O Brasil, prestes a presidir a COP30, encontra-se diante de uma encruzilhada que mescla urgência histórica e oportunidade política. Ao mesmo tempo em que carrega a promessa de liderar uma transição energética justa, convive com uma dependência persistente do petróleo.

Dilema
O dilema não é novo, mas os caminhos possíveis começam a ganhar contornos mais claros. Entre eles, um desponta com especial nitidez: reduzir as emissões de metano no setor de óleo e gás.

Essa estratégia, além de necessária, é realizável. E, sobretudo, urgente. Não são apenas os alertas climáticos que clamam por ação. Estudos recentes publicados na Communications Earth & Environment indicam que nem mesmo a meta de limitar o aquecimento global a 1,5ºC – estabelecida como horizonte ideal no Acordo de Paris – seria suficiente para evitar o colapso das geleiras. Segundo os pesquisadores, o limite real de segurança climática estaria abaixo de 1ºC. Diante disso, cada fração de grau conta. E cada tonelada de metano evitada também.
Mitigar os impactos das emissões
É nesse contexto que a fala do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ganha peso simbólico e político: “temos que, o quanto antes, prescindir do petróleo”. A frase, dita em entrevista ao programa Cidades e Soluções, sintetiza um sentimento crescente. Sabemos que não há tecnologia capaz de neutralizar as emissões associadas ao uso de combustíveis fósseis. Mas é possível, sim, mitigar os impactos da produção. E isso passa, necessariamente, pela redução do metano.
O metano é um dos gases de efeito estufa mais potentes. No curto prazo, é dezenas de vezes mais agressivo que o dióxido de carbono. Estima-se que ele seja responsável por cerca de 45% do aquecimento global recente. E, ainda assim, o Brasil não conta com uma regulação efetiva para limitar suas emissões no setor energético. Um paradoxo evidente, mas também uma oportunidade latente.
Protagonismo na COP 30
Assumir a presidência da COP30 é mais que um papel cerimonial. É a chance de ocupar o centro do palco global com propostas concretas, exemplares. Estabelecer uma regulação robusta para a emissão de metano na cadeia de óleo e gás – como já fizeram outras nações produtoras – não apenas reforçaria o compromisso ambiental do país, mas também o posicionaria com mais força em arenas multilaterais como o Brics ou a Opep+. Liderança, nesse caso, é coerência entre discurso e prática.
Dados da Agência Internacional de Energia (IEA) reforçam o tamanho do desperdício. Em 2023, o volume de gás natural que poderia ter sido recuperado pela mitigação de metano e pelo fim da queima rotineira superou as exportações totais dos Estados Unidos, o maior exportador mundial. Foram 196 bilhões de metros cúbicos perdidos, contra 177 bilhões exportados. Estamos deixando escapar, literalmente, uma fonte de energia.

Reduzir essas emissões não é apenas um imperativo ambiental. É também uma escolha racional do ponto de vista econômico. Menos metano significa mais eficiência na produção, menos investimentos necessários em exploração, mais recursos liberados para fontes renováveis. Trata-se de uma estratégia que combina responsabilidade climática com inteligência financeira.
E há mais. Pesquisa realizada pelo Global Methane Hub em 17 países revelou que o Brasil lidera em dois aspectos fundamentais: é onde a população mais apoia a redução do metano e onde os impactos dos eventos climáticos extremos são mais perceptíveis pela sociedade. Isso significa que a base social para essa transição já existe. Falta-lhe apenas uma direção institucional clara.
Redução do metano é o primeiro passo
A COP30 pode ser, para o Brasil, o momento de fundar essa direção. De mostrar que é possível, sim, promover uma transição justa, que respeite os limites planetários sem negligenciar as demandas sociais. A redução do metano é o primeiro passo desse caminho. Um gesto simbólico e prático. Um ponto de partida para que a mudança comece não apenas no discurso, mas nas tubulações, nos poços, nas leis.
A história da transição energética brasileira pode começar a ser escrita com menos metano. Cabe a nós decidir se essa oportunidade será agarrada ou desperdiçada. Porque o tempo, como o gás, escapa.





































