Com o anúncio de R$ 96,6 milhões destinados às cadeias produtivas amazônicas, o Programa Florestas e Comunidades: Amazônia Viva inaugura uma fase de investimentos que busca fortalecer economias tradicionais e ampliar a presença de produtos da sociobiodiversidade nos mercados brasileiros. A iniciativa, apresentada em Brasília pela Companhia Nacional de Abastecimento, nasce de uma articulação entre os recursos do Fundo Amazônia e ações conjuntas do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar.

Seus alvos principais são cadeias já conhecidas por sua relevância — como o cupuaçu, o açaí e o pirarucu —, mas também um conjunto de iniciativas comunitárias que sustentam a vida na Amazônia por meio do extrativismo, da pesca artesanal, da agricultura familiar e do manejo florestal. Trata-se de um esforço que tenta, simultaneamente, fortalecer modos de vida tradicionais e ampliar a escala econômica desses produtos, para que eles deixem de ocupar apenas nichos e conquistem mercados mais amplos e rentáveis.
Segundo João Edegar Pretto, presidente da Conab, dar visibilidade aos produtos da sociobiodiversidade é um compromisso que transcende o ciclo atual de governo: é uma chance de consolidar uma economia florestal sustentável capaz de competir com outras cadeias produtivas nacionais.
Da floresta ao mercado: recursos para transformar a escala
Os recursos do programa serão distribuídos ao longo de dois anos e chegarão a 32 projetos selecionados em toda a Amazônia Legal. As iniciativas contempladas precisam representar redes comunitárias diversas: silvicultores, aquicultores, extrativistas, pescadores artesanais, povos indígenas, comunidades ribeirinhas, quilombolas e outras formas de organização coletiva que compõem a paisagem social da região.
Cada projeto poderá receber até R$ 2,5 milhões para investimentos em infraestrutura, aquisição de equipamentos e mecanismos de escoamento da produção. Na prática, isso significa apoiar desde casas de processamento de frutos até estruturas que melhorem a logística de transporte — gargalo histórico para quem produz na floresta, mas precisa atender mercados urbanos muitas vezes distantes.
A iniciativa também dialoga com políticas já consolidadas, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar e o Programa de Aquisição de Alimentos, abrindo espaço para ampliar a presença de produtos da sociobiodiversidade na merenda escolar e nas compras públicas de alimentos.
Ao diversificar o acesso a mercados, o Amazônia Viva aposta em um modelo que não apenas gera renda, mas fortalece cadeias produtivas que conservam a floresta em pé. É uma resposta prática a um debate que há anos procura formas de equilibrar proteção ambiental, dignidade econômica e desenvolvimento regional.

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O papel estratégico do Fundo Amazônia
A engrenagem financeira que viabiliza esse novo conjunto de investimentos tem seu centro no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, responsável pela gestão do Fundo Amazônia. Criado para financiar projetos de combate ao desmatamento e estímulo a atividades sustentáveis, o fundo foi reestruturado nos últimos anos e volta agora a operar com força renovada.
A diretora socioambiental do BNDES, Tereza Campello, destaca que o avanço recente da fiscalização e a redução do desmatamento abriram espaço para recuperar e expandir os recursos disponíveis. Somados, os investimentos do fundo devem alcançar R$ 2,2 bilhões em 2025, distribuídos entre projetos de proteção ambiental, desenvolvimento socioeconômico e governança amazônica.
Segundo Campello, a alocação de quase R$ 100 milhões exclusivamente para o Amazônia Viva mostra que o foco do fundo está cada vez mais próximo das comunidades que vivem da floresta. Um dos objetivos do programa é criar uma plataforma capaz de organizar, de maneira profissional e acessível, os dados da sociobiodiversidade — uma base estratégica para orientar políticas públicas e atrair investimentos futuros.
Da economia invisível ao protagonismo da sociobiodiversidade
A floresta amazônica movimenta uma economia que, apesar de robusta, costuma permanecer à margem dos grandes indicadores nacionais. Açaí, óleos vegetais, castanhas, pescados, fibras naturais, borracha — todos são produtos que sustentam milhares de famílias, mas que enfrentam obstáculos logísticos, baixa industrialização e dificuldade de competir com cadeias industriais consolidadas.
O Amazônia Viva tenta reverter essa lógica. Ao combinar recursos financeiros, infraestrutura, logística e articulação institucional, o programa aposta em transformar cadeias dispersas em sistemas produtivos mais fortes e competitivos. E, ao contrário das iniciativas que promovem agressões à floresta, essas cadeias dependem diretamente da manutenção de ecossistemas saudáveis.
Com isso, o programa não se limita a financiar equipamentos: ele busca fortalecer um modelo de desenvolvimento que parte da floresta em pé, passa pela valorização do conhecimento tradicional e culmina na oferta de produtos de alta qualidade nos mercados brasileiros e internacionais.
Se a iniciativa for bem-sucedida, pode marcar uma inflexão histórica: a sociobiodiversidade deixaria de ocupar o rodapé da economia amazônica e ganharia o protagonismo que muitos pesquisadores e comunidades defendem há décadas.








































