No mercado de varejo paulista, o preço do quilo da castanha-do-brasil, também conhecida como castanha-do-pará, gira em torno de R$ 100. Esse valor pode fazer com que se imagine que a coleta da castanha seja uma atividade lucrativa. No entanto, no Acre, onde a castanha é nativa, os extrativistas recebem cerca de R$ 4,50 por quilo do produto in natura, um preço quase 22 vezes menor do que o valor pago ao consumidor final no Sudeste.
Contraste
Esse cenário é contrastante quando comparado com outro produto da região amazônica: a borracha. Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Acre (Ufac), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDAF) revela que, na Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, a borracha nativa é comprada a R$ 24 por quilo, valor que é cerca de oito vezes maior que o preço de mercado. Esse preço elevado se deve a um convênio com uma empresa que adquire toda a produção de borracha e paga aos extrativistas pelos serviços socioambientais prestados, como a preservação da floresta.
Em contraste, o valor pago pela castanha ainda está muito aquém do que seria ideal, considerando os critérios socioambientais e econômicos aplicados ao cálculo do preço da borracha, o que implica uma rentabilidade insuficiente para as famílias que dependem da atividade extrativista da castanha. “O valor pago pela castanha é inviável para garantir a reprodução social dessas populações, ou seja, para que possam se manter na região com dignidade, preservando a floresta e evitando o êxodo para as cidades”, explica Ademar Romeiro, professor da Unicamp e coordenador do projeto.
Necessidade de encontrar alternativas
O estudo sobre a sustentabilidade da Resex Chico Mendes, que integra um projeto apoiado por FAPESP, Fapespa (Pará) e Fapac (Acre), aponta para a necessidade de encontrar alternativas que possam garantir uma remuneração mais justa para as famílias extrativistas. A análise de Decisão Multicritério realizada pelos pesquisadores classificou a Resex como sustentável em várias dimensões, mas apontou fragilidades nos indicadores sociais e econômicos. Isso impulsiona os pesquisadores a buscarem alternativas, como a valorização da castanha e da borracha, além do uso de Sistemas Agroflorestais (SAFs), que combinam a produção de alimentos com espécies florestais, como a castanha e o mogno, enquanto mantém a floresta intacta.
Sistemas agroflorestais mais rentáveis do que a criação extensiva
Esses sistemas agroflorestais têm se mostrado mais rentáveis do que a criação extensiva de gado. Aliás, a criação de gado na Resex, que tem uma rentabilidade baixa, é vista como uma “poupança” para emergências, sendo a venda de novilhos a principal fonte de renda, especialmente para o mercado vizinho de Rondônia.
Desde a criação da Resex Chico Mendes, em 1990, a região tem sido acompanhada por projetos de pesquisa, como o projeto ASPF, coordenado pelo professor Raimundo Cláudio Gomes Maciel, da Ufac. O estudo da sustentabilidade dessas práticas é essencial para encontrar soluções que possam equilibrar a preservação ambiental com a geração de renda para as famílias extrativistas.
Destinação da produção de borracha nativa da Resex
Além disso, desde 2006, toda a produção de borracha nativa da Resex é comprada pela empresa Veja, que a utiliza para fazer solados de tênis. A empresa paga, além do preço de mercado, subsídios municipais, estaduais e federais, além de R$ 10,50 por quilo como Pagamento por Serviços Socioambientais (PSSA). Isso garante uma maior rentabilidade aos seringueiros, tornando o modelo de pagamento por serviços ambientais uma possível solução para a sustentabilidade econômica e social da região.
Importância da política pública
Ademar Romeiro ressalta a importância de uma política pública sólida para garantir a preservação da natureza e a dignidade das populações locais, pois “o preço de mercado sozinho não assegura a sobrevivência dessas comunidades.”
O estudo completo sobre a valoração e o pagamento por serviços socioambientais na Resex Chico Mendes está disponível para leitura online, assim como o artigo sobre o Índice Multicritério de Sustentabilidade na região.