A Amazônia Legal abriga uma rica tapeçaria de sítios arqueológicos, mas 71% desses tesouros históricos estão agora sob áreas desmatadas, de acordo com o Prodes. O desmatamento, que envolve a remoção completa da cobertura florestal primária, é particularmente prevalente no Acre, onde 97% dos sítios arqueológicos estão em áreas desmatadas. Mato Grosso (79%), Rondônia (76%) e Maranhão (73%) também têm altas taxas de desmatamento, enquanto Pará (66%), Roraima (36%) e Tocantins (40%) têm as menores taxas.
Arqueologia, Sistematização e Fiscalização
O desmatamento e a ocupação urbana na Amazônia estão intrinsecamente ligados à descoberta de sítios arqueológicos. No entanto, a questão do desmatamento na Amazônia é complexa e multifacetada, exigindo uma compreensão do patrimônio arqueológico da região. O Centro Nacional de Arqueologia (CNA) e o IPHAN enfrentam desafios na sistematização dos dados arqueológicos existentes devido à falta de recursos humanos e financeiros, acesso difícil aos locais e políticas públicas insuficientes.
Além da base oficial do SICG, que fornece as coordenadas dos sítios, existe outra base, a do Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos (CNSA), que inclui mais 2.114 sítios, mas sem os dados de localização de cada um deles. Mesmo entre os dados da base do SICG, que apresenta os pontos de localização dos mais de 6 mil sítios, apenas 1090 sítios (ou 17%) possuem dados geoespaciais com área delimitada (camadas de polígonos). Essas informações mais detalhadas e precisas seriam fundamentais para melhor entendimento do impacto e avanço da ocupação e exploração sobre estas áreas.
Nós, os Guardiões
A região de Gurupá, no Pará, tem o maior número de sítios arqueológicos em terras quilombolas na Amazônia Legal, de acordo com os dados do IPHAN. Dos 27 sítios identificados nesses territórios, 12 estão localizados em Gurupá, com 7 deles fora de áreas desmatadas.
Agenor Pombo, presidente da Cooperativa Agroextrativista dos Remanescentes de Quilombos dos Defensores da Floresta de Gurupá, explica que o território quilombola possui 83 mil hectares, e muitos sítios arqueológicos que ainda não foram estudados.
Desde 2014, a região tem vivenciado uma relação de proximidade e preservação do legado ancestral, graças a uma parceria com pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi. Isso inspirou a criação do coletivo “Nós, os Guardiões”, para dar continuidade à conscientização local sobre o patrimônio arqueológico.
Terra, Água e Floresta
A Amazônia é muitas vezes subestimada em seu valor arqueológico devido à falta de artefatos arqueológicos grandiosos. No entanto, a realidade é que os sítios arqueológicos na região estão por toda parte: sob os pés das comunidades tradicionais, marcados pela descoberta da famosa “terra preta”, mas também verticalizados sobre a floresta, como nas grandes e antigas copas de árvores.
Carlos Augusto da Silva, pesquisador colaborador da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), explica que grande parte da floresta densa que vemos hoje é, na verdade, fruto de um inteligente manejo da natureza feito por populações antigas. Para ele, o patrimônio arqueológico na região não se limita ao que está enterrado, e ele também pode ser visto na vertical.
Desde 25 de setembro do ano passado, a reportagem tenta contato com o IPHAN, solicitando entrevista com a direção do Centro Nacional de Arqueologia (CNA), em busca de mais esclarecimentos sobre a política de preservação desses sítios arqueológicos e investimentos na área. Durante este tempo, foram trocados 15 e-mails, mas até o fechamento desta reportagem, a demanda não foi atendida. Como justificativa, a assessoria de imprensa do órgão alegou: “o volume de trabalho e compromissos dos técnicos especializados na área”.