A COP30, realizada em Belém, deixou marcas que vão além do texto diplomático que encerra formalmente cada conferência climática. Para Lindsay Levin, fundadora do movimento global TED Countdown e cocriadora da TED Countdown House, o que se viu na capital paraense foi uma inflexão política rara, marcada pelo encontro entre governos, sociedade civil e atores culturais que ampliaram a percepção pública sobre a crise climática. Ela avalia que o Brasil, na condição de anfitrião, soube conduzir tensões e criar espaços onde avanços, mesmo que graduais, se tornaram possíveis.

Em entrevista, Levin reforçou que uma COP nunca deve ser medida apenas por seu acordo final. Em sua visão, esses eventos têm um papel mais profundo: abrem janelas políticas, formam alianças improváveis e aproximam a urgência climática do cotidiano das pessoas. Essa perspectiva guia seu trabalho desde antes da agenda ambiental ganhar força pública. Em 2001, ela fundou o Leaders’ Quest, plataforma voltada a conectar líderes de múltiplos setores a realidades marcadas por desigualdade e degradação ambiental. Foi essa vivência que, segundo ela, dissolveu a distância entre clima e vida real.
Hoje radicada em Nova York, Levin enxerga com preocupação o movimento de retrocesso climático em países com grande influência global, como os Estados Unidos. Para ela, esse cenário reforça a necessidade de produzir narrativas que mantenham a crise ambiental no centro da discussão pública, mesmo quando governos vacilam. É essa a razão de existência do TED Countdown: combinar ciência, arte, comunicação e política para que a transição climática se torne culturalmente incontornável.
Belém, segundo ela, foi terreno fértil para essa missão. Pela primeira vez, o TED instalou uma casa oficial dentro de uma COP das Nações Unidas, criando um espaço alternativo, aberto e plural para debates de todos os tipos. Ali se encontraram chefes de Estado, negociadores, jovens ativistas, lideranças indígenas, artistas, filantropos e pesquisadores – todos dividindo o mesmo palco em um ambiente que contrastava com os corredores formais e insonoros das negociações oficiais.
A escolha da capital paraense não foi apenas estratégica, mas simbólica. Belém representa a interseção entre desenvolvimento, floresta, cultura e conflitos socioambientais. Segundo Levin, foi justamente essa convergência que transformou a cidade em cenário ideal para uma virada política: a sensação de que as decisões feitas ali não pertenciam apenas aos delegados internacionais, mas às comunidades que há décadas vivem as consequências mais duras das mudanças climáticas.

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Para ela, esse protagonismo amazônico reposicionou o sentido da conferência. O envolvimento de povos indígenas, que marcaram presença em peso na COP30, foi decisivo para que o encontro não se reduzisse a um debate técnico. As narrativas desses povos lembraram ao mundo que clima não é teoria: é território, ancestralidade e futuro coletivo. Levin insiste que não há políticas climáticas eficazes se as pessoas que enfrentam os impactos diários da crise não estiverem no centro das decisões.
Ao avaliar o papel da presidência brasileira da COP30, Levin aponta que o Brasil soube atuar com precisão em um tabuleiro geopolítico complexo. Em um cenário de tensões crescentes sobre combustíveis fósseis, o país conseguiu dissociar temas de alto atrito e, com isso, preservar a mesa de negociação. Essa estratégia permitiu avançar em áreas onde já havia convergência entre os países – movimento que, segundo ela, pode parecer modesto, mas é crucial dentro da arquitetura das COPs.
Embora o texto final não tenha alcançado a eliminação formal dos combustíveis fósseis – frustrando parte da comunidade climática –, Levin interpreta o resultado como o início de uma mudança. Para ela, a COP30 estabeleceu as bases para que um roteiro de redução dos fósseis seja debatido com mais força até o fim do mandato brasileiro, em 2026, antes da transição para a COP31, na Turquia.
A executiva reforça que nenhuma COP é perfeita. Trata-se de um processo político inevitavelmente limitado, sustentado por consenso de quase 200 países. Porém, Belém, para ela, moveu a engrenagem global na direção certa: ampliou a força coletiva e abriu espaço para conversas que antes eram tabu. Esse avanço simbólico, afirma, tem efeitos reais no imaginário político e social.
O trabalho do TED Countdown continuará nesse caminho. A organização planeja replicar o modelo da casa em conferências futuras, criando espaços onde soluções práticas, tecnologias emergentes, lideranças culturais e vozes marginalizadas possam se encontrar. Na visão de Levin, é assim que a pauta climática deixa de ser tratada como técnica ou distante e passa a ser, finalmente, uma questão de humanidade. E, como ela mesmo resume, Belém foi apenas o começo.








































