Mulheres da Amazônia articulam voz e poder no puxirum por justiça socioambiental


No dia 10 de novembro de 2025, entre 13 h e 19 h, o auditório do Universidade Federal do Pará (UFPA) — Campus Guamá, em Belém (PA) — será palco de um encontro singular: o “Puxirum de Mulheres Defensoras da Amazônia”, uma expressão de resistência coletiva que reúne mulheres defensoras dos direitos humanos e socioambientais, lideranças comunitárias, pesquisadoras, estudantes e organizações da sociedade civil em torno de uma missão comum — proteger territórios, garantir justiça socioambiental e afirmar a força das vozes femininas na Amazônia.

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O termo “puxirum”, de raízes amazônicas, significa justamente essa articulação comunitária: uma mobilização em que a comunidade trabalha junta, soma saberes, força, cuidado e ação. Na tradição local, o puxirum simboliza um mutirão em que não apenas se produz algo, mas se constrói, se reconstrói, se fortalece o tecido social. É nessa perspectiva que o encontro se coloca: não apenas como evento, mas como espaço de homenagem às mulheres que resistem, de trocas de vivências e de construção de redes de apoio e cuidado.

A partir das 14 h15, após acolhida e mística de abertura, o evento começa com a apresentação das organizações responsáveis e, logo em seguida, a contextualização do encontro. Entre 14h45 e 16h50 realiza-se o puxirum propriamente dito — com rodas de conversa, escuta ativa e partilha de trajetórias. Às 17 h, parte do auditório sai para o cortejo simbólico, expressão pública de visibilidade e afirmação desta comunidade de mulheres defensoras da Amazônia.

Entre as lideranças confirmadas estão nomes como Leudiane Ferreira, Ângela de Jesus, Claudelice Santos, Vivi Reis, Antonia Cariongo, Conceição Dias dos Santos, Polly Soares, Irmã Jane, Irmã Kátia, Mametu Nangetu e Auricélia Arapiun. As presenças reforçam que o encontro não é apenas uma fala pontual, mas a articulação de sujeitos que atuam com coragem em diferentes frentes de resistência.

Na Amazônia, as mudanças climáticas, o desmatamento, os projetos de grande escala na fronteira agrícola ou florestal, a exploração de recursos e a violência não afetam a população de modo genérico — afetam de modo diferenciado. Muitas vezes, são as mulheres, sobretudo indígenas, quilombolas, ribeirinhas ou de comunidades tradicionais, que assumem funções centrais: cuidar da água, da terra, da família, articular redes de economia local, mobilizar contra violências ambientais e de gênero. Nesse sentido, o encontro propõe vir à tona esse protagonismo e evidenciar que não são apenas vítimas passivas, mas agentes ativas de transformação socioambiental.

O exemplo da Dorothy Stang — freira, defensora da floresta, assassinada em 2005 aos 73 anos — e de Dilma Ferreira Silva — militante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), assassinada em 2019 — revela que a resistência é antiga, mas também extremamente atual. Foram mulheres que enfrentaram não apenas a opressão sobre o território, mas o sistema de exploração e dominação que se atrela ao desenvolvimento extrativo. Seus nomes voltam-se como alertas: quem protege a floresta, quem protege a vida, assume riscos enormes. Dados mostram que entre 2012 e 2022 ocorreram 765 ataques a mulheres em conflitos no campo na Amazônia Legal, a maioria sob a forma de ameaças de morte; 36 mulheres foram assassinadas nesse período. A ausência do Estado, a impunidade e a sobreposição de empreendimentos sobre territórios vulneráveis explicam esse cenário.

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Ao promover esse puxirum no âmbito da COP30, o encontro amplia o foco: não apenas questiona o que está em jogo na Amazônia, mas conecta as lutas locais com a agenda global de justiça climática, reconhecimento de direitos e defesa dos territórios. O evento é firmado pelas iniciativas da Ação Social Franciscana (Sefras), do Instituto Universidade Popular (Unipop), da Casa Amazônia, do Comitê Dorothy Stang, da Rede Liberdade, do Grupo de Trabalho Geografia e Gênero na Amazônia (do PPGEO/UFPA) e do Cojovem.

Além de espaço de fala, o evento entende que resistir significa cuidar umas das outras, construir coletivamente estratégias de proteção, visibilidade e ação. A programação – com acolhida, mística, rodas de conversa e cortejo – leva em conta práticas ancestrais da Amazônia e as converge com a urgência contemporânea de responder à crise dos direitos humanos, da floresta e da vida ao redor. Em cada roda de conversa ecoam os saberes de mulheres que sabem que defender territórios é também defender modos de viver, de existir, de cuidar.

Neste cenário, o “puxirum” atua como metáfora e prática preciosa: a luta compartilhada, o juntar de forças, a trama de redes que atravessam diferentes contextos, identidades e geografias. Mulheres da Amazônia articulam suas vozes, reconhecem suas trajetórias e renovam o compromisso com a justiça socioambiental, a defesa da vida e o protagonismo feminino. Em última instância, o encontro convoca não apenas para ouvir, mas para agir — entender que a Amazônia não pode mais ser palco de violações silenciadas, e que as mulheres que vivem nela não são vítimas passivas, mas protagonistas de transformação.