14 de abril, Dia Mundial de Combate à Doença de Chagas

Autor: Redação Revista Amazônia

A Doença de Chagas, causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi, é tradicionalmente associada a complicações cardíacas e digestivas. No entanto, estudos recentes revelam que seus impactos vão além, afetando também o sistema nervoso central e contribuindo para processos neurodegenerativos.

Neste Dia Mundial de Combate à Doença de Chagas, é fundamental ampliar a compreensão sobre a doença, destacando suas implicações neurológicas e a importância da integração entre genética, neurociência e parasitologia.

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Imagem: Josué Damacena/IOC/Fiocruz

Evandro Chagas: O Cientista que Desbravou a Amazônia

Evandro Serafim Lobo Chagas (1905–1940), filho do renomado cientista Carlos Chagas, foi um médico e pesquisador brasileiro que desempenhou papel crucial no estudo das doenças tropicais. Formado pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 1926, Evandro especializou-se em microbiologia no Instituto Oswaldo Cruz. Em 1930, assumiu a docência de Clínica de Doenças Tropicais e Infecciosas na mesma faculdade, defendendo uma tese pioneira sobre a forma cardíaca da tripanossomíase americana.

Ele foi um dos primeiros médicos a utilizar eletrocardiografia no Brasil, ferramenta fundamental para entender as alterações cardíacas provocadas pelo T. cruzi. Em 1936, fundou o Instituto de Patologia Experimental do Norte, em Belém do Pará, voltado ao estudo das doenças amazônicas. O instituto, hoje chamado Instituto Evandro Chagas, é referência em pesquisas sobre arboviroses, malária, leishmaniose e outras endemias da região.

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Instituto Evandro Chagas em Belém do Pará

Evandro morreu tragicamente aos 35 anos em um acidente aéreo, mas seu legado científico permanece vivo, especialmente na Amazônia, onde seu nome se tornou símbolo da luta contra doenças negligenciadas.

Doença de Chagas: Uma Perspectiva Neurodegenerativa

1. A Doença Além do Coração e do Intestino

Embora amplamente conhecida por seus efeitos cardíacos e gastrointestinais, a Doença de Chagas também impacta o sistema nervoso central (SNC). Pesquisas demonstram que o T. cruzi é capaz de atravessar a barreira hematoencefálica e se instalar em regiões cerebrais como o hipocampo, hipotálamo e núcleos da base. Isso pode provocar sintomas como déficits cognitivos leves, alterações do humor e comprometimentos autonômicos.

No portal científico da Fiocruz, um estudo do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Neuroimunomodulação destaca a conexão entre a doença e processos neuroinflamatórios crônicos, que permanecem ativos mesmo após o fim da fase aguda da infecção.

2. Genética e Suscetibilidade Neurológica

A forma como o corpo responde à infecção está relacionada a predisposições genéticas. Polimorfismos em genes como TNF-α, IL-10, IFN-γ e TLR2 podem influenciar a intensidade da inflamação sistêmica e a eficiência com que o parasita é combatido. Esses mesmos genes regulam a integridade da barreira hematoencefálica, podendo favorecer a entrada do T. cruzi no SNC.

Estudos apontam ainda que variantes em MTHFR, COMT, APOE e SLC6A4, genes também associados a distúrbios como depressão, esquizofrenia e demência precoce, modulam a resposta cerebral à infecção. Isso cria um modelo de “dupla vulnerabilidade”, no qual infecção e predisposição genética interagem para antecipar sintomas neurológicos, mesmo antes dos sinais clássicos cardíacos.

3. Neuroinflamação e Degeneração Silenciosa

Uma vez no cérebro, o T. cruzi ativa a microglia e promove liberação de citocinas inflamatórias como IL-6 e TNF-α, responsáveis por danos neuronais progressivos. Essa inflamação crônica pode alterar a expressão de genes relacionados à plasticidade sináptica, como BDNF e CREB, essenciais para memória e aprendizado.

Além disso, há evidências de que o parasita afeta a sinalização dopaminérgica e serotoninérgica, comprometendo funções como humor, motivação e regulação autonômica, o que explica a associação da fase crônica da doença com ansiedade e disfunções vegetativas.

4. A Importância da Reabilitação Neurocognitiva

A reversibilidade dos efeitos neurológicos depende da plasticidade do cérebro. Intervenções que combinam estimulação cognitiva, modulação da microbiota intestinal e suplementação com nutrientes neuroativos (como B12, colina e riboflavina) têm mostrado efeito positivo na reorganização sináptica. Segundo o neurocientista Dr. Fabiano de Abreu, essas abordagens podem reduzir a expressão de genes pró-inflamatórios e restaurar a conectividade de redes neurais como a default mode network (DMN), fundamental para a memória autobiográfica e planejamento.

5. Um Chamado à Medicina Translacional

A data de hoje deve marcar uma virada conceitual: a Doença de Chagas não é apenas uma cardiopatia negligenciada, mas também uma condição que pode remodelar a arquitetura neurofuncional do paciente. O paradigma parasitológico precisa incorporar o conhecimento da genética e neurociência, adotando uma abordagem integrativa, personalizada e preventiva.

A inclusão da Doença de Chagas em protocolos de saúde pública voltados à saúde mental e cognitiva é urgente. Mais do que combater o vetor, é preciso compreender o impacto silencioso, porém devastador, que a infecção pode causar ao longo de décadas.


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