Em muitas regiões do Brasil, ver um bicho-preguiça pendurado em árvores próximas às estradas já foi cena comum. Hoje, esse encontro é cada vez mais raro — e não é por acaso. A urbanização acelerada, especialmente nas zonas de mata atlântica e floresta amazônica periférica, está transformando o cotidiano de um dos animais mais emblemáticos do país. O bicho-preguiça, símbolo de tranquilidade e resistência, está sofrendo silenciosamente com o avanço das cidades.

O bicho-preguiça e seu habitat natural
O bicho-preguiça (do gênero Bradypus e Choloepus) é um mamífero arborícola, ou seja, passa quase toda sua vida em árvores. É um animal extremamente adaptado a ambientes florestais fechados, onde encontra alimento, segurança contra predadores e condições climáticas ideais. No entanto, essas condições estão sendo drasticamente alteradas.
Com a expansão urbana, muitos fragmentos de floresta estão sendo destruídos ou isolados por rodovias, condomínios e plantações comerciais. Isso dificulta o deslocamento dos bichos-preguiça entre áreas de mata e reduz sua capacidade de encontrar alimentos e parceiros para reprodução.
Urbanização: o vilão silencioso da fauna silvestre
Ao contrário de espécies mais ágeis e adaptáveis, como saguis ou gambás, os bichos-preguiça não têm a mesma flexibilidade para lidar com o ambiente urbano. Eles se movem lentamente, gastando horas para atravessar pequenas distâncias. Quando forçados a descer das árvores — seja para mudar de área ou para fugir de distúrbios humanos — tornam-se presas fáceis e vulneráveis a atropelamentos, ataques de cães ou até eletrocussões em fios expostos.
Além disso, a poluição sonora, a iluminação artificial e a fragmentação do habitat são fatores que afetam diretamente a rotina fisiológica do animal, interferindo em seu sono, alimentação e reprodução. E, ao contrário do que muitos pensam, o bicho-preguiça não está “acostumado” com a presença humana — ele apenas não reage com agitação, o que torna seu sofrimento ainda mais invisível.
Casos reais: quando a preguiça encontra o concreto
Em cidades da Região Norte e do litoral da Bahia e Espírito Santo, o resgate de bichos-preguiça em áreas urbanas se tornou comum. Muitas vezes, eles são encontrados vagando em quintais ou pendurados em postes de luz, completamente desorientados.
Instituições como o Instituto Tamanduá e o Projeto Preguiça têm atuado na reabilitação desses animais, mas alertam que, sem políticas públicas de conservação e planejamento urbano que respeitem os corredores ecológicos, esses resgates serão cada vez mais frequentes — e nem sempre bem-sucedidos.
A espécie está ameaçada de extinção?
Embora o bicho-preguiça ainda não esteja classificado como “em perigo” em nível nacional, algumas subespécies, como o Bradypus torquatus (preguiça-de-coleira), já constam como vulneráveis na Lista Vermelha da IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza). A situação se agrava conforme o avanço urbano pressiona os ecossistemas remanescentes.
Sem habitat contínuo e seguro, a espécie não consegue manter populações saudáveis e geneticamente diversas, o que aumenta o risco de doenças, reduz a taxa de nascimento e fragiliza o ecossistema como um todo.
Soluções que já estão sendo aplicadas — e que funcionam
Algumas iniciativas têm mostrado que é possível conciliar crescimento urbano com preservação. A criação de passarelas aéreas entre árvores, o enterramento de fios elétricos e a preservação de corredores ecológicos em projetos de loteamento são exemplos viáveis e eficazes.
Além disso, a educação ambiental em comunidades próximas a áreas de mata tem ajudado a evitar capturas ilegais ou interações perigosas. Há também avanços em legislação, como leis municipais que proíbem a supressão de vegetação nativa sem compensação ecológica.
Mas ainda há muito o que fazer. A maioria das cidades brasileiras ignora completamente a fauna silvestre em seus planos diretores.
O papel do cidadão comum na proteção do bicho-preguiça
Não é preciso ser biólogo ou ativista para ajudar. Simples atitudes podem fazer diferença:
Ao ver um bicho-preguiça em área urbana, não tente manipulá-lo. Acione órgãos ambientais ou ONGs especializadas.
Evite soltar fogos de artifício ou usar motosserras próximas a áreas de mata.
Plante árvores nativas e preserve vegetação natural nos arredores de sua casa ou terreno.
Apoie projetos de conservação e compartilhe informações confiáveis sobre a espécie.
A proteção do bicho-preguiça não é apenas uma questão de “salvar um bichinho fofo” — trata-se de garantir que nossos ecossistemas continuem funcionando, que as florestas se mantenham vivas e que possamos conviver de forma mais equilibrada com as outras formas de vida que compartilham nosso território.
O que perdemos quando um bicho-preguiça desaparece
Mais do que uma perda simbólica, a ausência do bicho-preguiça em determinada região é um alerta de que aquele ambiente está entrando em colapso. Ele é uma espécie sentinela — ou seja, sua presença indica equilíbrio. Quando ele desaparece, geralmente outras espécies já foram afetadas e a biodiversidade local está comprometida.
Preservar o bicho-preguiça é, portanto, preservar também a qualidade do nosso próprio ar, clima e água. Ele é parte de uma rede delicada da qual todos nós fazemos parte, mesmo que a correria da vida urbana tente nos convencer do contrário.
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