Pesquisadores da USP descobrem microplásticos no cérebro humano


Uma equipe de cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP) fez uma descoberta inédita: a presença de microplásticos no cérebro humano. O estudo foi realizado pela patologista Thais Mauad, pelo engenheiro ambiental Luís Fernando Amato Lourenço e pela bióloga Regiani Carvalho de Oliveira, com o apoio da FAPESP e da ONG Plastic Soup, da Holanda.

Partículas de microplástico no cérebro

plastic has been found in the human brain and concentrations increase with time preprint states 1724337901054 512Durante o projeto, os pesquisadores identificaram partículas de microplástico no cérebro de oito pessoas que viveram por pelo menos cinco anos na cidade de São Paulo. Após a morte, as amostras foram extraídas durante autópsias realizadas no Serviço de Verificação de Óbitos de São Paulo. Os cientistas focaram na análise de uma região do cérebro chamada bulbo olfatório, uma estrutura localizada logo acima do nariz, responsável pela primeira recepção dos estímulos olfativos. A pesquisa revelou que essa área pode ser uma via de entrada de partículas externas, incluindo microplásticos, no sistema nervoso central.

Para realizar a pesquisa, a equipe teve que adotar um rigoroso protocolo para evitar a contaminação das amostras. Equipamentos antigos, como seringas de vidro, foram resgatados, e utensílios plásticos foram substituídos por materiais como vidro e alumínio. O protocolo de limpeza envolveu lavagens sucessivas com água filtrada e acetona. Além disso, a manipulação das amostras foi feita com roupas de algodão, sem o uso de plásticos, para minimizar o risco de contaminação.

Análise do bulbo olfatório

Após o processamento, as amostras do bulbo olfatório foram analisadas no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas, utilizando o Sirius, uma fonte de radiação síncrotron de alta energia. A análise revelou que cada amostra continha de 1 a 4 partículas de microplástico, com tamanhos variando de 5,5 µm a 26,4 µm, o que é inferior ao tamanho de muitas células humanas. A maioria dos microplásticos encontrados era composta por fragmentos ou esferas de polipropileno (PP), o segundo plástico mais produzido no mundo.

Thais Mauad, uma das responsáveis pelo estudo, expressou inicialmente dúvidas sobre a origem das partículas, temendo que fossem resultado de contaminação externa. No entanto, ao observar as características das partículas e sua localização nas células ou nas proximidades de vasos sanguíneos, ela concluiu que elas estavam realmente presentes no cérebro, e não apenas nas amostras.

Barreira protetora do cérebro

A descoberta é alarmante, pois o cérebro é um órgão altamente protegido pela barreira hematoencefálica, que dificulta a passagem de substâncias externas. Segundo Henrique Eisi Toma, químico do Instituto de Química da USP, a presença de microplásticos no cérebro levanta questões sobre os efeitos desses materiais na saúde humana, já que eles podem interagir com as células devido ao seu tamanho reduzido.

Em outro estudo realizado nos Estados Unidos, pesquisadores investigaram a presença de micro e nanoplásticos (partículas ainda menores que os microplásticos) em órgãos como o cérebro, fígado e rins. Os resultados sugerem que o cérebro pode acumular esses materiais em maior quantidade do que outros órgãos, o que levanta preocupações sobre o impacto desses poluentes na saúde cerebral.

Ainda que os estudos sobre os efeitos dos micro e nanoplásticos no corpo humano sejam incipientes, já se sabe que eles estão presentes em vários órgãos, incluindo coração, fígado, rins, intestinos e até na placenta. Eles entram no corpo principalmente por ingestão ou inalação, podendo se distribuir pelo sangue e acumular-se nos órgãos.

Screenshot 2025 01 15 124347

Preocupação com a saúde humana

A preocupação com esses poluentes é crescente, pois sua presença no organismo pode estar associada a problemas de saúde, como inflamação e doenças cardiovasculares. Em resposta, pesquisas estão sendo realizadas para entender melhor os impactos dos micro e nanoplásticos, como um estudo piloto no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em São Paulo, que está investigando a relação entre esses poluentes e doenças cardiovasculares.

Soluções

Para reduzir a exposição aos microplásticos, especialistas sugerem reduzir o uso de plásticos em casa, evitar roupas de fibras sintéticas e consumir alimentos e bebidas que não sejam embalados em plásticos, especialmente os que são aquecidos. Embora seja impossível evitar completamente a exposição, a conscientização sobre o problema e a diminuição do uso de plásticos podem ajudar a mitigar os impactos dessa poluição no corpo humano.

Enquanto isso, os cientistas continuam a estudar os efeitos dos microplásticos e nanoplásticos, aguardando resultados mais robustos que possam esclarecer as consequências para a saúde humana e ambiental.


Edição atual da Revista Amazônia

Assine nossa newsletter diária