma no epicentro das negociações internacionais sobre o clima com o início da 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC). Até o dia 21 de novembro, delegações de 194 países e da União Europeia se reúnem para enfrentar um triplo desafio: garantir financiamento efetivo, acelerar a transição energética e ampliar a adaptação a eventos climáticos extremos.

Tânia Rêgo/Agência Brasil

É a primeira vez que uma COP acontece na Amazônia, o bioma com maior biodiversidade do planeta e regulador essencial do clima global. Mais de 50 mil pessoas, entre negociadores, cientistas, representantes de governos, instituições e movimentos sociais, devem circular pela capital paraense, transformando Belém no principal palco de uma discussão que ultrapassa fronteiras.

A COP da verdade

Ao abrir a conferência, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi direto: “A COP30 é a COP da verdade”. Lula tem insistido que sem um plano de financiamento sólido, metas de transição energética e abandono gradual dos combustíveis fósseis, o Acordo de Paris corre o risco de se tornar letra morta.

Nos últimos dias, o evento ganhou força com a realização da Cúpula do Clima, que reuniu cerca de 70 chefes de Estado e de governo. O presidente brasileiro buscou um consenso em torno de ações práticas para conter o aumento da temperatura global a 1,5°C — limite considerado crítico pelos cientistas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

“Lula trouxe para a mesa a questão essencial: o fim dos combustíveis fósseis”, avalia Márcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima, rede que reúne mais de 130 organizações da sociedade civil. “Ele quer ver sair de Belém um roteiro concreto de como se dará essa transição — quem começa primeiro, qual o prazo e o volume de recursos envolvidos.”

Segundo a plataforma Climate Watch, petróleo, gás e carvão ainda respondem por 75% das emissões globais de gases de efeito estufa. Outros 11,7% vêm da agricultura e 2,7% do desmatamento e da mudança do uso da terra.

Entre promessas e incertezas

O contexto internacional é desafiador. Conflitos armados, retrocessos políticos e o aumento recente das emissões de CO₂ colocam em risco os compromissos climáticos firmados há uma década no Acordo de Paris. Menos de 80 países atualizaram suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), metas que indicam quanto cada nação se compromete a reduzir emissões.

Na carta final antes da conferência, o presidente-designado da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, apelou para que Belém se torne “um ciclo de ação” e não apenas de promessas. A tarefa não é simples: todos os acordos precisam ser aprovados por consenso entre as 198 partes da Convenção do Clima — um processo longo e minucioso.

pzzb5896-400x267 COP30 recoloca a Amazônia no centro do debate climático global
Foto Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

SAIBA MAIS: COP30 e o vocabulário do clima: o que está em jogo nas negociações globais

Financiamento, transição e adaptação

Três grandes eixos devem dominar as negociações: adaptação climática, transição justa e financiamento. O primeiro busca definir indicadores para medir o progresso dos países na preparação diante de desastres ambientais. O segundo discute políticas que garantam que trabalhadores e comunidades afetadas pela descarbonização não fiquem para trás.

Mas é o financiamento que se mostra o maior obstáculo. Países ricos prometeram mobilizar US$ 100 bilhões anuais para apoiar nações em desenvolvimento — promessa que ainda não se concretizou. Para tentar reverter esse quadro, a presidência conjunta da COP29 e COP30 apresentou o “Mapa do Caminho de Baku a Belém”, que prevê mobilizar US$ 1,3 trilhão por ano em investimentos climáticos.

No caso do Brasil, um dos instrumentos anunciados é o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (Tropical Forests Forever Fund), lançado durante a Cúpula do Clima. Com aportes prometidos de US$ 5,5 bilhões, o fundo destinará 20% dos recursos a comunidades tradicionais e povos indígenas, fortalecendo a proteção das florestas tropicais em cerca de 70 países.

A força da sociedade civil

Muito além da diplomacia, Belém vive um momento histórico de mobilização social. A chamada Zona Verde — espaço público da COP, instalada no Parque da Cidade — recebe instituições, coletivos, comunidades e startups que apresentam soluções para a crise climática.

A participação indígena promete ser a maior da história das conferências do clima, com mais de 3 mil representantes. No Pavilhão do Círculo dos Povos, diferentes vozes dialogam sobre justiça climática e proteção dos biomas. Paralelamente, a Cúpula dos Povos — organizada pela sociedade civil — realiza uma série de atividades na Universidade Federal do Pará (UFPA), incluindo uma barqueata pelo Rio Guamá e uma grande marcha prevista para o dia 15.

“Clima não é um tema distante; ele afeta o preço do alimento, a conta de luz e o cotidiano das pessoas”, lembra Astrini. Para o coordenador da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Dinamam Tuxá, a COP30 deve ser lembrada como o momento em que os acordos começaram, de fato, a ser cumpridos. “Precisamos estar na mesa de negociação de igual para igual”, afirma.

Belém, mais do que sede, tornou-se símbolo. Se o mundo espera um novo ciclo de ação climática, é na Amazônia que ele precisa começar.