Imagine o que têm em comum uma escola pública em São José, Santa Catarina, com mais de 600 alunos e docentes, e um festival de música que atrai 300 mil pessoas para uma praia artificial no Lago Paranoá, em Brasília? Ambas são iniciativas certificadas como Lixo Zero, um reconhecimento para projetos que conseguem reduzir em mais de 90% a produção de resíduos sólidos e seus impactos ambientais.
Escola Pioneira em São José
Em 2019, Fabiana Nogueira Mina, professora da Escola de Educação Básica Aldo Câmara da Silva, propôs discutir resíduos urbanos em uma aula de Língua Portuguesa. Através de vídeos e debates sobre consumo e impacto de sacolas plásticas, a professora conseguiu envolver tanto os alunos que a discussão se expandiu para toda a escola. O seminário que se seguiu resultou no engajamento de toda a comunidade escolar, transformando a instituição na primeira escola Lixo Zero do Brasil.
O projeto enfrentou desafios e erros ao longo do caminho, mas resultou em inovações como o “residuário”, um armário onde os materiais são higienizados e organizados pelos próprios alunos para reciclagem. Com compostagem de resíduos orgânicos e doação de materiais recicláveis para cooperativas, a escola desviou 94% dos resíduos de aterros sanitários e recebeu a certificação Lixo Zero.
Festival Sustentável em Brasília
Em Brasília, os organizadores de um festival anual às margens do Lago Paranoá decidiram, em 2017, transformar o evento em Lixo Zero. O festival, que gerava cerca de 400 toneladas de resíduos, passou a adotar práticas de consumo consciente e redução da pegada ambiental. Itens não essenciais foram eliminados, materiais convencionais substituídos por alternativas sustentáveis e os resíduos foram destinados adequadamente.
Um dos maiores desafios foi a reciclagem de vidro, que inicialmente precisou ser enviada para São Paulo. Em 2018, a mobilização dos produtores possibilitou o início de um empreendimento de reciclagem de vidro em Brasília. Da mesma forma, resíduos orgânicos começaram a ser compostados localmente. O esforço resultou em um desvio de 95% dos resíduos de aterros sanitários, chegando a 98,2%, tornando-se o primeiro festival Lixo Zero do país.
Relatório e Perspectivas
De acordo com o relatório Global Waste Management Outlook 2024 (GWMO 2024) do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), o Brasil gerou 80 milhões de toneladas de resíduos sólidos domiciliares em 2022. Deste total, quase 30 milhões de toneladas foram destinadas inadequadamente, muitas vezes em lixões, e 5 milhões de toneladas foram descartadas no meio ambiente.
Preocupados com o impacto desses resíduos, iniciativas como a da escola em São José e o festival em Brasília demonstram como ações locais podem gerar grandes mudanças. Essas boas práticas serão discutidas no Congresso Internacional Cidades Lixo Zero, que começa nesta terça-feira em Brasília. O evento reunirá gestores de negócios e cidades no Museu Nacional da República para trocar experiências e buscar soluções sustentáveis.
Transformação Cultural e Social
Rodrigo Sabatini, presidente do Instituto Lixo Zero, destaca que exemplos como esses são fundamentais para inspirar mais iniciativas, promovendo uma transformação cultural e social em direção a cidades mais limpas, resilientes e equitativas. “Estamos falando de um acordo social, onde comunidades colaboram para o bem comum. Este acordo é a chave para reduzir nosso impacto ambiental, promover uma economia mais sustentável, reduzir disparidades sociais e incentivar a inovação”, conclui Sabatini.