Quando se pensa na Usina Hidrelétrica de Itaipu Binacional, a imagem que vem à mente é a de uma monumental muralha de concreto e aço, uma das maiores obras de engenharia do mundo, domando as águas do Rio Paraná para gerar energia limpa. O que poucos sabem é que a verdadeira chave para a longevidade e eficiência dessa gigante não está apenas em suas turbinas, mas em um coração vivo e pulsante que a rodeia: uma floresta de 30 mil hectares que, ao longo de 40 anos, se tornou um dos mais bem-sucedidos casos de regeneração ambiental do país.

Um inventário florestal inédito, divulgado recentemente pela usina em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), revelou a dimensão dessa transformação. Onde antes havia apenas 139 espécies de árvores plantadas para proteger as margens do reservatório, hoje prosperam 397 espécies. A diversidade praticamente triplicou. O que começou como um cinturão protetor se converteu em uma floresta madura e complexa, com 1.300 quilômetros de extensão, abrigando desde majestosos ipês e jequitibás até uma infinidade de árvores frutíferas que alimentam a fauna local.
Essa floresta não é um mero projeto paisagístico; ela é uma infraestrutura estratégica, um escudo biológico que garante a matéria-prima essencial para a usina: a água. Como explica Enio Verri, diretor-geral brasileiro de Itaipu, a conservação é um investimento direto na perenidade do negócio. “Ações como essas […] garantem a disponibilidade de nossa matéria-prima, a água, para que continuemos gerando energia por mais de 190 anos adiante”, afirma.

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A lógica é pragmática e cientificamente comprovada. A vegetação densa funciona como uma barreira natural, filtrando a água e impedindo que sedimentos e detritos cheguem ao lago. Mais importante ainda, suas raízes estabilizam o solo das margens, combatendo a erosão. A erosão é o inimigo silencioso das hidrelétricas, pois o acúmulo de sedimentos no fundo do reservatório (assoreamento) diminui sua capacidade de armazenamento e, consequentemente, sua vida útil. Ao investir no verde, Itaipu está, na prática, comprando décadas de operação futura.
Mas o papel dessa floresta vai muito além da proteção do reservatório. Ela se tornou uma artéria vital para a biodiversidade da Mata Atlântica. Estrategicamente posicionada, essa faixa de mata ciliar funciona como uma ponte verde, um corredor ecológico que conecta duas das mais importantes unidades de conservação do sul do Brasil: o famoso Parque Nacional do Iguaçu, ao sul, e o Parque Nacional de Ilha Grande, ao norte. Essa conexão permite o fluxo de animais e a troca genética entre populações de espécies, muitas delas ameaçadas, impedindo que fiquem isoladas e mais vulneráveis à extinção.
A parceria com a Embrapa Florestas, vinculada ao Ministério da Agricultura e Pecuária, marca uma nova fase para essa floresta. Após 40 anos dedicados ao plantio e à restauração de áreas que, em meados do século 20, eram dominadas pela agricultura, o foco agora muda da implantação para a gestão. “A gente não tem mais o que plantar. A gente precisa fazer a gestão e verificar se tem algo que a gente pode fazer […] para aproximá-la do que seria uma vegetação nativa”, explica Luis Cesar Rodrigues da Silva, técnico de Itaipu.
O objetivo é criar um plano de manejo para os próximos 40 anos, utilizando tecnologia de ponta, como drones e sensoriamento remoto, para estimar o carbono estocado nas árvores e analisar indicadores de saúde do ecossistema, como a atividade de minhocas e enzimas no solo. Trata-se de uma transição da restauração em larga escala para uma “jardinagem” de precisão, visando a perpetuidade dos serviços ecossistêmicos que a floresta oferece gratuitamente.
Esses serviços, como ressalta a pesquisadora Maria Augusta Doetzer Rosot, da Embrapa, beneficiam toda a sociedade. A floresta regula o microclima, purifica o ar, protege nascentes, abriga insetos polinizadores essenciais para a agricultura vizinha e confere beleza cênica à paisagem. Em um mundo que busca desesperadamente soluções para a crise climática, Itaipu demonstra na prática que a infraestrutura humana e a natureza não precisam ser inimigas. Ao contrário, podem formar uma aliança simbiótica onde uma fortalece a outra, garantindo que as luzes continuem acesas nas casas de milhões de brasileiros, alimentadas pela força das águas e protegidas pela resiliência da floresta.






































