Brasil discute restauração de ecossistemas rumo à COP30


O Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS) reuniu especialistas, representantes de governos, setor financeiro, academia e sociedade civil em um encontro no Rio de Janeiro para discutir a restauração de ecossistemas como resposta integrada às crises globais. O evento, realizado em 29 de agosto e intitulado “Restauração de Ecossistemas para os Desafios Globais da Rio-92: Integrando Clima (UNFCCC), Biodiversidade (CDB) e Degradação da Terra (UNCCD)”, fez parte da programação da Rio Climate Action Week e antecipou debates centrais da COP30, marcada para novembro em Belém (PA).

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Na abertura, a diretora executiva do IIS, Agnieszka Latawiec, também professora do Departamento de Geografia e Meio Ambiente da PUC-Rio, destacou a interdependência dos desafios ambientais. Para ela, restauração não é apenas um compromisso ecológico, mas uma estratégia que articula ciência, governança e inclusão social. “Desde a Rio-92 sabemos que clima, biodiversidade e degradação estão conectados. A restauração permite integrar agendas e transformar conhecimento em impacto concreto”, afirmou.

O cofundador do IIS e professor da PUC-Rio, Bernardo Strassburg, reforçou o papel estratégico do Brasil. Com a maior biodiversidade do planeta, grandes áreas degradadas aptas à recuperação e uma comunidade científica ativa, o país teria condições de liderar um movimento global de restauração. Para ele, a base desse processo precisa ser ciência aliada à inclusão social.

Já o diretor do Departamento de Geografia e Meio Ambiente da PUC-Rio, Glaucio Marafon, ressaltou a importância do ordenamento territorial. Políticas de restauração e conservação, segundo ele, só produzem resultados efetivos se estiverem conectadas à gestão adequada do uso da terra.

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Soluções práticas e experiências locais

O primeiro painel abordou a restauração como elo entre clima, biodiversidade e combate à degradação. A subsecretária de Estado do Ambiente e Sustentabilidade do Rio de Janeiro, Marie Ikemoto, apresentou a meta estadual de ampliar a cobertura florestal de 33% para 40% até 2050, o que representa restaurar 440 mil hectares. Ferramentas como o programa Olho no Verde, que utiliza imagens de satélite para monitorar desmatamento e regeneração, buscam apoiar essa ambição.

Nicholas Locke, presidente da Reserva Ecológica de Guapiaçu (REGUA), compartilhou a experiência de um projeto que alia conservação e desenvolvimento local. A REGUA administra 15 mil hectares, gera empregos diretos e sustenta parte significativa de seu orçamento por meio do turismo ecológico e de projetos de restauração. Segundo Locke, o impacto social é tão relevante quanto o ambiental: “A receita retorna às comunidades, mostrando que restauração também é geração de renda”.

Do lado financeiro, Márcio Macedo, representante do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ressaltou a evolução do banco em relação ao tema. De editais experimentais, o BNDES passou a estruturar a maior carteira de crédito para restauração de sua história, com programas como o Floresta Viva e o Restaura Amazônia. Para Macedo, restauração é “uma questão civilizacional”, pois propõe novas formas de organização social.

A dimensão social foi enfatizada por Dora Nascimento, do Conselho Ecológico Popular do Rio. Para ela, políticas de restauração precisam reconhecer comunidades tradicionais como protagonistas, valorizando saberes locais e garantindo remuneração justa a indígenas e quilombolas.

Ciência, inovação e financiamento híbrido

O segundo painel trouxe reflexões sobre o papel da ciência, da inovação e das finanças na expansão da restauração em escala nacional. Thiago Belote, diretor de Florestas do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, destacou a atualização do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg). O plano busca recuperar 12 milhões de hectares, combinando ações em áreas de preservação permanente, sistemas produtivos integrados e terras públicas.

Strassburg voltou a frisar que o Brasil é líder em conhecimento sobre ecologia da restauração, mas que o desafio está em transformar cenários científicos em implementação efetiva e duradoura.

A economista Ilona Szabó, presidente do Instituto Igarapé, chamou atenção para os riscos percebidos por investidores. Segundo ela, concessões de áreas de restauração têm alto potencial, mas ainda carecem de segurança jurídica e instrumentos de risco compartilhado. Políticas de Estado robustas seriam essenciais para atrair capital privado em larga escala.

Também participou Rubens Benini, diretor de florestas da The Nature Conservancy (TNC) Brasil e coordenador do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica. Ele apresentou a Agência Facilitadora do Pacto, que busca profissionalizar e ampliar a escala de iniciativas de restauração, multiplicando a capacidade de territórios que hoje restauram apenas alguns milhares de hectares por ano.

No encerramento, Strassburg sintetizou os aprendizados: ciência, financiamento, governança e justiça socioambiental precisam convergir para transformar experiências locais em soluções de alcance nacional. Para ele, a COP30 será uma oportunidade histórica de consolidar a restauração como elo entre compromissos internacionais e estratégias de desenvolvimento sustentável.

Mais do que reflorestar, trata-se de reconstruir relações entre sociedade e natureza. O encontro mostrou que a restauração é capaz de integrar agendas ambientais, gerar benefícios econômicos e sociais e reposicionar o Brasil como líder global em sustentabilidade.