Na primeira semana de dezembro de 2024, o Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) abriu um julgamento histórico que pode marcar um ponto de virada na luta contra as mudanças climáticas. O caso, que será o maior de sua história, pode ajudar as nações mais vulneráveis a enfrentar os impactos do aquecimento global.
Julgamento histórico
O tribunal sediado em Haia ouviu durante duas semanas representantes de 99 países e mais de uma dúzia de organizações intergovernamentais, tratando da responsabilidade legal dos Estados na mitigação das mudanças climáticas. A ação foi impulsionada por uma década de pressão de pequenas nações insulares, que temem desaparecer devido à elevação do nível do mar.
O Tribunal foi solicitado pela Assembleia Geral da ONU, que, no ano passado, pediu um parecer sobre as “obrigações dos Estados em relação às mudanças climáticas”. A nação insular de Vanuatu, que integra esse grupo de Estados vulneráveis, lidera a solicitação e exige uma confirmação legal de que a destruição ambiental causada pela emissão de gases de efeito estufa é ilegal.
Margaretha Wewerinke-Singh, que coordena a equipe jurídica de Vanuatu, afirmou à Associated Press que a expectativa é de que o tribunal declare que os atos que estão prejudicando o clima são ilegais. “Queremos que o tribunal reconheça que a destruição climática que estamos vivenciando é uma violação”, disse ela.
Ameaças diretas à sobrevivência das nações insulares
As mudanças climáticas já estão afetando diretamente os pequenos Estados insulares, como Vanuatu, onde o aumento do nível do mar já atingiu 4,3 centímetros ao longo da última década, com algumas regiões do Pacífico enfrentando subidas ainda mais dramáticas. Desde a Revolução Industrial, a temperatura global aumentou em média 1,3°C, o que tem causado eventos climáticos extremos.
O enviado de Vanuatu para as mudanças climáticas, Ralph Regenvanu, afirmou que os países insulares estão enfrentando a destruição de suas terras, meios de subsistência e culturas devido às mudanças climáticas. “Somos as testemunhas da devastação causada por um problema global que, se não for tratado, resultará na perda de nossos direitos humanos”, disse ele antes das audiências.
Embora qualquer decisão do tribunal seja apenas um parecer consultivo e não tenha força obrigatória, ela pode servir de base para outras ações judiciais em nível nacional e global. “Será um símbolo poderoso, que pode ser usado como fundamento para pressionar os governos a tomarem medidas concretas”, afirmou Regenvanu.
Antes das audiências, ativistas ambientais de todo o mundo se reuniram em apoio à causa. A Pacific Islands Students Fighting Climate Change, grupo que teve a ideia original de solicitar o parecer, e a organização World Youth for Climate Justice organizaram eventos com discursos e debates, destacando a importância desse julgamento para as futuras gerações.
O que está em jogo: A responsabilidade dos países e as consequências para o clima
Durante o julgamento, os 15 juízes do TIJ tentarão responder a duas questões fundamentais: o que os países devem fazer, de acordo com o direito internacional, para proteger o clima e o ambiente das emissões humanas de gases de efeito estufa, e quais as implicações legais para os governos cujas ações ou omissões causam danos significativos ao clima.
A segunda questão se concentra especificamente nos pequenos Estados insulares em desenvolvimento, que enfrentam ameaças existenciais devido às mudanças climáticas, além dos impactos sobre as gerações presentes e futuras.
Antes do início das audiências, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU forneceu ao tribunal informações científicas sobre o aquecimento global e suas consequências. O caso no TIJ segue uma série de decisões judiciais que exigem mais ações dos governos para reduzir as emissões de carbono, como a decisão histórica do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, que determinou que os países devem proteger melhor suas populações das mudanças climáticas.
Um precedente jurídico global
Em maio deste ano, um tribunal das Nações Unidas sobre direito marítimo considerou as emissões de carbono como poluição marinha, exigindo que os países adotassem medidas para mitigar seus efeitos. Além disso, a decisão do Supremo Tribunal dos Países Baixos, que em 2015 reconheceu a proteção contra as mudanças climáticas como um direito humano, foi confirmada em 2019, estabelecendo um precedente jurídico importante.
O julgamento do TIJ poderá criar um marco ainda mais forte, estabelecendo novas bases legais para a ação climática global, pressionando os países, especialmente os mais ricos, a tomarem medidas mais eficazes no combate às mudanças climáticas. O impacto desse caso poderá reverberar além das salas de tribunal, influenciando políticas internacionais e ações judiciais em diversas nações.