Na Amazônia, rio que chega a quase 100° C desafia a ciência


A Amazônia é um bioma vasto e cheio de mistérios, um ecossistema com uma biodiversidade inigualável que fascina cientistas e leigos. Mas entre a flora exuberante e a fauna diversa, há um fenômeno que desafia a lógica e a ciência: um rio que ferve.

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Localizado em território peruano, o Shanay-Timpishka é um rio cujas águas podem atingir temperaturas de quase 100°C, tornando-o um cenário paradoxal de vida em meio a um calor extremo. O nome, na língua dos nativos, significa “ferver com o calor do Sol”, uma tradução poética para um fenômeno de natureza complexa.

A alta temperatura do rio é um mistério porque, diferentemente de outros rios quentes ao redor do mundo, ele não está associado a nenhum vulcão ativo. A geologia local não oferece uma explicação óbvia para o aquecimento das águas. A raridade desse evento torna o rio Shanay-Timpishka um caso único e uma importante área de estudo para geólogos e cientistas ambientais.

A busca pela razão desse fenômeno leva a uma jornada que se divide entre a ciência moderna e os saberes ancestrais, demonstrando a complexidade da Amazônia. A ciência tenta decifrar o mistério, enquanto a cultura local oferece sua própria visão.

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Foto: divulgação

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Entre a ciência e a lenda

A explicação científica para a temperatura do rio é intrigante. Especialistas apontam que a causa mais provável são fontes geotérmicas em profundidades inacessíveis sob o solo. A água da chuva penetra na terra, se infiltra em falhas geológicas e é aquecida pelo calor do interior do planeta. Esse processo de circulação faz com que a água retorne à superfície, formando o rio quente.

Um dado histórico acrescenta complexidade a essa história: na década de 1930, companhias de extração de combustíveis fósseis tomaram conta da região, em busca de reservas de petróleo. Alguns especialistas consideram que a intervenção humana pode ter contribuído para a configuração atual do local devido à deterioração do ambiente, embora a influência exata ainda seja objeto de estudo.

Por outro lado, a lenda local oferece uma visão diferente e igualmente fascinante. Os nativos perpetuam a crença de que as águas ferventes do Shanay-Timpishka são a criação de Yacumama, um espírito de serpente gigante que é reverenciado como a Mãe das Águas. Segundo a lenda, a entidade emergiu das profundezas da Terra, e sua força poderosa deu origem ao rio.

Essa narrativa não é apenas um mito, mas uma forma de os indígenas repassarem a ideia de que a terra é sagrada e que sua força deve ser respeitada. A história ancestral destaca a conexão espiritual do povo com o rio, transformando o Shanay-Timpishka em um local sagrado para a cultura local.

O impacto de um fenômeno extremo

Apesar de sua beleza e singularidade, a presença de um rio fervente carrega consigo prejuízos significativos para o meio ambiente. A alta temperatura das águas é um fator de estresse para a flora e a fauna local. A vida, que normalmente floresce ao redor dos rios amazônicos, luta para sobreviver em um ambiente tão inóspito. Segundo Rodolfo Nóbrega, da Universidade de Bristol, no Reino Unido, as mudanças climáticas e a alta temperatura comprometem a incidência de novas espécies.

“À medida que a temperatura [da região] aumenta, mesmo se houver disponibilidade de água [por perto], a capacidade de fotossíntese das plantas pode diminuir. O que eu acredito que esteja acontecendo é que as plantas estão sofrendo estresse com a temperatura, mesmo com água à sua volta”, explicou o especialista.

Esse estresse térmico, somado a outros impactos ambientais, compromete a biodiversidade, mostrando a fragilidade de um ecossistema que parece tão robusto. O rio Shanay-Timpishka é, portanto, um lembrete vivo de que a natureza pode ser fascinante e implacável, e que a interdependência de seus elementos é crucial para a sua sobrevivência.