Quando se fala em mudanças climáticas, o dióxido de carbono costuma ocupar todo o protagonismo. É justo: o CO₂ responde pela maior parte das emissões de gases de efeito estufa e permanece mais de um século na atmosfera. Mas há outro vilão silencioso, menos lembrado e não menos perigoso: o metano (CH₄).

Esse gás tem um potencial de aquecimento global cerca de 28 vezes superior ao do CO₂. A boa notícia é que ele é menos longevo: permanece de 10 a 20 anos na atmosfera. Isso significa que cortar suas emissões traz um impacto mais rápido no controle da temperatura global, funcionando como um freio emergencial no ritmo do aquecimento.
No entanto, o mundo ainda está longe de aplicar essa estratégia. Dados reunidos pelo Observatório do Clima revelam que o Brasil ocupa o quinto lugar entre os maiores emissores de metano do planeta, atrás apenas de China, Estados Unidos, Índia e Rússia.
O compromisso de reduzir essas emissões foi firmado em 2021, durante a COP26 em Glasgow, quando mais de 150 países assumiram a meta de cortar em pelo menos 30% o metano até 2030, tomando como base os níveis de 2020. O esforço poderia evitar 0,2°C de aquecimento até 2050. Mas, no caso brasileiro, o que se viu foi o oposto: segundo o SEEG – Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa, também coordenado pelo Observatório do Clima, o país registrou em 2023 um aumento de 6% nas emissões em comparação a 2020.
O setor agropecuário responde por três quartos dessas emissões. O principal culpado é a pecuária, com destaque para a fermentação entérica — o popular arroto do gado. Em 2023, o Brasil liberou 14,5 milhões de toneladas de metano só da atividade bovina, mais do que todo o volume de gases de efeito estufa emitido pela Itália no mesmo período. Esse dado é particularmente relevante considerando que o Brasil abriga o segundo maior rebanho bovino do mundo.

SAIBA MAIS: Cientistas convertem gases de efeito estufa em combustíveis sustentáveis
Como lidar com o Metano?
As estatísticas mostram uma tendência preocupante. Entre 2005 e 2020, as emissões nacionais de metano subiram 2,1%. Se incluirmos o período até 2023, a elevação chega a 7,2%. Ou seja, em vez de convergir para a redução, o país se distancia cada vez mais do compromisso internacional.
Para especialistas, essa realidade não se deve a falta de soluções, mas à ausência de vontade política e coordenação. O relatório do Observatório do Clima propõe caminhos claros, simples e viáveis para reduzir o metano no Brasil até 2035.
No setor agropecuário, práticas como o aprimoramento da dieta animal, a redução no tempo de abate e a seleção genética de rebanhos mais eficientes podem diminuir significativamente as emissões sem reduzir a produtividade.
No campo da gestão de resíduos, há uma meta concreta já definida em lei: fechar os lixões até 2028. Com essa medida, acompanhada da expansão da reciclagem e do aproveitamento energético do biogás em aterros sanitários, seria possível cortar quase um terço das emissões do setor. Além do benefício climático, haveria impactos positivos diretos na saúde pública e na limpeza urbana.
No uso da terra, a ameaça cresce com o aumento das queimadas em vegetação nativa, potencializadas pelas mudanças climáticas. Os incêndios, além de devastarem ecossistemas inteiros, são também uma fonte significativa de metano. Nesse ponto, a recuperação de áreas degradadas e a regeneração florestal aparecem como caminhos duplamente benéficos: absorvem carbono e reduzem a pressão por queimadas.
David Tsai, coordenador do SEEG, resume a urgência da pauta: “As soluções existem, são tecnicamente simples e economicamente viáveis. Não precisamos de uma revolução tecnológica, precisamos de decisão política.”
O metano, muitas vezes tratado como secundário diante do CO₂, é na verdade um ponto-chave para a transição climática. Sua redução rápida pode comprar tempo precioso para que a humanidade avance em mudanças estruturais mais profundas. Ignorá-lo significa abrir mão de uma das ferramentas mais eficazes para evitar cenários de aquecimento ainda mais catastróficos.
Se o Brasil quiser ocupar um papel de liderança global no enfrentamento da crise climática, terá de olhar para esse desafio com seriedade. O combate ao metano não é apenas uma responsabilidade internacional, é também uma oportunidade de modernizar setores produtivos, melhorar a qualidade de vida nas cidades e mostrar que compromissos assinados podem, de fato, sair do papel.









































